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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Exigir comprovante de vacina para visitante foi uma decisão acertada, diz Bondinho Pão de Açúcar

Sandro Fernandes, presidente da empresa que acaba de completar 109 anos em meio à pandemia, afirma que começa a sentir a retomada

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São Paulo

Os 109 anos que o Bondinho Pão de Açúcar completou na semana passada estão sendo celebrados com a retomada do fluxo de visitantes após mais de um ano de turbulência da pandemia, que abalou o setor de turismo.

O faturamento da empresa caiu cerca de 70%, mas desde julho o cartão postal vem registrando recuperação. Já começa a ser sentida a presença de visitantes de estados como São Paulo, Minas Gerais e Goiás. Segundo Sandro Fernandes, presidente da companhia, a volta dos estrangeiros ainda é embrionária. Se em tempos pré-pandemia os turistas internacionais representavam 35% da demanda, ante 65% dos brasileiros, no cenário atual, o estrangeiro equivale a 2% da visitação.

No mês passado, um decreto municipal passou a exigir comprovante de vacinação contra a Covid, medida que tem funcionado, segundo Fernandes. "Apoiamos muito essa decisão porque reforça a preocupação com segurança sanitária. Entendemos que foi uma decisão acertada", diz.

Sandro Fernandes, presidente do Bondinho Pão de Açúcar - Dirceu Neto/Folhapress

Como foi o começo dessa empresa? Em 1909, um engenheiro, cafeicultor, Augusto Ferreira Ramos, olhou para essas duas pedras e teve a visão de colocar cabos para ligá-las e dar às pessoas a oportunidade de subirem em uma das rochas mais lindas do mundo para observar a cidade. Isso colocou o Rio e o Brasil como um dos cartões postais do mundo. Foi impactante para a época. E não tinha os equipamentos aqui. Tudo foi fabricado fora do país.

Para conseguir isso, ele vendeu cotas do Bondinho Pão de Açúcar para angariar fundos, ir na Alemanha, mandar fabricar, importar as peças, trazer 300 pessoas que o ajudaram na construção dos cabos. Teve que importar cimento. As polias eram tão grandes para entrar no porão do navio que foram cortadas ao meio e aparafusadas aqui. Temos aqui ainda guardadas no nosso acervo as polias originais.

Na década de 1960, havia aqui um tipo de capim muito ruim, e a fauna e a flora começaram a ser recuperadas por Cristóvão Leite de Castro [engenheiro que ingressou na companhia como diretor técnico em 1930, assumiu a direção em 1962 e trocou os antigos bondinhos de madeira por novas cabines em 1972].

Como os bondes foram modernizados ao longo do tempo? Estamos atualmente na terceira geração de bondinhos. É até preciso explicar por que se chama bondinho. A primeira cabine, quando começou a operação, em 1912, se assemelhava ao bonde de Santa Teresa, que era maior. Então foi apelidado carinhosamente de bondinho. E o brasileiro usa a palavra como sinônimo de teleférico. Essa primeira cabine funcionou de 1912 a 1972. Aí veio a segunda geração de cabine, com o formato de um diamante.

Estamos agora na terceira geração, desde 2007. E o conceito principal, de ser como uma joia que pode andar pelo céu do Rio, se manteve. Grandes celebridades passaram por aqui. Einstein, Bob Marley, Malala e os quase 50 milhões de turistas.

E a história clássica do Tim Maia? Ele chegou para fazer um show que tinha o Nelson Motta como produtor. Estava lotado, mas quando ele chegou na estação, falou que não ia subir. Pediu para receber todo o cachê em dinheiro na hora. Correram para arrumar o dinheiro, mas aí ele disse que queria em moeda e que não subia em hipótese alguma. Pediu para as pessoas descerem para ele fazer o show lá embaixo. Com muita insistência, ele subiu. Aterrorizado. Deitado no chão. Mas quando chegou, olhou a beleza do morro da Urca. E a partir dali passou a fazer vários shows no nosso anfiteatro, que também recebeu Hermeto Pascoal, Dancing Days e vários outros.

O 007 também passou por aqui. Receber Roger Moore foi uma grande vitrine. Tem uma história que demonstra bem os nossos valores, que é a questão da segurança. Para a execução do filme, foi negociado que a cabine nada poderia sofrer. Tem uma cena em que a cabine entra e destrói a estação, porém, ela sai intacta. Foi uma exigência, porque precisa denotar a questão da segurança a todos que nos visitam.

Tem algumas curiosidades que as pessoas não sabem. Para fazermos eventos tem uma logística. Temos que subir com equipamentos. E para isso tem uma linha teleférica dedicada só às cargas. Também temos que fornecer a energia, o tratamento de resíduos, esgoto.

