Painel S.A.

Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Painel S.A.

Sem meu filho, vou me reinventar e seguir em frente para ajudar o país, diz Abilio Diniz

Empresário afirma que lhe falta um pedaço após a morte de João Paulo Diniz, mas quer permanecer atuante e contribuir com diálogo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Depois da morte de seu filho João Paulo Diniz, no mês passado, o empresário Abilio Diniz afirma que lhe falta um pedaço, jamais poderia imaginar uma dor tão grande e terá de se reinventar em uma vida diferente.

"Tenho que seguir em frente. E vou seguir, cumprindo as minhas obrigações, inclusive as minhas responsabilidades como brasileiro", diz.

Para ele, o país passa por um momento de instabilidade, sem previsão de quem vai ganhar a eleição a poucas semanas do pleito. Do ponto de vista econômico, ele avalia que o Brasil não vai tão mal, e a situação fiscal não é imobilizante.

Os auxílios para a população pesam nas contas, mas ajudam no problema da fome e precisam continuar, diz.

"Acho muito importante, até que nós consigamos fazer o país voltar a crescer firmemente, gerar emprego e fazer com que as pessoas possam ter sua renda e ganhar dinheiro por conta própria."

Sobre a polarização entre Lula e Bolsonaro, ele afirma que prefere se manter neutro, sem criticar governos e poder dialogar.

Imagem mostra Abilio Diniz, um homem branco de cabelos grisalhos, olhando para cima. Ele usa camisa preta e óculos.
Abilio Diniz, que é membro do conselho de administração do Carrefour, na sede da Península Participações, na Avenida Paulista - Bruno Santos - 1.set.22/Folhapress

Como está atravessando isso? Tenho ficado muito recluso. É a primeira vez que eu falo com alguém para fora. Na linha da vida, os mais velhos vão primeiro. Quando você pega uma inversão da linha da vida, um pai perdendo um filho, é muito duro. Eu jamais poderia imaginar que houvesse uma dor tão grande.

Já passei por momentos muito difíceis. Fui sequestrado. Achava que eu ia morrer, mas nada comparado com esse momento que estou vivendo. A vida nunca mais vai ser igual, porque falta um pedaço de mim. Mas eu sei que eu tenho que me reinventar nessa vida diferente, sem meu filho.

Tenho uma família, seis filhos, 18 netos e seis bisnetos. Tenho empresas, a gente investe, tenho um papel atuante. Não posso faltar com meus compromissos. Dou aula na FGV em um curso de 40 pessoas, 14 delas vêm de outros estados. Não posso frustrar as pessoas. Não dá para faltar.

Apesar de tudo o que eu estou sentindo, tenho que me reinventar. E vou seguir em frente, cumprindo as minhas obrigações, inclusive, as minhas responsabilidades como brasileiro, que tenho há muito tempo. Sei que é importante, que há pessoas que gostam de ouvir a minha opinião e o que eu penso. E neste momento que o Brasil está vivendo, não tenho direito de me ausentar.

Uma das coisas que têm feito bem ao meu coração é o carinho que eu tenho recebido das pessoas. Quero agradecer. Nas minhas redes sociais, é grande a quantidade de gente que tem passado mensagens.

Esse momento do país polarizado te preocupa? Qual é a perspectiva? Não acho que o Brasil vai tão mal. Acho que vai até bem. Desde o ano passado, eu já vinha acreditando na recuperação. Na pandemia, não caímos tanto quanto se imaginava, quanto nos outros países. Conseguimos subir em 2021, quando ninguém acreditava.

Os prognósticos eram de que o Brasil não iria crescer em 2022. E veja o que está acontecendo: estamos crescendo, gerando emprego. Fazendo com que a renda individual esteja subindo, e isso é importante para os mais vulneráveis. O serviço se recuperando, a indústria. E ao mesmo tempo, combatendo inflação. Com quanto será que vão terminar os EUA? A Europa?

Quando você olha o Brasil de maneira isolada, tem muita coisa para fazer. Temos que fazer mais inclusão, crescer distribuindo renda. É no crescimento que se faz a distribuição. Neste momento, as pessoas mais vulneráveis, de mais baixa renda, têm conseguido sobreviver pelos auxílios. O de R$ 600 dado na pandemia segurou muita gente.

Está continuando agora? Para mim, não importa se é com fim eleitoral ou não. Está dando dinheiro para os brasileiros. Acho muito importante, até que nós consigamos fazer o país voltar a crescer firmemente, gerar emprego e fazer com que as pessoas possam ter sua renda, ganhar dinheiro por conta própria. Aí vai tirando esses estímulos, que realmente pesam.

Outra coisa que se fala do Brasil é que a situação fiscal está horrível, que neste ano está crescendo, mas ano que vem vai ser desastre. Tem gente torcendo contra. Eu não vejo assim, estamos com relação dívida/PIB de menos de 80%. Não é algo que estrangula.

Claro que o ideal seria fazer essa dívida cair e não subir. Mas dizer que temos uma situação fiscal que nos imobiliza não é verdade. Temos espaço para gastar. Não é para desperdício. Com todos esses auxílios, estamos com relação dívida/PIB ainda confortável.

Não acredito nessas projeções de que não vai crescer em 2023. Já no ano passado eu apostava em crescimento maior para este ano. Não é que eu seja um analista melhor do que os outros. Mas acho que eu tive serenidade para analisar esse país sem puxar para um lado nem para o outro.

