Nosso estranho amor

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Descrição de chapéu casamento

Antonio Chofer: 137 casamentos, solteiro

'Todo casal tem uma história', diz o motorista de casórios em São Luís

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O chofer das noivas de São Luís não quer se casar. Antonio Chofer chega a setembro de 2021 com 137 casamentos realizados na capital do Maranhão. E o mesmo número de causos. “Todo casal tem uma história”, diz Antonio, detrás do volante.

Ele já presenciou muitas. Das que parecem ter saído de um filme água com açúcar americano, como os noivos que moraram 17 anos em apartamentos colados sem dizer mais do que “boa tarde” e foram se esbarrar no Rock in Rio –casaram-se três meses depois. E das que estão mais para uma comédia nacional, como o casal que, às quatro da manhã, a caminho do hotel, passou perto de um show de forró. A multidão abriu passagem para os noivos descerem do carro e Xand Avião chamou os dois para o palco, enquanto Antonio assistia da plateia.

Motorista espera casal de noivos em Nizhniy Novgorod, na Rússia - Mladen Antonov - 26.ago.2017/AFP

Aos 34 anos, de barba preta cerrada e queixo apolíneo Antonio também tem uma história com casamentos, que começa no dia da cerimônia de uma prima, em 2019. O motorista que ela tinha contratado deu chá de sumiço no dia. “Como eu era o cara solteiro, eu resolvi levar.” Buscou a parente e a deixou na igreja dos Remédios. Semanas depois, uma amiga dela o chamou. Perguntou quanto cobraria para conduzi-la. “Como assim, cobrar? Eu nem sabia que isso existia.”

Existia e as clientes não paravam de chegar. A carreira casamenteira veio um ano após o término do último namoro, que durou quase uma década e quase acabou em casamento. Quase. “Eu tava na bad ainda.” Solteiro, ele queria mesmo se aquietar no fim de semana, então juntou o útil com o rentável. Em 2019, passou seis meses com casamento todas as sextas, sábados e domingos. Foi aí que as histórias começaram a se acumular.

No dia mais tenso, a noiva pediu para parar a Mercedes C180 preta, gritando. “Para o carro! Eu não vou mais casar.” No começo, ele achou que fosse brincadeira. Até que ela disse. "Para o carro, agora, Antonio, que eu tô mandando.” Pediu para voltar ao hotel. Ele estacionou na orla e ligou para a mãe da noiva, que o tinha contratado. “Eu não sei o que eu faço.” A mãe reagiu com placidez. “Eu já chego”, ela disse. Antonio comprou uma água de coco para a noiva, ele desceu e foi fazer uma hora na orla, enquanto as duas conversaram por meia hora. A mãe desceu e falou: “Pode ir, está tudo resolvido.” Quando voltou ao banco da frente, ele só perguntou à noiva, sem olhar para trás, o que deveria fazer. “Se ela quisesse ir para o aeroporto, ou de volta para casa, eu levaria.” Ela respondeu: “Pode seguir o que minha mãe falou”, desceu do carro na igreja e se casou com o filho de outra família da elite do interior do estado.

Outra noite que ele não vai esquecer é quando a noiva, a caminho da igreja São Marcos, contou que o casamento era uma cena. O noivo era gay, e tinha feito uma proposta para poder ir em paz morar com o namorado na Europa. Caso ela topasse, iria junto para o exterior, onde haveria um emprego esperando por ela. Ela topou.

Nos grupos de WhatsApp de noivas da cidade, frequentados por pré-nupentes como a blogueira Juliana Mendes, ele é conhecido como Antonio Famosinho. Às vezes, se diverte no trabalho. “Madrinha, já peguei muita.” Às vezes, não. “Já teve noiva que nem deu boa noite.” Outra só o chamou de “moço” a noite inteira. Até ele lembrar que tinha um nome, e que era Antonio. “Isso deixa a gente bem triste, porque quando uma noiva me contrata eu passo a vivenciar o sonho dela também.”

Prestes a se formar em engenharia na Estadual do Maranhão, ele vê uma bifurcação de trajetórias: pode migrar para a profissão que estudou ou crescer o negócio de conduzir mulheres de branco. Ia realizar o sonho do carro próprio, mas a pandemia colocou o negócio em ponto morto. Foram nove meses sem fazer nenhum casamento, mas agora está engatando a primeira de novo.

O homem que já esteve em 137 casamentos não pretende conduzir uma mulher ao altar. “Quando eu olho o pessoal casando, eu não sinto vontade. Eu gosto demais do meu momento de liberdade.”

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