Nelson Barbosa

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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Nelson Barbosa
Descrição de chapéu juros copom Selic

Fica a dica para o Banco Central

Depósitos voluntários deixam mais clara a diferença entre dívida do BC e do Tesouro

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O Congresso finalmente aprovou a criação de depósitos voluntários no Banco Central. A ideia foi proposta pelo governo Dilma (PLP 257/16), mas acabou adiada pelo golpe de 2016.

Para explicar por que é bom que BC possa captar diretamente recursos do sistema financeiro, vale relembrar o funcionamento da política monetária.

O BC fixa a taxa básica de juro para controlar a inflação. Quando o Copom anuncia a Selic, ele está dizendo que criará ou destruirá moeda no montante necessário para manter o juro no valor anunciado.

Em dias de falta de liquidez, o BC cria moeda comprando algo do mercado, geralmente títulos públicos e câmbio. Se o BC não fizer isso, o juro subirá acima do valor estipulado pela Selic, à medida que o mercado busque desesperadamente por liquidez.

Por analogia, em dias de sobra de liquidez, o Banco Central destrói moeda vendendo algo ao mercado. Se o BC não fizer isso, o juro cairá a zero à medida que as instituições financeiras tentarem se livrar do excesso de liquidez.

Entra o depósito voluntário. Hoje, como o BC não pode captar recursos, ele normalmente vende títulos públicos federais ao mercado quando é necessário enxugar liquidez. Mas e se o BC não tiver títulos públicos suficientes para o enxugamento necessário? Nesse caso, o Tesouro emite títulos diretamente para o BC, por razões de política monetária.

Em outras palavras, parte de nossa dívida pública foi criada por demanda do BC, para administrar a liquidez da economia, e não por desequilíbrio fiscal do Tesouro.

Se o BC puder captar depósitos voluntários, não será necessário que ele peça títulos ao Tesouro em momentos de enxugamento de liquidez. Com isso, ficará mais claro o que é dívida gerada por desequilíbrio fiscal e o que é dívida gerada por política monetária.

Os bancos centrais de vários países avançados adotam depósitos voluntários, mas a medida gerou críticas no Brasil.

Na esquerda, segundo o keynesianismo voluntarista (do qual Keynes nunca foi parte), o BC vai "remunerar sobra de caixa dos bancos". A observação é correta, mas os colegas se esqueceram de dizer que isso já acontece via operações compromissadas.

A crítica de esquerda é baseada na ideia de que o BC pode e deve injetar mais e mais moeda na economia, abandonando o controle da Selic. O voluntarismo está na crença de que isso não gerará inflação.

Os leitores sabem que prefiro chamar as coisas pelo nome. Criticar depósitos voluntários porque isso remunera bancos é, na verdade, uma defesa de juro mais baixo. Pode fazer sentido em alguns momentos, mas acho que não hoje, com inflação em 8% ao ano.

Passando à direita, alguns neoliberais desonestos dizem que depósito voluntário é "manobra" para reduzir a dívida pública do governo geral (União, estados e municípios), pois o que hoje aparece como título federal virará passivo do BC.

Como toda desonestidade, a crítica parte de um fato correto: trocar operação compromissada por depósito voluntário reduz a dívida bruta do governo geral. Qual é a desonestidade? Se juntarmos governo geral e BC, a dívida bruta continua a mesma.

Traduzindo do economês, nossas estatísticas fiscais são bem detalhadas. É possível saber exatamente qual é dívida da União, dos estados e dos municípios, de um lado, e do BC, do outro lado.

Não há mágica ou manobra na criação de depósitos voluntários. Mas, para deixar isso bem claro, o governo deveria divulgar o balanço do consolidado do BC e do Tesouro em um formato mais amigável ao não especialista. Fica a dica para Roberto Campos.

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