É claro que tem muito a ser feito. Eu gostaria de ver o Brasil completamente sem fome. Nenhum brasileiro com insegurança alimentar. Agora, esse auxílio de R$ 600 segurou muito. O suficiente? Nada é suficiente, mas é preciso manter os estímulos, por enquanto.

Você sempre preferiu ficar neutro. Na crise econômica da gestão Dilma, quando muitos empresários criticaram publicamente, você dizia: muito faz quem não atrapalha. Agora alguns empresários se posicionam a favor de golpe. O que acha disso? Eu só tenho informações dos jornais. Desses empresários que foram citados [na operação da PF sobre o grupo de WhatsApp em que se defendeu golpe], eu só conheço bem um, o Meyer Nigri. Não tive acesso ao que está escrito. Não acredito que essa gente estivesse tramando golpe, ainda mais por grupo de WhatsApp. Eu acho que, hoje, empresário ou não, as pessoas são pró-democracia.

E o movimento das cartas pela democracia. O que achou? Sobre a carta, eu não assinei. Primeiro, porque ninguém me convidou. Segundo, porque virou partido político. Parecia um instrumento contra o Bolsonaro. Não necessariamente a favor do Lula, mas tinha aí um carimbo de alguma coisa, já tomando um partido de um lado ou outro.

Não quero entrar nessa. Nos dez anos da minha vida participando do governo [como membro do Conselho Monetário Nacional], na década de 80, aprendi muito. Eu não sei se dei muita coisa ao país, mas aprendi. Uma delas é que não se briga com governo. Se você quer agir em favor do seu país, não brigue. Procure estar perto, colocar suas ideias.

Naquele tempo, eu não era o Abílio de hoje. Briguei. Não é por aí. Aprendi desde o governo Fernando Henrique. Estive próximo dele, muito próximo do Lula. Ajudei a fazer a campanha da Dilma no primeiro mandato. Estive com ela até um bom pedaço do segundo. Senti que o Brasil ia bater no muro. Não apoiei impeachment, não saí para a rua.

Quando o Temer entrou, já o conhecia bem. Procurei colocar minhas ideias. Acho que dei minha contribuição. Veio Bolsonaro, me mantive perto. Não quero ser pretensioso, mas eu falei muita coisa. Da mesma forma que sempre mantive contato com Lula. Conheço ele há 40 anos. Tenho relacionamento muito bom com ele e quero me manter neutro nisso.

Seja quem for o presidente, quero estar perto. Quero dar a contribuição da minha experiência, do que conheço do Brasil, tanto no GPA [Grupo Pão de Açúcar], em que estive por 50 anos, como no Carrefour. O tempo em que estive na BRF me deu conhecimento do agro. Quero continuar trabalhando, crescendo.

A coisa mais importante que eu tenho a fazer nesse momento é ajudar a família depois de um baque como esse. E quero ajudar meu país.

Como avalia os sinais das campanhas de Lula e Bolsonaro e que nomes seriam bons na Economia? Tenho a impressão de que se o eleito for o atual presidente, ele vai continuar com Paulo Guedes. Muita gente não gosta, acho que ele se comunica mal, mas acho que está fazendo um trabalho importante, inclusive arrumando maneiras de dar os subsídios à população.

Tenho contato com o Lula e pessoas dele, mas ele não declara nada. Eu tenho a impressão de que vai seguir um pouco o que fez no primeiro mandato, quando colocou um político inteligente, capaz de assimilar esse campo da economia, se munir de técnicos, de bons economistas. Em 2003, mais que dobramos a taxa de câmbio, mas durou pouco. Bastou ele começar a falar as medidas que ia tomar e caiu.

No caso do Bolsonaro, acho que ele cresceu nesses quatro anos. Aprendeu muito. Cometeu erros. Acredito que vai fazer guinadas em algumas coisas. Mas de forma que os brasileiros fiquem mais satisfeitos.

Lula vai se empenhar para fazer distribuição de renda, olhar os vulneráveis, fazer o melhor por eles. Mas sem esquecer que o país precisa crescer. Tem muito capital externo. E aonde os investidores vão? É difícil escolher porto seguro para colocar o dinheiro. E o Brasil é isso.

O que nós precisamos? Primeiro, de segurança jurídica, regras claras para investimento. Esse é um momento de instabilidade. Estamos a 30 dias da eleição e não se sabe quem vai ganhar. Não se sabe se vai ter mudança radical. Acho até que não vai. Está todo mundo esperando. Isso vai acabar. Daqui a dois meses, passou a eleição e a vida vai seguir, qualquer que seja o resultado. E aí, acho que tem muito dinheiro de fora para entrar.

E o rumor de que tem interesse em voltar ao Pão de Açúcar? São apenas rumores recorrentes de mercado. Meu foco no Carrefour é total. Estou muito comprometido com o grupo no Brasil e na França.


Raio-X

Presidente do conselho de administração da Península, empresa de investimentos de sua família, Abilio Diniz, 85, também é membro dos conselhos do Carrefour Global e Brasil. Entre 2013 e 2018, presidiu o conselho da BRF. Ao lado do pai, foi responsável pela criação do Grupo Pão de Açúcar

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.