Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Reduzir a inflação pode salvar o planeta?

Um projeto de lei pode catalisar uma transição energética crucial

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Depois de todos as falsas partidas e as esperanças frustradas dos últimos dois anos, reluto em contar minhas galinhas antes que elas sejam realmente assinadas no Salão Oval. Ainda assim, parece que os democratas finalmente entraram em acordo sobre mais uma importante legislação, a Lei de Redução da Inflação. E se ela de fato se tornar lei será um grande negócio.

Primeiro, a lei realmente reduziria a inflação? Sim, provavelmente –ou pelo menos reduziria as pressões inflacionárias. Isso porque o aumento de gastos contido na legislação, principalmente em energia limpa, mas também em saúde, seria mais do que compensado por suas disposições fiscais; então seria um ato de redução do déficit, o que, se tudo o mais for igual, o tornaria desinflacionário.

Cédulas de dólar - Gabriel Cabral/Folhapress

Mas você quer pensar na Lei de Redução da Inflação como sendo a Lei Nacional de Rodovias Interestaduais e de Defesa de 1956, que provavelmente fortaleceu um pouco a defesa nacional, mas beneficiou principalmente o país ao investir em seu futuro. Este projeto de lei faria o mesmo, e talvez até mais.

Para entender por que esta lei inspira tanta esperança, é bom entender o que mudou desde o último grande esforço dos democratas para lidar com as mudanças climáticas, o projeto Waxman-Markey de 2009, que foi aprovado na Câmara, mas morreu no Senado.

O núcleo do Waxman-Markey era um sistema de "limite e comércio" que, na prática, teria funcionado muito como um imposto sobre o carbono. Havia e há bons argumentos para tal sistema, que daria às empresas e aos indivíduos um incentivo para reduzir as emissões de diversas maneiras. Mas politicamente era fácil retratá-lo como um plano sem sentido, que exigia sacrifícios dos trabalhadores comuns.

Com o fracasso do Waxman-Markey, o governo Obama foi reduzido a uma agenda muito mais limitada, que dependia de cenouras em vez de varas –isenções fiscais para energia limpa, garantias de empréstimos para empresas que investem em energias renováveis. Acho que é justo dizer que a maioria dos economistas não esperava que essas medidas conseguissem muita coisa.

Mas algo engraçado aconteceu no caminho do apocalipse climático: houve um progresso revolucionário na tecnologia de energias renováveis, provavelmente impulsionado, pelo menos em parte, por essas políticas da era Obama. Em 2009, a eletricidade gerada pela energia eólica ainda era mais cara do que a eletricidade gerada pela queima de carvão, e a energia solar era ainda mais cara. Mas na década seguinte os custos da energia eólica caíram 70%, os custos solares 89%.

Somando-se a isso a queda dos preços das baterias, ficou possível ver os contornos de uma economia que alcança reduções drásticas nas emissões de carbono com pouco ou nenhum sacrifício, usando eletricidade gerada por energia renovável –em vez da queima de combustíveis fósseis– para aquecer e resfriar nossos edifícios, acionar nossas fábricas, rodar nossos carros e muito mais.

A parte climática da Lei de Redução da Inflação é, em grande parte, uma tentativa de acelerar essa transição energética, principalmente oferecendo créditos fiscais para a adoção de tecnologias de baixa emissão, incluindo veículos elétricos, mas também incentivando o uso de menos energia em geral, sobretudo tornando os edifícios mais eficientes em termos energéticos.

Há todos os motivos para acreditar que essas medidas teriam grandes efeitos. Ao contrário dos combustíveis fósseis, que existem há muito tempo, a energia renovável ainda é uma "indústria nascente" com uma curva de aprendizado acentuada: quanto mais usamos essas tecnologias, melhor as aproveitamos. Portanto, fornecer incentivos para energia limpa agora tornará essa energia muito mais barata no futuro.

E o suporte para veículos elétricos também ajuda a resolver um problema do ovo e da galinha, no qual os motoristas relutam em usar a eletricidade porque não têm certeza de que encontrarão postos de recarga, e as empresas não oferecem muitos postos de recarga porque ainda não há tantos carros elétricos.

A questão é que, embora as disposições climáticas e energéticas da Lei de Redução da Inflação –cerca de US$ 370 bilhões na próxima década– sejam apenas cerca de 0,1% do Produto Interno Bruto projetado no mesmo período, elas poderão ter um efeito catalítico sobre a transição energética. E também poderão transformar a economia política das políticas climáticas.

Durante anos, os ambientalistas argumentaram que a transição para a energia limpa deveria ser considerada uma oportunidade e não um fardo –que, além de salvar o planeta, a transição criaria muitos empregos e novas oportunidades de negócios. Mas esse é um ponto difícil de explicar sem exemplos concretos e generalizados de sucesso. Enquanto uma política climática séria era uma proposta, e não uma realidade, estava vulnerável a ataques de direitistas que a pintavam como um plano nefasto para minar o modo de vida americano.

Mas esses ataques se tornarão menos eficazes quando as pessoas começarem a ver os efeitos da ação climática no mundo real (e por isso a direita está tão frenética tentando bloquear essa legislação). Se os democratas puderem aprovar esse projeto, as chances de ações adicionais no futuro aumentarão, talvez acentuadamente.

Então, vamos torcer para que não haja problemas de última hora. A Lei de Redução da Inflação não entregará tudo o que os ativistas climáticos querem. Mas se isso acontecer será um grande passo para salvar o planeta.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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