Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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A dívida de Trump, o futuro dele e o nosso

Presidente, que é nossa principal autoridade de aplicação da lei e de segurança nacional, poderá enfrentar enormes acusações, e isso é assustador

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A reportagem-bomba de The New York Times sobre as declarações de renda de Donald Trump é um feito notável de jornalismo. A equipe merece um elogio especial por tornar suas descobertas compreensíveis para os leitores em geral e não se perder nos detalhes.

Mas, como muitas outras revelações da era Trump, a notícia dos impostos recai na categoria de "chocante, mas não surpreendente". Muitos observadores já haviam desconfiado que Trump pagava pouco ou nenhum imposto, que sua alegação de brilhante sucesso nos negócios era ficção e que ele está profundamente endividado. Agora tudo foi virtualmente confirmado. Mas o que isso significa para o futuro dos Estados Unidos?

Cada um chegará a essa pergunta por seu próprio ângulo. Quando eu li a reportagem do Times, rapidamente me vi pensando na... teoria da estrutura de capital das empresas. Não, sério.

O presidente Donald Trump cochicha com equipe da Casa Branca em Washington - Oliver Douliery/AFP

Para muitas pessoas, sem dúvida, a principal conclusão das revelações fiscais será "US$ 750? Mesmo?" O fato de que Trump pagou menos impostos do que dezenas de milhões de trabalhadores americanos que lutam para saldar suas contas é ultrajante. Também é fácil explicar em poucos segundos, e por isso foi o tema de um anúncio rapidamente veiculado pela campanha de Biden.

De um ponto de vista substancial, porém, a evasão fiscal de Trump é menos importante que a confirmação do que muitos já suspeitavam: sua imagem cuidadosamente cultivada de um empresário de enorme sucesso é, como ele diria, "fake news". Na verdade, ele fez um péssimo trabalho dirigindo seus negócios.

Por que isso é importante? Os eleitores muitas vezes parecem acreditar que líderes empresariais eficazes têm capacidade e conhecimento para liderar o país como um todo. Eles se enganam sobre isso. Até os verdadeiros grandes empresários —como, por exemplo, Herbert Hoover— muitas vezes são ruins em políticas públicas, incluindo a política econômica, porque as técnicas necessárias para dirigir uma empresa e as exigidas para conduzir uma nação são muito diferentes.

No caso de Trump, entretanto, vale a antiga piada: ele não é um ótimo empresário, apenas interpretou um na TV. Assim, não deveria causar surpresa que ele tenha sido constantemente desastroso na criação de políticas. Em praticamente todas as frentes, da diplomacia à infraestrutura às guerras comerciais e o combate à pandemia, ele foi o oposto de Midas.

O quanto a revelação de que ele sempre foi uma fraude irá prejudicá-lo? Muitos de seus apoiadores provavelmente se recusarão a admitir a verdade, talvez porque não admitam para si mesmos que foram completamente enganados. Mas supor que a notícia não terá qualquer efeito é provavelmente excesso de cinismo. E lembre-se, Trump está atrás de Joe Biden, por isso precisa fazer mais que apenas manter sua base —e isto poderá não ajudar muito a conquistar eleitores indecisos.

A revelação mais importante da reportagem do Times, porém, é a confirmação de outra coisa de que muitos observadores já desconfiavam: Trump tem dívidas pessoais de centenas de milhões de dólares. Não está claro se ele tem os recursos para saldá-las.

Os problemas financeiros pessoais sempre foram um sinal de alerta quando se trata de cargos de governo delicados, porque são um convite aberto à corrupção.

Por isso, a confirmação de que a principal autoridade do país em aplicação da lei e segurança nacional —cujo império empresarial já oferece muitas oportunidades de influência indevida— está se afogando em dívidas é assustadora.

Além disso, analistas de finanças empresariais —eu disse que chegaria lá— há muito tempo sabem que altos níveis de dívida, o suficiente para representar um risco substancial de falência, criam incentivos destrutivos. Em vez de investir no futuro, os proprietários de empresas altamente endividadas são tentados a praticar a liquidação de ativos, recebendo o dinheiro antes que os credores cobrem seus direitos. Essa é, aliás, a acusação feita a Eddie Lampert, o ex-executivo-chefe da Sears (e Steven Mnuchin, o secretário do Tesouro).

Proprietários de empresas muito endividadas também são tentados a assumir grandes riscos, mesmo com poucas chances, porque se tiverem sorte poderão se salvar; caso contrário, o problema é dos outros. Cara, eles ganham; coroa, os credores perdem.

Então temos um dono de empresas profundamente endividado com todos os incentivos para se envolver em malfeitos —exceto que além de dirigir sua empresa ele dirige os Estados Unidos da América.

Mas ele pode estar prestes a perder essa posição especial e qualquer defesa financeira que ela possa oferecer.

Pense nisso. Pense também no fato de que Trump se queixa constantemente da quase inexistente fraude eleitoral —ele nunca aceitou o fato de que perdeu no voto popular quatro anos atrás— e que ele se recusou repetidamente a dizer que aceitará os resultados da eleição caso perca. E diga-me que você não está aterrorizado com o que as próximas semanas poderão trazer.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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