Pedro Hallal

É epidemiologista, professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas e coordenador do Epicovid-19, o maior estudo epidemiológico sobre coronavírus no Brasil.

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Pedro Hallal
Descrição de chapéu Coronavírus

Errei, meu otimismo moderado não resistiu ao surgimento da ômicron

Diferentemente das variantes anteriores, a ômicron não foi anulada pela vacina

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No dia 13 de julho de 2021, escrevi a coluna "Quando acaba a pandemia?" aqui na Folha de S.Paulo. Naquele texto previ que, no Brasil, a pandemia se encerraria na virada do ano, na margem de erro, entre novembro de 2021 e fevereiro de 2022. Portanto, o título da coluna de hoje é "Errei".

Durante a minha infância, meu pai e minha mãe me ensinaram muitas coisas, e uma das mais importantes foi admitir os erros e aprender com eles. Teve uma vez que um colega meu da escola foi suspenso, e lembro que a mãe dele fez uma confusão gigantesca no colégio e conseguiu reverter a suspensão dele. Na época, achei o máximo.

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Em meio ao aumento de casos de Covid, pessoas lotam UBS em São Paulo - Rubens Cavallari - 4.jan.2022/Folhapress

Certa vez, na minha adolescência, fui suspenso do clube por uma semana, em função de uma bagunça que eu e alguns amigos fizemos na portaria. Cheguei em casa indignado, e pedi para a minha mãe ir lá no clube tentar reverter a suspensão. Minha mãe, tranquilamente, me perguntou o que eu tinha feito. Narrei tudo. Após acabar, minha mãe disse: "Vais ficar sem ir ao clube por duas semanas: uma pela suspensão imposta pelo clube e outra pela suspensão imposta por mim, agora. Que não se repita".

Não se repetiu.

Hoje em dia, as pessoas erram muito mais do que naquela época. Isso porque as redes sociais geram uma comunicação que carece do "olho no olho". E sem o "olho no olho", a chance de errar é muito maior. É muito fácil xingar alguém pela internet. Atacar uma pessoa e ferir sua reputação é quase a profissão de alguns hoje em dia.

Mas é muito raro hoje em dia vermos as pessoas admitindo o erro.

Por exemplo, o espanhol Rafael Nadal conquistou seu 21º título de Grand Slam no tênis, e foi parabenizado por seu arquirrival "Novax Djocovid". Foi uma atitude decente. Mas imaginem o quanto seria épico se o "Djocovid" viesse a público e dissesse:

"Parabéns Rafa. Vendo a final, notei como fui um imbecil nesses últimos meses. Só o que eu queria era estar lá, disputando ponto a ponto esse título contigo ou com o Medvedev. Entrei nessa guerra da vacina sem me dar conta da bobagem que ela representa. Farei a vacina amanhã mesmo e me espere em Roland Garros".

Enfim, admitir os erros está fora de moda.

Voltando ao meu caso, escrevi aquela coluna quando os casos e óbitos vinham em tendência sustentável de queda. Ao mesmo tempo, a vacinação avançava rapidamente no país depois de um começo lento. A variante delta, tão temida pelos estragos que causou em outros países, não resistiu à força do nosso herói Zé Gotinha.

Eu sabia que era possível que surgissem novas variantes, mas achava que, mesmo que surgissem, elas seriam "anuladas" pela vacina. Em minha defesa, até a chegada da ômicron, a previsão estava correta, e já falávamos em retirada de máscaras e até em Carnaval.

Quando a ômicron chegou, logo notamos duas coisas muito ruins:

  1. Se tratava de uma variante com imensa capacidade de contágio;
  2. Ela infectava também os vacinados.

Por outro lado, tínhamos algumas notícias promissoras:

  1. Ela é bem menos agressiva do que as versões anteriores do vírus;
  2. Entre vacinados, o risco de hospitalização e óbito é bem menor;
  3. A onda deve ser bem mais curta do que a observada para as demais variantes.

A verdade é que, dois meses após o surgimento da ômicron, o número de casos bombou no Brasil e no mundo. Infelizmente, o crescimento agora também se observa no número de hospitalizações e óbitos. Mesmo que a onda seja mais curta, ela causará muito estrago.

Já que as medidas efetivas de controle da transmissão são solenemente ignoradas no Brasil, resta investir na vacinação, em todos os grupos etários.

Até porque o presidente e o ministro da Saúde não vão admitir seus erros e começar a enfrentar o coronavírus com seriedade.

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