Pedro Diniz

Jornalista com formação em comunicação audiovisual pela Universidade de Salamanca (Espanha).

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Descrição de chapéu

Grife mostra como usar dados de clientes para prever tendências de moda

Amaro desenvolve leitura inteligente da compra de consumidores brasileiros por região

Ambiente interno da 'guide shop' da Amaro na rua Oscar Freire, em São Paulo - Eduardo Anizelli/Folhapress

Não foram apenas as imagens de moda que mudaram com as novas plataformas online. A venda de roupas agora é movida pela vitrine virtual mensurada por cliques que viram dados e, depois, tendências.

Essa é a nova conta do momento no mercado de roupas: subtrai-se gasto exorbitante com estoque, soma-se inteligência logística e multiplicam-se investimentos em tecnologia para prever, com o mínimo de risco, os desejos dos clientes.

A marca Amaro, do empresário suíço Dominique Oliver, é o melhor exemplo de nova gestão criativa e empresarial que pode virar modelo para grandes varejistas. Sem lojas físicas, apenas “guide-shops”, um lugar onde a pessoa prova uma peça mas a compra no ambiente virtual dos tablets distribuídos pelo espaço real, a etiqueta já lança 10 mil itens por ano em apenas seis de vida.

A sacada de Oliver, que trabalhou na reestruturação de gigantes como Abercrombie & Fitch e American Apparel, foi desenvolver uma leitura inteligente da compra dos clientes brasileiros por região. Ele entendeu que ao separar os dados por estado teria uma noção precisa de quais modelagem, aviamento, cor, tecido e modelo funcionam melhor para cada lugar.

Todos os modelos produzidos pela etiqueta têm uma ficha com dezenas de pormenores que, a partir do resultado nas vendas, são adaptados nas coleções seguintes.

Na cartilha tradicional, o volume de vendas de determinada peça diz se ela continua ou não na produção. Ao entender nos mínimos detalhes o que agrada mais às mulheres de diferentes lugares, o time de criação consegue desenvolver itens sem risco de encalhe e criar tendências pontuais.

Toda essa logística de criação torna o negócio capaz de atender ao objetivo do empresário, que é “vender o tempo inteiro e com qualidade, ou seja, no preço cheio”.

O carma da liquidação quase não atinge a grife, que apesar de não levantar a bandeira do fast-fashion, porque, segundo Oliver, “as roupas da Amaro têm qualidade superior”, lança produtos semanalmente.

Agilidade na entrega também define esse modelo. A promessa da grife é entregar em até duas horas e meia qualquer produto comprado na capital paulista, no mesmo dia para outras cidades do estado e no dia seguinte nas demais capitais. Essa rapidez, em teoria, alivia o incômodo de ter de esperar vários dias para usar a peça, tempo que vai na contramão da compra por impulso que movimenta o mercado virtual.

Seu segredo foi ter percebido que os problemas das marcas são sempre os mesmos: inabilidade de prever demanda e lentidão em respondê-la; inventário fragmentado dos estoques das lojas, nas quais quase metade do espaço é preenchido por caixas de produtos; e os descontos que, no longo prazo, prejudicam o faturamento do negócio.

Os dados, nesse contexto, são a mina de ouro da grife. Questionado sobre a privacidade dos usuários, Oliver diz que as informações não estão nem estarão disponíveis para marcas interessadas em conhecer os relatórios gerados a partir dos hábitos dos consumidores.

FORA DA BOLHA

Em um padrão similar ao veja-só-o-que-te-agrada do “feed” do Facebook, a Amaro direciona para o usuário ideias de compra condizentes com seu histórico na loja online, mudando a publicidade visível nas redes sociais conforme o clima onde a pessoa se encontra naquele momento. Isso evita que se oferte um casaco quente de couro para quem está de férias no litoral.

Também se inclui na receita da marca, que dobra de tamanho desde sua fundação, em 2012, a noção de que moda é movida por novidade. E é aí que reside a diferença entre o modelo da etiqueta e as bolhas sociais imaginadas por Zuckerberg.

Mesmo que alguém só compre vestido preto e curto, o algoritmo oferecerá modelos vermelhos, por exemplo, com modelagem completamente diferente da escolha habitual. De tempos em tempos, novas ideias são oferecidas, impedindo que o usuário dê voltas em torno de si.

Além de provar sua viabilidade, o modelo da Amaro serve de resposta a uma parcela caduca do varejo de moda que insiste em produzir apenas as tais “roupas que vendem”, geralmente básicas ou reproduções dos lançamentos internacionais, um modelo que, dentro de um mercado jovem que procura originalidade, se mostrou ineficaz e fadado à temida arara de liquidação.

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