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Leandro Beguoci é diretor editorial de Nova Escola (novaescola.org.br). Ele explica sobre o que funciona (e o que não funciona) na educação brasileira.

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Educação domiciliar reforça ideia errada sobre professores

Todo mundo tem algo a ensinar, mas nem todo mundo sabe dar boas aulas

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Longe de mim ignorar as cerca de 5.000 famílias brasileiras que ensinam os filhos em casa. Se há brasileiros arremessados para a ilegalidade, é preciso criar um caminho para tirá-los de lá. Porém, essa deveria ser uma discussão dimensionada pelo tamanho do problema. Nada justifica um debate tão grande sobre educação domiciliar num país com 70 milhões de famílias. Ainda mais quando lembramos que a esmagadora maioria dessas pessoas não tem condições de transformar a sala de casa em uma sala de aula —seja por renda, tempo ou formação.

Por isso, a decisão do presidente Jair Bolsonaro em listar o homeschooling, a educação domiciliar, como prioridade é um sinal preocupante de falta de foco. Afinal, a energia do governo não é infinita. Para regulamentar essa modalidade, será preciso definir o escopo, debater as obrigações dos pais e, finalmente, levar a proposta para o Congresso, como explica reportagem recente da Nova Escola.

Em vez de gastar tempo nisso, o Palácio do Planalto poderia priorizar a política nacional de formação de professores. Já existe até uma proposta feita pela gestão anterior do MEC na mesa. É só colocar em discussão.

Infelizmente, o debate sobre educação domiciliar não é apenas um dreno de capital político. É pior. Da forma como está sendo feito, opondo escolas e famílias, ele deseduca a sociedade.

O primeiro, e mais importante, é um reforço de conceito. Conceito errado, aliás. A educação domiciliar parte do pressuposto de que pais estão preparados para ensinar os filhos apenas por serem… pais. A maternidade e a paternidade são missões amplas e árduas. Justamente por isso, não se esgotam em si. Quando a criança está com febre, ela vai ao médico. Pouquíssimos pais, exceto os formados em medicina, se sentiriam seguros em tratar filhos com febre alta em casa. A questão é que nós aceitamos, em educação, o que não aceitamos em nenhuma outra parte da vida.

Educar uma criança é difícil. Exige conhecimentos específicos, apurados não apenas durante a graduação em pedagogia, mas sobretudo no dia-a-dia da sala de aula. Ao longo dos últimos anos, aliás, o movimento de valorização do conhecimento criado pelos docentes vem crescendo. Muitos especialistas apontam que os professores desenvolvem técnicas ao longo da carreira e que as melhores deveriam ser expostas e debatidas nas faculdades de educação —o que ainda não ocorre na escala necessária.

O livro “Gestão de Sala de Aula”, para ficar num caso, fala desse conhecimento e dá exemplos práticos para quem se interessa pelo assunto. Vale muito para quem quer entender a organização da rotina escolar. Porém, se você quiser uma abordagem mais ampla sobre o assunto, vale a pena ler o livro “Formando mais do que um professor” —escrevi sobre ele aqui. Ele desmistifica a ideia de que basta ter boa vontade e gostar de crianças para ensinar. A obra conta a história das escolas americanas e explica as idas e vindas da formação dos docentes nos EUA. Se você está lendo essa coluna, sei lá, pela quinta vez, bem, você vai gostar muito do livro da Elizabeth Green.

Se as famílias brasileiras quiserem fazer algo pela educação dos seus filhos, o pior caminho é levar as crianças para casa. Além de privá-las do convívio em sociedade (afinal, os pequenos não poderão viver numa bolha para sempre), vão reforçar o mito de que qualquer um pode ensinar. Se você concorda que o Brasil deve valorizar os professores, então cobre o governo para colocar a educação dos educadores como prioridade. Garanto: será uma energia infinitamente mais bem gasta. Só existe boa aula com bons mestres.

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