Paula Cesarino Costa

Jornalista, foi secretária de Redação e diretora da Sucursal do Rio. Foi ombudsman da Folha de abril de 2016 até maio de 2019.

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Paula Cesarino Costa

Nos passos do leitor digital

Estudos trazem preocupação, mas números de assinantes indicam caminhos

Carvall

O último leitor de jornal diário desaparecerá em setembro de 2043. A presunção foi feita há dez anos pelo pesquisador americano Philip Meyer, autor do livro “Os Jornais Podem Desaparecer?” Estaríamos a 25 anos do colapso dos jornais.

Dezenas de críticos rebateram a projeção, apontando com razoabilidade que o jornal pode mudar de plataforma, mudar de perfil, quiçá de periodicidade, mas deve seguir como bem essencial de uma parcela considerável de leitores. Em geral, me filio aos esperançosos de que o jornal não perecerá.

Em estudo preocupante, economistas americanos dimensionaram o encolhimento da imprensa local em 204 cidades americanas. Em 20 anos, 296 jornais fecharam as portas.

Os pesquisadores concluíram que a falta de jornalismo investigativo em nível municipal amplia as dificuldades para os investidores avaliarem a qualidade dos projetos e o compromisso das autoridades envolvidas com o bem público.

Esse debate mundial encontra eco no Brasil porque a situação dos grupos de mídia segue em risco. Não há dados sobre fechamento de jornais, mas o Atlas da Notícia mapeou jornais e sites noticiosos em apenas 1.125 cidades, um quinto dos municípios brasileiros, deixando 70 milhões sem vínculos com jornais locais.

São os chamados desertos de notícias no segmento escrito e digital, que abrigam 35% da população brasileira.

A boa notícia para a mídia tem aparecido na crescente transferência dos leitores do papel para os meios digitais, cada vez mais a base de sustentação da imprensa. Os jornais britânicos The Times e Sunday Times anunciaram que pela primeira vez o número de assinantes digitais (500 mil) superou as assinaturas impressas em junho —crescimento de 20% em relação a junho de 2017. Em maio, The Times teve circulação diária de 431 mil exemplares.

O New York Times já havia anunciado um aumento de 25%, no primeiro trimestre de 2018, das assinaturas digitais que hoje passam de 2, 7 milhões. O Washington Post ultrapassou a marca de 1 milhão de assinantes exclusivamente digitais, assim como o Wall Street Jornal (mais 1, 2 milhão).

São veículos que começam a colher resultados de investimentos e ousadia. Os números do mercado brasileiro são mais modestos, mas indicam que o caminho digital é sem volta. Líder entre os jornais, a Folha já tem mais assinaturas digitais do que impressas. Do total de 303.880 assinantes em maio, 191.954 eram exclusivamente digitais.

Os números e levantamentos diversos acentuam a esperança daqueles que acreditam na informação correta, técnica e independente como balizadora da cidadania. O caminho digital parece claro, mas ainda há muito a fazer em inovação e maximização da potencialidade jornalística do meio.

Copa da Rússia será esquecida, não só por causa da seleção

A Copa do Mundo da Rússia não foi como as últimas. Não só nos campos de grama, mas também nas páginas da Folha.

Os principais craques se despediram precocemente e as seleções favoritas jogaram sem brilho e foram eliminadas.

Do ponto de vista jornalístico, a Folha jogou na retranca. Não apresentou inovações editoriais nem primou pela ousadia gráfica, timidez percebida desde a primeira página. Manteve um padrão médio de cobertura de qualidade, mas quase nada deve ficar na memória do leitor-torcedor.

Os editores do caderno Copa 2018, Eduardo Scolese e Paulo Passos, dizem que a cobertura inovou ao dar destaque a reportagens feitas a partir de dados, com apoio de profissionais exclusivos para esse trabalho. “O jornal trouxe também reportagens e análises sobre temas quentes como a agonia argentina e o uso inédito do VAR. Conseguiu furos como o valor do prêmio dos jogadores em caso de título, quanto Tite ganhou com publicidade e a situação do pai do jogador Paulinho.”

Para eles, a cobertura não ficou só presa à bola, “além de um leque de colunistas diversificado em gênero, nacionalidade e pontos de vista, trouxe reportagens e análises sobre política, comportamento, cultura e economia russas”, o que é comum em Copas.

O responsável pela edição de fotografia do caderno, Daigo Oliva, diz que informação e força gráfica foram colocadas no mesmo nível e que a escolha de imagens propunha jogos visuais que fugiram da obviedade dos registros de futebol.

O uso extensivo e mais sofisticado de dados é a marca mais visível dessa cobertura, mas nem sempre com boa apresentação visual e raramente com interatividade na versão online.

Faltou gente. Esqueceu-se da torcida, anônima e famosa, no Brasil e na Rússia. Autoridades e personalidades passaram incólumes pela terra dos cossaco. Hoje acaba. Até 2022.

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