Vocês já viveram uma pandemia e hoje estão vivendo de novo. Alguma experiência foi aproveitada? Tivemos que ficar fechados sem operação durante cinco meses no ano passado. Mas teve a redescoberta, principalmente do carioca. Estamos sendo muito demandados por pessoas buscando espaços abertos.

Qual foi a dimensão do baque? Impactou drasticamente os nossos resultados. Comparado com 2019, em 2020, caímos aproximadamente 70% em visitação e, consequentemente, em faturamento. Em 2021, estamos começando a recuperação. De julho para cá já se sente uma recuperação, não só com os cariocas, mas com o público de São Paulo, Minas Gerais e Goiás. E já estamos sentindo também a procura de estrangeiros. Neste ano deve chegar a 70% ou 80% de um ano normal como 2019.

E os estrangeiros? Nos últimos meses, temos observado o aumento da presença de estrangeiros. Muito pela queda da necessidade de quarentena para quem volta do território brasileiro à Europa. Tem crescido dia a dia. Em um ano normal, temos 35% de turistas internacionais e 65% nacionais. Hoje, estamos em 98% de nacionais na visitação.

E como foi a experiência de exigir carteira de vacinação? Desde de 15 de setembro, um decreto municipal exigiu a apresentação da carteirinha. Apoiamos essa decisão do governo municipal porque reforça a preocupação com segurança sanitária. Não tivemos nenhum problema. Quando alguém esquece, reagendamos a visitação para outro dia. Entendemos que foi uma decisão acertada.

Como ficam os investimentos nesse cenário? Neste ano, fizemos as trocas das nossas polias motrizes. Foi um investimento de mais de R$ 13 milhões. A operação de troca é complexa.

Vocês também fazem as parcerias com outras empresas? Como ficou isso? Trabalhamos em três plataformas, que são turismo, entretenimento e mídia. O turismo é muito consolidado. O entretenimento, com as nossas atividades, também. Em março, por exemplo, teremos mais uma edição do Noites Cariocas. E o terceiro pilar é o de mídia.

Com a nossa alta visitação, somos procurados para mídia. Nesse pilar, temos exemplos como o lançamento do Porsche 911 em novembro de 2019, quando içamos um Porsche para ser apresentado em um evento impactante. Também fizemos parceria com o Booking, em que transformamos em uma sala e um quarto os nossos bondes antigos que ficam expostos aqui.

Por outro lado, recentemente, fomos procurados por uma grande marca que queria envelopar os nossos bondes. Nós agradecemos muito. Era algo muito atrativo financeiramente, mas em hipótese alguma podemos colocar em xeque a percepção dos visitantes para a vista. Então, recusamos.

Está acompanhando o debate sobre a volta do horário de verão? É um pleito do setor de turismo. Isso realmente ajudaria? Sim. O horário de verão realmente impacta positivamente os resultados do setor turístico como um todo. As pessoas podem ficar muito mais tempo ao ar livre, na praia.

Como a crise energética os ameaça? Quando Cristóvão Leite de Castro decidiu fazer a troca do sistema teleférico, passando para a segunda geração de bondinho, ele tinha opção de fazer por combustível fóssil ou energia elétrica. E já naquela época decidiu por energia elétrica. E agora, em outubro, demos mais um passo, indo para o mercado livre. Nosso consumo é até baixo, mas nós conseguimos atingir.

Geramos energia e jogamos na rede quando o bonde desce mais pesado. No final do dia, quando mais pessoas estão descendo, geramos energia e colocamos na rede.

Muita gente confunde e se surpreende ao saber que vocês são uma empresa privada? Provavelmente. Nós somos umas das empresas mais antigas do Rio de Janeiro. Uma empresa privada, de capital fechado, auditada, com processos e controles e acionistas. Funcionamos ininterruptamente 365 dias no ano.

A retomada do seu visitante está acontecendo em um momento de economia retraída. Como isso influencia a sua recuperação? O ano de 2020 e o de 2021 foram realmente desafiadores para todos nós. O fato de estarmos em um monumento natural, com áreas abertas, ajuda na atração de visitantes. Agora, começamos a observar a visitação também de estrangeiros.


Bondinho Pão de Açúcar
A construção e a exploração do caminho aéreo entre a antiga Escola Militar e o alto do Morro da Urca foram autorizadas por decreto municipal em favor do fundador em 1909. O trecho inicial foi inaugurado em 1912. Hoje, a empresa acumula mais de 300 mil horas de operação e supera 5 milhões de viagens

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