Pedro Diniz

Jornalista com formação em comunicação audiovisual pela Universidade de Salamanca (Espanha).

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Pedro Diniz
Descrição de chapéu
Moda

Melania Trump marca gol contra si mesma e atualiza status de vítima da moda

Escrito 'eu realmente não me importo, você sim?' é prova de que ninguém 'usa qualquer coisa'

Melania Trump logo após viagem à fronteira do Texas com o México, onde visitou crianças encarceradas pela política de tolerância zero do marido. Em sua jaqueta, da marca Zara, lê-se "Eu realmente não me importo, você sim?". Chip Somodevilla/Getty Images/AFP - AFP

É comum ouvir alguém dizer que não está nem aí para a moda, mas, queira ela ou não, diariamente essa pessoa fará escolhas fashion que revelam muito sobre o que pensa ou quer projetar para os outros.

A jaqueta da primeira-dama americana Melania Trump é um manual de como marcar um gol contra movendo apenas um cabide do armário e a prova de que ninguém simplesmente “usa qualquer coisa”, mantra de quem se diz antimoda sem se dar conta de que seu look casual é tão planejado quanto o de quem passa horas em frente ao espelho.

Quando subiu no avião que a levaria ao Texas, onde crianças imigrantes estão detidas sem os pais a mando de seu marido, e depois de ter ganhado alguma simpatia do público defendendo via Twitter o “uso do coração” nessa tragédia humanitária, ela apareceu em um casaco verde-militar da Zara onde se lê “eu não me importo, você sim?”

Comecemos do princípio. A primeira-dama já deixou claro gostar do luxo, com um guarda-roupa milionário de Dolce & Gabbana a Gucci, e não dá ponto sem nó nas escolhas em eventos oficiais, porque sabe que sua imagem correrá o mundo.

Juntar o nome Zara, a rede de fast-fashion campeã de acusações por submeter imigrantes a trabalho escravo, a um escrito debochado como esse denota ou um nível raro de incompetência visual visto em figuras públicas, ou uma tentativa de desabafo subliminar.

Há motivos para defender a segunda opção e como o tiro saiu pela culatra. Por mais que a Casa Branca tente colar a tese “é apenas um casaco”, como a assessora de Melania divulgou após a visita, e que a mensagem dizia respeito à “desonestidade” da imprensa, como Donald Trump tuitou horas depois da celeuma se instalar, o passado recente prova o contrário.

Ela já imitou Jackie O. em uma versão Ralph Lauren de um dos trajes da ex-primeira dama, quis se aproximar da imagem de Hillary Clinton com seu look branco de alfaiataria no baile da posse de Trump e é vista usando símbolos da cultura americana, como o chapéu tipo caubói e os detalhes da indumentária western intrincados em peças como as da Calvin Klein.

Suas mensagens são tão claras quanto as cores que costuma usar. A dúvida de que o discurso poderia ser direcionado aos seus detratores vai de encontro à passividade com a qual ela lidou até agora com as críticas de que é um boneco de Washington.

Melania não fala, age pouco e, quando o faz, como o episódio do encarceramento infantil expôs, é para defender as opiniões do marido, mesmo quando não concorda com o resultado prático de suas ações.

Com igual desinteresse mostrado no auxílio aos atingidos pelo furacão Harvey, em Houston, no ano passado, quando calçou saltos Manolo Blahnik para pisar em terra arrasada, a primeira-dama dos EUA reafirmou, sem querer querendo, a intolerância de sua família. De quebra, atualizou o status de vítima da moda.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.