O governo de SP liberou a reabertura dos cinemas a partir de sábado (24), mas André Sturm, dono do Petra Belas Artes, decidiu manter as portas fechadas. Nem a sazonalidade do Oscar, neste domingo (25), o motivou a retomar. Ele diz que as restrições de horário e capacidade inviabilizam a operação, mas a decisão foi mais conceitual. Só volta após a vacinação dos 60 anos. "Seria oportunista abrir para aproveitar o Oscar", diz.
Os cinemas foram liberados, mas vocês resolveram não voltar. O motivo foi a restrição da capacidade? Com 25% a operação não fica de pé? Não foi por isso, embora isso seja um problema. Foi uma decisão anterior. Nesse abre e fecha, as pessoas não sabem mais se está aberto ou fechado. Cinema é decisão de momento. Não é comprado com antecedência. É assim: "Vamos no cinema? Será que está aberto? Não sei. Então não vamos, fazemos outra coisa".
A outra questão é que quando reabrimos em janeiro, programamos festivais, mostras, retrospectivas. Mas, ao mesmo tempo, começamos a sentir um desconforto, porque, embora no cinema eu garanta a segurança sanitária, a pessoa tem que sair de casa e chegar no cinema. Então, de certa maneira, quando está subindo a Covid, e a gente precisando de isolamento social, é meio contraditório eu abrir o cinema, fazer uma programação super legal e ficar convidando as pessoas.
Em março, eu tomei a decisão de que só vamos reabrir quando as pessoas de 60 anos tiverem tomado a segunda vacina. Aí eu acho que a gente já tem uma certa segurança que permite convidá-las para voltarem aos cinemas.
Vocês chegaram a abrir sala para um cliente apenas? Chegamos a fazer sessão de uma pessoa. Teve até sessão cancelada. Estava começando a ter um crescimento, porque estávamos fazendo essas mostras, mas aí veio o novo fechamento. Não adianta.
Qual é o número mínimo de clientes em uma sala para uma apresentação se pagar? É difícil falar por sessão porque cinema não é teatro. Tem um custo fixo muito grande. Fazendo uma conta, na média, precisa ter pelo menos umas 40 pessoas na sala para valer a pena. Claro que tem sessão com 10 pessoas porque tem outras com 90.
Em percentual, para um cinema valer a pena, ele precisa ter uma taxa de ocupação de pelo menos 20% na média. Mas esse limite de 25% não é suficiente porque o público é heterogêneo. Então, terça com 25% está ótimo, mas sábado tenho que fazer 100%. Ter 25% todo dia de limite é inviável para o negócio.
Você decidiu demitir todo mundo, mas depois vão recontratar? E o custo que tiveram para demitir? O plano é esse. A gente disse para as pessoas que, quando fosse voltar, elas seriam as primeiras a serem convidadas. São dois raciocínios. Eu dispensei as pessoas com honestidade, paguei o que tinham para receber, cancelei os contratos de manutenção que podia.
Sinceramente, eu tirei um peso das costas. Eu estava diariamente desesperado porque tinha que pagar uma conta muito grande. Foi muito duro. Tive um desembolso terrível de pagar os direitos de todo mundo. Mas eu não tinha mais de vender o café da manhã para pagar o almoço, e o almoço para pagar o jantar.
O custo caiu muito. E quando se demite e paga os direitos, isso é um passivo que uma hora você teria de pagar. Se eu recontratar, eu não tive um prejuízo, eu tive um desembolso. A única vantagem seria se alguém se demitisse, aí eu economizaria o fundo de garantia.
Mesmo tendo o Oscar neste domingo vocês acharam que não valeria a pena voltar? Véspera de Oscar costuma ter movimento, não? Sempre. É uma temporada maravilhosa. Mas tem que fechar às 19h. A última sessão seria às 17h. E com 25% de ocupação. Eu ia abrir o cinema, só ia valer a pena eu operar duas salas, uma de 260 e outra de 300.
Eu ia fazer uma sessão às 14h e outra às 17h. Não valeria a pena. E eu tinha decidido que só abriria quando as pessoas de 60 anos estivessem vacinadas. É um conceito. Seria oportunista abrir para aproveitar o Oscar. Não faz sentido. Não foi esse raciocínio de 25%. Absolutamente.
O que espera deste Oscar? Esse vai ser um Oscar muito atípico. Dizem que esse é o Oscar da Netflix, que tem não sei quantas indicações. Mas é evidente que as outras distribuidoras que lançam os filmes no cinema não lançaram. É até por falta de concorrência que a Netflix tem muito filme nas indicações. Eu não acho que podemos dizer que a Neflix alcançou um nível de qualidade e competitividade, porque a concorrência é quase inexistente. São muito poucos os filmes que puderam estrear no cinema com pegada de Oscar.
Muitos tiveram suas estreias adiadas. Quais seriam os filmes para passar no cinema do Oscar? Vários não estariam disponíveis. Ia ser muito limitada a possibilidade. É um Oscar atípico. Sem desmerecer, são bons filmes, mas eu considero uma seleção muito mais fraca do que as anteriores.
E o streaming de vocês, como está? Vai crescendo. É lento, não temos milhões para gastar em mídia, mas ele cresce sempre. Temos uma média de permanência de 11 meses no nosso streaming. É legal isso. Precisamos crescer mais para que a operação fique totalmente viável, mas é gratificante. Acho que é a única coisa neste momento que dá entusiasmo, porque eu vejo crescer e vejo resultado. Neste mês completamos um ano.
André Sturm
Graduado em administração de empresas pela Fundação Getulio Vargas. Foi diretor do MIS-SP, onde organizou exposições como Kubrick, David Bowie e Castelo Rá Tim Bum. Entre 2017 e 2019, foi secretário da Cultura do Município de São Paulo
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