Patrícia Campos Mello

Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA. É vencedora do prêmio internacional de jornalismo Rei da Espanha.

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A Síria está à beira de (mais) uma guerra

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Crédito: Delil Souleiman/AFP Curdos sírios protestam contra ação militar do líder turco, Recep Tayyip Erdogan, em Jawadiyah
Curdos sírios protestam contra ação militar do líder turco, Recep Tayyip Erdogan, em Jawadiyah

Os curdos sírios estão prestes a enfrentar mais uma guerra. Depois de resistirem aos ataques do Estado Islâmico e firmarem uma espécie de pacto de não agressão com o ditador sírio Bashar al Assad, eles se preparam para uma invasão do Exército turco.

O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, ameaça atacar "nos próximos dias" Afrin, cidade (e região) no noroeste da Síria, controlada pelos curdos sírios através da milícia YPG.

Não é a primeira vez que Erdogan ameaça atacar os curdos sírios. Mas, desta vez, ações se somaram às palavras.

Nos últimos quatro dias, a Turquia intensificou seus ataques com mísseis, estacionou um grande efetivo de soldados, tanques e armamentos na fronteira e ameaça invadir o território sírio.

Na quinta-feira (18), milhares de sírios curdos tomaram as ruas da cidade de Afrin em protesto contra as ameaças turcas. "Afrin é o cemitério de Erdogan", dizia uma das faixas carregadas pela multidão.

A situação está se agravando rapidamente. Também na quinta-feira, o governo Assad afirmou que iria retaliar a Turquia, derrubando qualquer caça turco que entrasse no espaço aéreo sírio.

Erdogan ficou especialmente irritado com a declaração de militares americanos de que Washington ajudaria a formar um novo Exército de fronteira com as forças democráticas sírias (SDS, na sigla em inglês)

A SDS é a milícia patrocinada por Washington e liderada pelos curdos que foi determinante para expulsar o Estado Islâmico da maior parte dos territórios que ocupava.

Segundo os americanos, o objetivo dessa nova patrulha de fronteira entre Síria e Turquia seria evitar um ressurgimento de grupos extremistras como o EI.

Mas para Erdogan, a criação desse exército resultaria no fornecimento armas e treinamento para o principal inimigo dos turcos, bem na fronteira. De lá, os curdos poderiam facilmente atacar as forças turcas.

"O estabelecimento de um exército terrorista na fronteira causaria estragos irreversíveis em nossas relações (com os EUA)", disse Erdogan.

A maior preocupação de Erdogan é a formação de um território curdo contínuo ao longo da fronteira, consolidando uma grande região autônoma curda no norte da Síria.

Para ele, isso insuflaria o movimento separatista dos milhões de curdos turcos. O partido curdo sírio que está no poder, o PYD, é aliado do PKK, considerado terrorista pela Turquia, União Europeia e Estados Unidos.

Os EUA vêm apoiando o PYD e a milícia curda YPG no conflito sírio, apesar de seguidos protestos de Erdogan.

O secretário de Estado americano, Rex Tillerson, tentou apagar o incêndio —veio a público dizer que os EUA não estavam patrocinando a formação de nenhuma patrulha de fronteira, que iriam apenas treinar forças existentes para conter extremismo. Mas o estrago estava feito.

A Turquia não está irritada apenas com os EUA. A Rússia também vem apoiando os curdos, embora de forma menos ostensiva. E, em Afrin, há centenas de soldados russos.

Qualquer invasão turca na região teria de ser coordenada com os russos, que também mantêm controle efetivo do espaço aéreo da região. Se não houver coordenação, cresce a chance de haver um choque entre a Turquia, membro da Otan, e a Rússia, com resultados potencialmente desastrosos.

Desde o início da guerra, em 2011, a Turquia apoia grupos rebeldes de oposição a Assad (alguns deles compostos por extremistas). Esses grupos afirmaram que já estão se preparando para ajudar os turcos no ataque contra Afrin.

Vale lembrar que cerca de 1 milhão de pessoas moram em Afrin —metade são sírios que fugiram de regiões deflagradas do país, em busca da relativa paz da região.

Mais de 350 mil pessoas morreram na guerra da Síria desde 2011. Ninguém precisa de mais um front nessa batalha.

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