Pedro Hallal

É epidemiologista, professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas e coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil.

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Pedro Hallal

É melhor NÃO ir se acostumando

Um ditado diz: Se há dez pessoas numa mesa, um nazista chega e se senta, e nenhuma pessoa se levanta, então existem onze nazistas numa mesa

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Na última semana, o número diário de mortes por Covid-19 no Brasil foi de 1.500 pessoas. É o equivalente a oito acidentes de avião por dia. Corresponde a seis incêndios diários, como a tragédia ocorrida na Boate Kiss. São treze vezes mais mortes por dia do que o causado pelo rompimento da barragem de Brumadinho. Mesmo possuindo apenas 2,7% da população mundial, o Brasil representa 10,2% das mortes por Covid-19 no mundo. Na última semana, quase 20% das mortes por Covid-19 no planeta aconteceram no Brasil. Somos hoje uma ameaça para a saúde pública mundial.

Se o Brasil tivesse um desempenho mediano, três de cada quatro dessas mortes poderiam ter sido evitadas. Em outras palavras, 200 mil das 265 mil mortes por Covid-19 ocorridas até hoje no Brasil não teriam acontecido não fôssemos um fracasso no combate à pandemia. Fossem as políticas de saúde guiadas pela ciência, 1.125 vidas poderiam ter sido poupadas, por dia, na última semana. O sistema de saúde pede socorro, e muitos estados estão com os serviços de saúde em colapso.

Nada disso é normal. Chegou a hora de a população brasileira levantar-se da mesa.

Pacientes com Covid são tratados em área improvisada do Hospital Regional da Asa Norte, em Brasília - Ueslei Marcelino/Reuters

A média móvel de casos nos Estados Unidos caiu 75% e as hospitalizações reduziram 67%. Em Israel, uma redução de 72% nas mortes e de 94% nas hospitalizações foi registrada com a campanha de vacinação mais ágil do planeta. Na Escócia, as hospitalizações também reduziram, de 85% a 94%. Deveríamos estar vacinando 2 milhões de brasileiros e brasileiras por dia, mas estamos vacinando menos do que isso por semana. Mesmo sendo o líder mundial de mortes recentes por Covid-19, o Brasil não está sequer entre os 45 países que mais vacinam no mundo.

Só há duas formas de evitar que a tragédia se torne ainda maior: reduzir a circulação do vírus e acelerar a campanha de vacinação. A redução da circulação requer distanciamento físico e rigorosa fiscalização para evitar aglomerações. Vários estados e municípios, cientes da gravidade do momento, já estão tomando medidas restritivas, apesar das críticas dos negacionistas e da falta de liderança do Ministério da Saúde. A aceleração da vacinação, até agora, dependia do Governo Federal, cujo líder declarou que não tomaria a vacina e sugeriu que quem tomasse poderia virar jacaré. Felizmente, na última semana, abriu-se a possibilidade de os estados e municípios comprarem suas próprias vacinas, eliminando o intermediário que tanto desserviço tem causado à campanha nacional de imunização.

Governadores(as) e prefeitos(as), levantem-se da mesa, por favor.

Também precisamos conhecer as iniciativas que não funcionam. Negar a gravidade do problema não resolve nada. Disseminar notícias falsas sobre tratamentos ineficazes também não. Andar sem máscara atrapalha. Desacreditar as vacinas ou o lockdown não funciona. Xingar jornalistas ou perseguir cientistas também não diminuem a mortalidade por Covid-19.

Se não sabe o que fazer, PEDE PARA SAIR.

Dedico essa primeira coluna ao neurocientista Ivan Izquierdo, falecido no dia 9 de fevereiro. Além de desvendar os processos paralelos e independentes das memórias de curta e de longa duração, o Professor Izquierdo mudou a forma de fazer ciência no Brasil. Que sua memória seja honrada, e a valorização da ciência, observada em tempos de pandemia, tenha longa duração.

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