Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Por que Trump é um Homem-Tarifa?

Passou exatamente um ano desde que o presidente do Estados Unidos deu essa declaração

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Passou quase exatamente um ano desde que Donald Trump declarou: "Eu sou um Homem-Tarifa". Atipicamente, ele estava dizendo a verdade.

Neste ponto, eu perdi a conta de quantas vezes os mercados se reanimaram por acreditar que Trump iria encerrar sua guerra comercial, apenas para receber notícias de que um acordo muito esperado não ia mais acontecer ou que tarifas estavam sendo aplicadas a um novo conjunto de produtos ou países.

Na semana passada, aconteceu novamente: os mercados apostaram num surto de paz comercial entre os EUA e a China, apenas para serem abalados pela declaração de Trump de que poderá não haver acordo antes da eleição e por suas novas tarifas contra o Brasil e a Argentina.

Então Trump é realmente um Homem-Tarifa. Mas por quê? Afinal, os resultados de sua guerra comercial têm sido consistentemente ruins, tanto econômica quanto politicamente.

Vou oferecer uma resposta em breve. Primeiro, entretanto, vamos falar sobre o que a guerra comercial de Trump realmente conseguiu.

Um aspecto peculiar da economia de Trump é que, embora o crescimento geral tenha sido sólido, as áreas de fraqueza surgiram exatamente naquilo que ele tentou estimular.

Lembre-se, a única grande realização legislativa de Trump foi um enorme corte de impostos para as empresas, o que deveria provocar um aumento no investimento. Em vez disso, as empresas embolsaram o dinheiro e o investimento empresarial está diminuindo.

Ao mesmo tempo, sua guerra comercial deveria reduzir o deficit comercial e reanimar a indústria dos EUA. Mas o deficit comercial aumentou e a produção manufatureira está diminuindo.

A verdade é que mesmo os economistas que se opunham aos cortes de impostos e às tarifas de Trump estão surpresos com o mau desempenho deles. A explicação mais comum para esses maus resultados é que a política tarifária trumpiana está criando muita incerteza, o que dá às empresas um forte incentivo para adiar quaisquer planos que pudessem ter de construir novas fábricas e adicionar empregos.

Nesse caso, entretanto, por que Trump não faz o que os mercados continuam esperando erroneamente que ele faça, e acaba desistindo? Sua constante obsessão tarifária parece especialmente estranha, dada a crescente evidência de que o está prejudicando politicamente.

É importante perceber que o protecionismo trumpiano não foi uma reação a uma onda de opinião pública.

Pelo que posso dizer da série interminável de entrevistas com homens brancos em restaurantes populares --que, como todos sabemos, são os únicos americanos que importam—, esses eleitores são movidos mais pela animosidade aos imigrantes e pela sensação de que os liberais esnobes os desprezam do que pela política comercial.

E a opinião pública parece ter-se tornado muito menos protecionista, mesmo que Trump tenha aumentado as tarifas, com a maior porcentagem já registrada de americanos que dizem que os acordos de livre comércio são uma coisa boa.

Portanto, a guerra comercial de Trump está perdendo apoio, e não ganhando. E uma análise recente mostra que esse foi um fator que prejudicou os republicanos nas eleições de meio de mandato em 2018, representando um número significativo de cadeiras perdidas no Congresso.

No entanto, Trump persiste. Por quê?

Uma resposta é que ele há muito tempo se apega à ideia de que tarifas são a resposta para os problemas dos Estados Unidos, e ele não é o tipo de homem que reconsidera seus preconceitos à luz das evidências. Mas há outra coisa também: a lei comercial dos EUA oferece a Trump mais liberdade de ação --maior capacidade de fazer o que ele quiser— do que qualquer outra área política.

A história básica é que muito tempo atrás --na verdade, após a desastrosa tarifa Smoot-Hawley de 1930-- o Congresso deliberadamente limitou seu próprio papel na política comercial. Em vez disso, deu ao presidente o poder de negociar acordos comerciais com outros países, que então seriam submetidos a votos positivos ou negativos, sem emendas.

Sempre ficou claro, no entanto, que esse sistema precisava de alguma flexibilidade para responder aos acontecimentos. Assim, o Poder Executivo recebeu o poder de impor tarifas temporárias sob certas condições: grandes aumentos de importação, ameaças à segurança nacional, práticas injustas de governos estrangeiros. A ideia era que especialistas apartidários determinariam se e quando essas condições existiam, e o presidente decidiria se devia agir.

Esse sistema funcionou bem durante muitos anos. Acabou sendo, no entanto, extremamente vulnerável a alguém como Trump, para quem tudo é partidário e expertise é um palavrão. As justificativas tarifárias de Trump costumam ser evidentemente absurdas —sério, quem imagina que as importações de aço canadense ameaçam a segurança nacional dos EUA? Mas não há maneira óbvia de impedi-lo de impor tarifas sempre que lhe apetecer.

E também não há maneira óbvia de impedir que seus funcionários concedam isenção de tarifas a empresas individuais, supostamente com base em critérios econômicos, mas de fato como recompensa por apoio político. A política tarifária não é a única arena na qual Trump pode praticar o capitalismo de compadres --as contratações federais de serviços parecem cada vez mais escandalosas—, mas as tarifas estão especialmente maduras para exploração.

É por isso que Trump é um Homem-Tarifa: elas permitem que ele exerça poder irrestrito, recompensando seus amigos e punindo inimigos. Quem imagina que ele vai mudar de atitude e começar a se comportar com responsabilidade está vivendo em um mundo de fantasia.


 
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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