Pedro Diniz

Jornalista com formação em comunicação audiovisual pela Universidade de Salamanca (Espanha).

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Descrição de chapéu Moda

Como o rosa virou cor de menina, se sempre foi azul?

Ministra Damares Alves desconhece que até os cristãos nunca aderiram à fórmula cromática

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A história da moda diverge sobre o motivo do azul ter virado cor de menino, e o rosa, de menina, mas discorda em gênero e grau da nova ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que analisa a escolha cromática do vestuário como característica definitiva dos sexos.

Em um vídeo que circula nesta quinta-feira (3), ela afirma que é “uma nova era no Brasil”, onde “menino veste azul e menina veste rosa”. Não sabe, porém, que nem os cristãos adotavam a regra até a Segunda Guerra, quando as bolas começaram a ser trocadas.

Até lá, azul era uma cor essencialmente feminina, embora não fosse impeditiva para os homens. Por isso o manto de Maria, mãe de Jesus Cristo, não é rosa, nem vermelho, mas sim celeste, tom vinculado a uma personalidade pacificadora e pura, à época adjetivos relacionados à feminilidade.

Homens, nesse contexto, tinham o vermelho e suas subtonalidades, do laranja ao famigerado rosa, como cores de representação. O próprio Jesus é representado com manto vermelho e roupa branca.

Historicamente, os pigmentos quentes são símbolos de força, majestade e guerra. Mantos de reis, capas de cavaleiros, uniforme dos exércitos e guardas reais. O azul era só detalhe no fogaréu dourado e rubro dos oficias militares.

 

Até o final dos anos 1930 não havia divisão de cor no armário infantil, sempre alvejado num meio entre o branco total e o off-white, de aspecto envelhecido. Sinal de limpeza e pureza, o nada tingia os vestidos dos recém-nascidos porque ninguém nascia predestinado a vestir uma cor.

Mesmo quando cresciam não eram submetidos à régua cromática. Catálogos de lojas do início do século 20 apenas orientavam o que era consenso, que os róseos, por serem quentes, combinavam com rapazes, e os azuis, por sua delicadeza, com as mulheres. 

Duas correntes explicam a mudança. A primeira e mais difundida é a de que o mercado precisava de um empurrão quando a cultura de massa começou a se desenvolver, na segunda metade do século.

Trocar a cor sugerida para os sexos foi um lance de marketing numa época em que a moda instituía as roupas para o dia a dia, a minissaia, os jeans e a revolução de ideias proposta por Christian Dior (1905-1957) e Hubert de Givenchy (1927-2018). Crianças, assim, precisavam estar na moda.

Um personagem que neste ano completa 60 anos teve papel decisivo na mudança. O furacão loiro Barbie, apareceu pela primeira vez de maiô, em 1959, como símbolo da independência feminina que, como se inspirada pelos vestidos rosas de Cristóbal Balenciaga (1895-1972), instituiu a cor como uniforme.

Uma segunda corrente, cada vez mais aceita no meio acadêmico, explica a proibição do rosa como tom masculino a partir do fato de que os judeus homossexuais confinados nos guetos foram obrigados pelos nazistas a usar uma estrela rosa no braço como identificação de sua sexualidade.

Conta-se que por essa relação do rosa com a homossexualidade, os magazines americanos caçaram a cor de suas prateleiras masculinas e, só nos anos 1970, com a nascente contracultura, o rock’n roll e o glam de David Bowie, a cor voltou ao armário masculino como ferramenta de contestação.

Se Damares levar adiante sua ideia de restringir o armário alheio, terá de enfrentar uma indústria poderosa como a da moda, que custou a derrubar os preconceitos de cor e fazer com que até políticos e executivos aderissem aos róseos --rosa, lilás e salmão-- no uniforme de trabalho. 

Especialistas consultados afirmam que, depois do branco e do marinho, esses tons são os mais vendidos do segmento de camisaria para trabalho. “Ele é muito mais presente no guarda-roupa social do que no casual”, diz o estilista Bruno Passos.

Doutor em semiótica e autor do livro “O Herói Desmascarado”, sobre a imagem masculina ao longo dos anos, Mario Queiroz afirma que, para o Brasil, essa divisão é um “retrocesso enorme”, já que “os países desenvolvidos não separam mais nem brinquedo de menina e menino”.

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