Patrícia Campos Mello

Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA. É vencedora do prêmio internacional de jornalismo Rei da Espanha.

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Patrícia Campos Mello

Plano dos EUA para 'salvar' os palestinos é fórmula mágica com dinheiro alheio

Em projeto de genro de Trump, Washington não dará verbas para Cisjordânia e faixa de Gaza

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Vejam que engenhoso: você corta a ajuda financeira de mais de US$ 500 milhões que dava para um povo e prejudica o funcionamento de hospitais e escolas, alegando que o povo se nega a negociar a paz. Aí você anuncia um plano que vai dar US$ 50 bilhões para esse mesmo povo, mas não se compromete a tirar nenhum tostão do bolso e diz que a iniciativa privada e outros países vão bancar isso.

É mais ou menos esse o plano de Jared Kushner, genro do presidente Donald Trump e um dos principais formuladores da política externa americana, para ajudar os palestinos. Chamado singelamente de “Paz para a Prosperidade – uma nova visão para o povo palestino e o Oriente Médio em geral”, o plano se define como “uma nova visão para o povo palestino para construir uma sociedade vibrante e próspera.”

Aí anuncia com pompa que, “com o potencial de facilitar mais de US$ 50 bilhões em novos investimentos ao longo de dez anos, o Paz para Prosperidade representa o esforço internacional para ajudar o povo palestino mais ambicioso e abrangente já realizado até hoje.”

Jared Kushner apresenta no Bahrain seu plano para os palestinos
Jared Kushner apresenta no Bahrain seu plano para os palestinos - 25.jun.19/BNA/AFP

E continua: “(O plano) tem a capacidade de mudar de forma fundamental a Cisjordânia e a Faixa de Gaza e iniciar um novo capítulo na história palestina –uma definida não pela adversidade e perda, mas pela liberdade e dignidade”.

Bom, vamos fazer uma retrospectiva. Segundo o Congressional Research Service, braço de pesquisa e análise do Congresso americano, o governo Trump eliminou US$ 231,5 milhões de assistência econômica para a faixa de Gaza e a Cisjordânia (incluindo US$ 25 milhões para hospitais); cortou US$ 294 milhões de sua contribuição para a UNRWA, a agência da ONU que ajuda refugiados palestinos (os EUA eram o principal financiador e a agência está à míngua), e US$ 10 milhões em ajuda para prevenção de conflitos entre israelenses e palestinos.  Em fevereiro deste ano, para completar, cortaram mais de US$ 60 milhões anuais para serviços de segurança palestinos.

O corte atingiu em cheio hospitais, escolas, e outros serviços essenciais.

Trump indicou que estava usando o fim da ajuda financeira para pressionar as autoridades palestinas a aceitar participar nas negociações com israelenses patrocinadas pelos EUA. Desde que Trump reconheceu Jerusalém como capital de Israel, em dezembro de 2017, o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, cortou todos os contatos diplomáticos com Washington.  

No grandioso plano de Kushner, estão previstos inúmeros investimentos em infraestrutura e outros setores em Gaza e na Cisjordânia que iriam, em 10 anos, “dobrar o PIB, criar um milhão de empregos e reduzir em 50% a taxa de pobreza.”

E de onde viria esse dinheiro? Não do governo americano. O plano prevê que o setor privado principalmente de países da região e do Golfo teriam enorme interesse nessas oportunidades de negócios.

“Investimentos prioritários em transportes e infraestrutura vão ajudar a Cisjordânia e Gaza a se integrarem com economias vizinhas, aumentando a competitividade das exportações palestinas e reduzindo as complicações de transportes.”

De fato, há enorme necessidade melhorias na infraestrutura, mas haveria obstáculos ainda mais básicos que mostram como o plano é fora da realidade: Gaza, por exemplo, enfrenta restrições para entrada de cimento e outros materiais de construção, e não consegue nem reconstruir casas e edificios que foram destruídos nos conflitos. 

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