É escritora e colunista de gastronomia da Folha há 25 anos. É formada em Educação pela USP e dona do Buffet Ginger há 26 anos.
Escreve às quartas-feiras.
Do sítio em Paraty
Bruno Santos/Folhapress | ||
De Paraty. Flip. Pedras e mais pedras, ruas de pedras, tem muitas pedras no caminho, ai os pés, ai a coluna, os neurônios, todos tontos olhando o chão, Lima Barreto se vinga dos admiradores. Chegamos na intervenção da negra que viralizou na internet. Bonita, forte, todo mundo de pé, aplaudindo, choraram sua vida de menina, filha de lavadeira entregando roupa, estudando, lendo para fugir do destino, da sorte mofina, querendo crescer, chegar à Flip. E chegou.
Na porta do sítio, à noitinha, havia excluídos, não excluídos na Flip, personagens de Faulkner e Flannery O'Connor, sul profundo, Brasil profundo, um homem alto, magro, sem dentes, foice enorme na mão, à procura de um porco fugido. Balbuciava e ria sem nexo, bermudas de algum turista americano deixadas para trás e no peito em letras garrafais "Fuck, fuck, fuck".
Nas malas da visita portuguesa vieram compotas, doces feitos por dona Catarina, no Algarve. Doce de abóbora com nozes, de pêssegos, de melão e de tomate... Tomates rosa, feios, mas gostosos. Maria, do Brasil mesmo, mandou figos mínimos em doce, lindos como esmeraldas, umas jóias. Colhidos mal despontam.
Lina portuguesa trouxe farinheiras de Monchique, uma zona serrana junto de Lagos. É um enchido de farinha de milho com carne de porco picada, sangue e especiarias, bastante cominho. Alheiras do Zezere, pão de trigo, galinha e temperos especiais.
Estamos bem. Na Flip dos excluídos vamos comer à portuguesa.
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