Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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A economia não resgatará Trump

Donald Trump não é Ronald Reagan

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Ainda que a mídia tenha publicado mais ou menos 100 mil perfis sobre partidários entusiásticos de Donald Trump espalhados pelas lanchonetes dos Estados Unidos, a realidade é que o presidente é extraordinariamente impopular. Uma recente análise do instituto de pesquisa Pew constatou que apenas um outro presidente tinha índices de aprovação tão baixos ao final de seus primeiros dois anos de mandato.

No entanto, o presidente em questão era Ronald Reagan, que conquistou a reeleição em uma vitória esmagadora. Alguns dos entusiastas de Trump vêm dizendo que ele conseguirá repetir esse desempenho. Será que consegue?

Não, não consegue. E vale a pena compreender o motivo, tanto para avaliar as perspectivas políticas atuais quanto para demolir os mitos quanto a Reagan que continuam a infestar o conservadorismo americano.

Tratemos primeiro da história de Reagan.

Bonecos de três presidentes dos EUA: Washington, Reagan e Trump
Bonecos de três presidentes dos EUA: Washington, Reagan e Trump - Divulgacao

O presidente de fato era muito impopular em janeiro de 1983, principalmente por causa da situação econômica. A despeito de um imenso corte de impostos em 1981 e de um forte aumento nos gastos militares, mais de 10% da força de trabalho dos Estados Unidos estava desempregada.

Ainda que muitos eleitores atribuíssem a Reagan a culpa por seus problemas econômicos, a verdade é que a situação tinha bem pouco a ver com suas políticas; era, em lugar disso, consequência das tentativas do Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, para controlar a inflação, que haviam empurrado as taxas de juros para as alturas dos 19% anuais.

Pela metade de 1982, porém, o Fed inverteu o curso, reduzindo acentuadamente as taxas de juros. E esses cortes terminaram por gerar um imenso boom na habitação, que por sua vez propeliu uma rápida recuperação econômica.

Como a desaceleração precedente, o boom pouco teve a ver com as políticas de Reagan, mas os eleitores lhe deram crédito pelas melhoras mesmo assim. O desemprego continuava bastante alto —acima dos 7%— em novembro de 1984, mas o que importa para as eleições é se as coisas estão melhorando ou piorando, e não se elas são boas ou más em termos absolutos. E em 1983 e 1984, o desemprego caiu rápido. Reagan conquistou uma grande vitória.

Como essa história se compara às perspectivas de Trump agora?

Antes de tudo, Reagan era impopular por conta da fraqueza da economia. Trump é impopular apesar da força da economia. Ou seja, ele começa de um patamar muito mais baixo.

E não há chance de um boom ao estilo "uma nova manhã para a América", nos próximos dois anos.

Um aspecto disso é que, em 1983 e 1984, os Estados Unidos conseguiram crescer muito rápido ao aproveitar a grande capacidade produtiva excedente acumulada por conta da recessão de duplo mergulho que durou de 1979 a 1982. Agora, com desemprego abaixo dos 4%, não está claro que haja capacidade produtiva não aproveitada. E certamente ela não existe em montante suficiente para permitir índices de crescimento de 7% ou mais na renda pessoal real, como os que prevaleceram durante a campanha para a eleição de 1984.

Além disso, um boom na habitação impulsionado pelos cortes nas taxas de juros teve papel central no rápido crescimento registrado no terceiro e quarto anos de governo de Reagan. (Não, nem tudo se deveu aos efeitos miraculosos dos cortes de impostos.)

Mas o Fed de hoje não pode —literalmente não pode - prover o tipo de estímulo que criou então, ao reduzir as taxas de juros da casa dos dois dígitos para a do dígito único, porque os juros já estão bem baixos. E tendo em vista que os preços da moradia parecem bem altos, é difícil imaginar um grande salto, nos próximos anos.

Existem outras maneiras pelas quais a economia poderia resgatar Trump? E quanto ao corte de impostos de 2017, que Trump afirmou serviria como um "combustível de foguete" para a economia?

Bem, ao elevar o déficit orçamentário, o corte provavelmente gerou algum estímulo econômico, e causou uma elevação temporária do crescimento. Mas o efeito disso já está desaparecendo, e a economia estaria se desacelerando mesmo sem o arrasto adicional causado pela paralisação do governo engendrada por Trump. Isso não necessariamente significa que teremos uma recessão em breve, mas é quase certo que os números do crescimento se tornem menos que impressionantes.

Mas o corte de impostos não deveria ter promovido alta no crescimento em longo prazo, ao promover investimento empresarial? Sim, foi isso que foi dito, mas a promessa não vem sendo cumprida. As grandes empresas receberam benefícios fiscais consideráveis, mas em geral usaram o dinheiro assim obtido para pagar dividendos e recomprar ações, e não para investimento. E mesmo o aumento modesto de investimento surgido em 2018 parece ter sido causado pela alta nos preços do petróleo, e não pelo corte de impostos.

Ou seja, Donald Trump não é Ronald Reagan.

Na verdade, nem Ronald Reagan era Ronald Reagan. Ainda que as lendas da direita retratem sua experiência como prova do poder mágico dos cortes de impostos, a economia apresentou desempenhou um pouco melhor sob Bill Clinton, que aumentou os impostos. (Parece justo apontar que quase todos os republicanos aparentemente excluíram esse fato de suas memórias.)

A maior parte do sucesso político de Reagan foi reflexo não de suas realizações quanto aos fundamentos da economia, mas da boa sorte que ele teve quanto ao momento do ciclo de negócios. E Trump quase certamente não terá sorte semelhante.

Combine essa falta de uma perspectiva convincente de alta na economia nos próximos dois à impopularidade extrema de Trump no momento, e suas chances de reeleição - se é que ele chegará ao final de seu primeiro mandato —não parecem boas. O que desperta a questão do que ele e seu partido farão quanto tiverem de encarar a derrota.

Não sei a resposta a essa pergunta, e se você não está assustado quanto ao que Trump pode fazer caso o encurralem, não está prestando atenção nas notícias.

O que fica claro, porém, é que Trump e seus aliados estão no buraco, agora —e a economia não vai tirá-los dele.
 
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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