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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Para Salim Mattar, Bolsonaro precisa de apoio, e o centrão está disposto

Empresário, que deixou o governo nesta terça, diz que sai maior do que entrou

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São Paulo

O empresário Salim Mattar, que nesta terça (11) entregou o comando da secretaria de desestatização do governo Bolsonaro culpando os interesses políticos e o establishment pelo atraso nas privatizações, diz que deixa o governo com a sensação de que saiu maior do que entrou.

Mattar avalia que Paulo Guedes "foi feliz nas colocações" ao anunciar seu desligamento com o também secretário Paulo Uebel (Desburocratização). Na ocasião, o ministro disse que, se o presidente Jair Bolsonaro seguir conselhos para furar o teto de gastos, pode ir parar na "zona sombria" do impeachment.

Para Mattar, a fala de Guedes não foi um recado enviado a Bolsonaro, mas apenas um momento de sinceridade em que o ministro aproveitou a ocasião para exaltar as privatizações e a reforma administrativa.

Sobre o saldo de seu trabalho, ele diz que poderia ter sido maior, se não tivesse acontecido a pandemia ou se Bolsonaro tivesse uma base maior no Congresso, mas o presidente "não quis entrar no toma-lá-dá-cá".

"O presidente precisa de apoio, e o centrão está disposto a apoiar o presidente", afirma Mattar.

*

Salim Mattar, ex-secretário de Desestatização do Ministério da Economia - Reuters

O ministro Paulo Guedes colocou um dilema ao presidente na noite desta terça-feira (11) quando disse que ele não deveria ouvir conselhos para furar o teto, ou seria levado para as sombras. O que o sr. achou disso? O establishment se acostumou com isso. Depois de 30, 40 anos. Tem muitos órgãos que preferem que as empresas não sejam privatizadas porque senão esses órgãos vão ser diminuídos de tamanho. É o establishment se movimentando. Isso também é parte da democracia. Temos que entender que é direito das pessoas defenderem pontos de vistas diferentes.

Não tinha uma saída mais leve? O que se diz é que o presidente tem uma preocupação eleitoral e, portanto, para ele seria importante furar o teto para manter o auxílio emergencial. Mas ele poderia ir passando a reforma e tocando a privatização ao mesmo tempo? Eu não vou entrar nessa seara. Prefiro ficar na desestatização.

O sr. diz que entregou 84 empresas e que isso rendeu R$ 150 bilhões mas o sr. falava em um plano de R$ 1 trilhão. Será que alardear esse número pode ter cansado ou desgastado o sr.? Eu não estou cansado. Continuo motivado. A única coisa que eu acho é que eu tenho alternativas. Tenho direito de escolha. Uma era ficar no governo e a outra, voltar à minha vida pessoal e dedicar o meu tempo aos institutos liberais que eu tanto gosto. Temos 120 institutos no Brasil. E agora, depois da pandemia, vimos que não precisa mais das reuniões presenciais. Vou me dedicar a fazer com que nossos institutos sejam mais virtuais para penetrarmos no interior para disseminar o ideário liberal.

Mas, voltando ao governo, eu acho que a nossa realização foi espetacular. Ficamos travados por um tempo por causa da reforma da Previdência. Depois teve férias do Congresso e, quando voltou, a pandemia começou.

Não tivemos tanto tempo assim e vendemos R$ 150 bilhões de desestatizações e desinvestimentos e vendemos 84 empresas. É um grande feito. Constituímos uma equipe espetacular com servidores de carreira e profissionais que eu trouxe do mercado. É um legado que estamos deixando. E a formatação que fizemos no BNDES, tem 14 empresas para vender. Se quiser jogar mais três, cinco ou dez, simplesmente, é uma esteira. Fizemos o mais difícil, que é preparar o formato dessas privatizações.

Outra coisa que se diz é que talvez o sr. pudesse estar no lugar errado porque debaixo da sua secretaria não tem nenhuma estrutura responsável pelas grandes privatizações. Não teria sido melhor o sr. ter ido para o BNDES no momento da saída de Joaquim Levy no ano passado? Existe uma legislação de governo. Para se vender estatal tem que seguir um arcabouço jurídico enorme. Então, ainda que essas empresas estivessem na minha secretaria, só o BNDES pode vender. É um monopólio que existe dentro do governo. A social-democracia passou aqui por 30, 40 anos. Eles são favoráveis ao estado grande. Para poder vender uma empresa é assim. É muito difícil.

Não seria melhor terem colocado o sr. no BNDES, ou o sr. ter ido para lá? No ano passado, eu fui convidado para ir para o BNDES. Eu recusei e indiquei o Gustavo Montezano. Ele é um banqueiro por natureza. Eu sou do mundo dos negócios mas não sou banqueiro. Como eu tinha esse projeto de privatização que transita no Ministério da Economia, achei que seria mais importante ficar em Brasília, cuidando da relação com os outros ministérios para liberar empresas a serem privatizadas, do que ir para o BNDES. E depois, o Gustavo Montezano é absolutamente ligado conosco.

Talvez o senhor tenha perdido muito tempo defendendo a venda de imóveis? As nossas estatais valem R$ 1 trilhão. Só que o presidente falou: 'não vende Banco do Brasil, Petrobras, Caixa'. Por mim, privatizaria tudo, venderia todas as estatais. E em imóveis nós temos também um valor como esse. Nós aprovamos a Medida Provisória 915, que facilita a venda de imóveis. A partir de agora, estamos começando com leilões toda terça e quinta, até o fim do ano e já temos um pipeline de 209 para leilão.

