Nosso estranho amor

Paixões, desencontros, estabilidade e loucuras segundo Anna Virginia Balloussier, Pedro Mairal, Milly Lacombe e Chico Felitti. Uma pausa nas notícias pra gente lembrar tudo aquilo que também interessa demais.

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Nosso estranho amor
Descrição de chapéu Relacionamentos

Ana Carolina desesperadamente amou

A história da jovem que se descobriu uma Mada: Mulheres que Amam Demais Anônimas

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São Paulo

"Babaca", escreveu Ana Carolina Porto antes de enviar o emoji de um coração partido para legendar a foto de uma camisa do Corinthians estraçalhada. Ela a tinha picotado a tesouradas.

Foi no intervalo de uma partida do time paulista que ele havia conhecido a atual namorada. Isso Ana Carolina soube assistindo a um stories em que o novo casal contou tudo sobre o dia mágico —a fila da cerveja, a vontade dela de fazer xixi, o flerte meio troncho que acabou com os dois se adicionando no Instagram. Teve vontade de vomitar com o beijo de língua que deram no final do vídeo. "Minha vontade era pegar uma faca e retalhar ‘piranha’ na barriga dela."

Recobrou o juízo e concluiu que seria muito mais civilizado esperar o ex sair para trabalhar, invadir a casa dele (o porteiro gostava dela, e ela ainda tinha uma chave reserva) e trucidar a peça que ele comprou por R$ 300, uma pequena fortuna para um estagiário de publicidade.

Coração vermelho sem uma parte, que está destacada na cor cinza
Pixabay

Ana Carolina passou aquela noite escutando a versão da sua xará cantora para os versos de Tom Jobim e Vinicius de Moraes: "Eu sei que vou te amar/ Por toda a minha vida eu vou te amar/ Em cada despedida eu vou te amar/ Desesperadamente eu sei que vou te amar".

Acontece que a universitária também desesperadamente amou nos três relacionamentos que teve depois. Não chegou a namorar nenhum dos rapazes. Com um deles, inclusive, tinha ficado apenas duas vezes, até ele parar de respondê-la do nada em todas as redes sociais, como se nunca tivessem falado em viajar juntos para a Chapada dos Veadeiros depois de transar no banheiro da balada. Um caso clássico de ghosting. Passou a comentar tudo o que ele postava até ser bloqueada de vez. Nunca mais o viu na universidade. Desconfia que ele mudou de turno.

Os amigos a chamam de Rainha da Sofrência. O psicólogo outro dia insinuou que ela pode ser caso de psiquiatra. A mãe se preocupa, porque toda vez que Ana Carolina se desilude, ela para de comer e emagrece tanto que cabe no jeans da irmã caçula, que mal entrou na adolescência. Faz o bolo de fubá com cobertura de chocolate que a filha tanto gosta, para ver se para com essa besteira de sofrer com o estômago.

Nessas horas, Ana Carolina não gosta do que vê no espelho. A expressão sempre chocha, o corpo esquálido. Por conselho de uma amiga, leu na internet que é uma Mada, sigla para Mulheres que Amam Demais Anônimas. Uma espécie de Alcoólicos Anônimos para mulheres como ela, que não sabem experimentar paixões com moderação. Ela bebeu uma garrafa inteira de vinho rosé naquela noite e mandou mensagem para uns cinco carinhas do passado. Ninguém respondeu.

Pediu então um delivery de sorvete que demorou a chegar, que quando chegou já estava um pouco derretido. Comeu o pote todo, quase meio litro de gelato de morango que harmonizou com o bolo da mãe. No dia seguinte, o corintiano mandou um "oi". Talvez tivesse terminado com a Senhorita Amor Eterno.

Mas isso ela nunca soube, porque não respondeu aquela mensagem, como também não interagiu com os corações que o ex enviava a cada foto nova que ela atualizava no status. Na última, está de cropped vermelho e óculos escuros. Manda um beijinho para a câmera. Está feliz. O nome dela é Ana Carolina, e ela está há duas semanas e três dias desesperadamente amando a si mesma.

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