Desde o começo do governo, quantos imóveis foram vendidos até agora? Não sei.

E quantos foram colocados à venda? Não sei. Agora, com a aprovação da MP 915, que começou efetivamente a venda de imóveis. Antes era aquele processo antigo. Agora é um processo novo, virtual. Facilitamos a participação nos leilões que antes eram presenciais.

O senhor também sempre dizia em palestras que os empresários estão nesse momento de ir para política. E sr. sempre colocou isso como uma renúncia, como se fosse uma doação para melhorar o país. E agora? Eu saio ganhando porque eu estou saindo maior do que eu entrei, em 1º de janeiro de 2019. Eu estou saindo com mais conhecimento. Foi uma experiência única trabalhar no governo. Impagável.

O sr. continua recomendando que outros empresários e executivos procurem trabalhar no governo? Sim. É importante que o pessoal da iniciativa privada venha para o governo. Tem dois ganhos: para quem trabalha, é o de conhecer como são as coisas do governo, e, para o estado, o ganho de ter gente da iniciativa privada com outro padrão de trabalho e eficiência.

O pilar do combate à corrupção caiu quando Sergio Moro saiu do governo. Agora saem os pilares da privatização e da reforma administrativa? O governo fica enfraquecido depois das baixas? Não porque ainda tem muitos liberais no governo. O número foi reduzido em dois. Mas não chega a enfraquecer porque mais importante do que o número de cabeças são as ideias. E as ideias de implementação da doutrina liberal continuam.

Qual é a sua avaliação sobre a fala do ministro Paulo Guedes de ontem? Da maneira como o ministro coloca, se o presidente ouvir os conselhos de furar o teto ele pode levar o país para o caminho de sombras? O ministro Guedes é muito sincero e foi muito feliz nas colocações dele. De fato, precisam da reforma administrativa e as privatizações mais aceleradas. Ele foi muito franco e disse isso ontem. Ali era um bom momento. Era uma coletiva de imprensa, se falava sobre o teto de gastos. Era um momento oportuno e ele, aproveitando aquele momento, em que eu e Uebel estávamos saindo, falou da importância das privatizações e da reforma administrativa.

Ele colocou como uma coisa que exclui a outra? O presidente ficou diante de uma escolha? Eu acho que o ministro Guedes não quis mandar um recado para o presidente. Ele estava dizendo: 'olha, pessoal, temos que privatizar, mandar a reforma'. É claro que isso vai chegar ao presidente, aos congressistas e ao establishment. Não existe um culpado, uma pessoa que está segurando isso. É um conjunto da sociedade aqui em Brasília. Pode estar no parlamento, no Judiciário ou no Planalto. Ele quis dizer que está na hora de fazer uma reflexão.

Há duas semanas, o Lauro Jardim, colunista do jornal O Globo, publicou uma nota dizendo que o sr. iria sair. Aí o sr. transformou isso em uma batalha contra o jornalismo, dizendo que era fake news. E agora o senhor saiu, não é? Mas aquilo era fake news naquele dia.

Mas o sr. está fora do governo. Hoje eu estou fora do governo. Eu me demiti ontem. Ele deu aquela notícia mas não tinha fundo de verdade. Ontem, eu procurei o Guedes e conversei com ele. A notícia do Lauro Jardim não procedia. É como falar que amanhã vai chover. Se chover, eu sou uma pessoa que sabe o futuro? Choveu por uma coincidência mas eu não sabia se ia chover. Agora, o importante é que eu estou saindo do governo com sensação de dever cumprido.

O senhor tomou a decisão ontem? De uma hora para outra? Não teria sido, então, uma decisão precipitada? Não foi uma decisão tomada ontem. Ontem, eu informei o ministro. Eu gastei um ano para tomar minha decisão de vir para o governo.

Mas a decisão de sair foi feita em menos de 15 dias? Não. Todo mundo tem que ter um plano B: 'estou no governo mas se der qualquer coisa errada aqui, o que eu vou fazer?'. Eu fui para o governo de corpo e alma, mudei para Brasília e assumi a postura do meu cargo. Fiz uma boa entrega, de R$ 150 bilhões neste período, reduzi 84 estatais. Poderia ter sido mais? Poderia. Se não tivesse a pandemia poderia ter sido mais. Se o presidente tivesse uma base maior no Congresso poderia ser mais? Poderia. Mas o nosso presidente não quis entrar no toma-lá-dá-cá.

Mas essa história de que o presidente não teria aceitado fazer o toma-lá-dá-cá não é um discurso desatualizado? Não se diz mais isso com a aproximação do presidente ao centrão. O presidente precisa de apoio, e o centrão está disposto a apoiar o presidente. O governo Fernando Henrique Cardoso teve que, de alguma forma, obter a maioria no Congresso, por maneiras que eles chamam de democráticas. O Lula obteve maioria no Congresso por maneiras também ditas democráticas feitas no governo de coalizão.

Agora, o governo Bolsonaro começou isso há 60 dias. Feito muito de leve. Não tem nenhuma pessoa na Caixa, no Banco do Brasil, no BNDES, na Petrobras, na Eletrobras. É muito superficial. O presidente tem contado com o apoio do centro democrático e tem de alguma forma contemplado algumas solicitações, mas muito pequenas. Se você comparar isso com períodos anteriores, vai ver que é ínfimo, e conseguindo um apoio até bem razoável.

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