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Enquanto governantes retiram direitos, favelas se organizam contra coronavírus

É preciso continuar a cobrar e denunciar para que problemas das periferias sejam amenizados

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Por Gizele Martins

No Brasil o número de mortos pelo novo coronavírus (Covid-19) vem chegando a 100 mil. O governo, no lugar de resguardar as vidas e seguir as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), se comporta de forma irresponsável desde o início da pandemia. Não investiu na saúde pública; não priorizou atenção básica aos bairros empobrecidos como abastecimento de água e energia; nem mesmo produziu campanha de comunicação sobre os riscos da doença.

Nas favelas e periferias do Rio de Janeiro, habitado por uma maioria de população negra e outros oriundos do Nordeste do país, tudo tem piorado: muitos perdendo emprego, outros sem alimentos, sem apoio para pagamento de aluguel, gás, energia, internet, água, atendimento médico, apoio psicológico e vários outros problemas que estão surgindo no decorrer destes últimos meses.

Diante de tal situação, inúmeros coletivos locais se organizaram e se mobilizaram desde o início da pandemia para salvar as suas próprias vidas. Formaram campanhas de comunicação e conscientização sobre os riscos de contaminação da Covid-19; organizaram cadastro de famílias para que começassem a receber cestas básicas e materiais de higiene; além das pressões pela garantia de direitos feitas aos órgãos públicos por meio de notas públicas, propostas de projetos de leis, reuniões.

Infelizmente, estes são coletivos que estão aprendendo a lidar com mais essa trágica situação nas suas favelas, para tentar amenizar um pouco do caos que é sobreviver a este período de coronavírus num lugar que nem o básico para higienização tem. Nos primeiros meses, diversas pessoas e movimentos sociais doaram materiais, alimentos e apoio financeiro para as campanhas. Mas é perceptível que as doações começaram a cair, e estes movimentos, sem estrutura, hoje diminuem suas ações nos locais.

Sabe-se que a responsabilidade de garantir a comida, a casa, a água e outras questões citadas acima é do Estado e não dos próprios moradores de favelas e periferias que estão se virando para suprir as suas necessidades. Mas, no lugar de os donos do poder priorizarem a vida, estão novamente preocupados com o mercado, com a economia do país e começaram a flexibilizar os espaços públicos e o comércio sem orientação que possa deixar a população informada ou segura sobre os riscos que corre ao voltar a circular. E o resultado disso é o aumento nos números de infectados e mortos.

As doações diminuíram, os governos flexibilizaram. E agora, favela?

Agora, com a diminuição das doações, a vulnerabilidade social vai aumentar dentro das favelas e periferias. A responsabilidade de garantir direitos básicos, porém, é dos próprios governantes. Sabendo que eles não estão preocupados com a vida dos cidadãos e das cidadãs brasileiras, pergunta-se: o que será da nossa população? A quem recorrer se, passados cinco meses de pandemia, são os nossos novamente que continuam sem receber o auxílio emergencial porque algum documento está faltando ou não há acesso à internet para se cadastrar no aplicativo da Caixa Econômica?

A situação só vem piorando. Diante disso, o que podemos sugerir hoje é continuar denunciando e cobrando as tantas faltas de direitos que estamos enfrentando. Devemos continuar cobrando aquelas já enfrentadas historicamente por causa do racismo estrutural. Temos que continuar organizados e coletivamente. A favela precisa de toda a sociedade para se manter viva e para que nossos problemas sejam amenizados. Para o futuro, que também é o agora, devemos olhar para outros povos em outras partes do mundo que estão se organizando e tentando resolver os seus problemas.

Afinal, o que enfrentamos aqui no Brasil é vivenciado por diversos outros países, seja pela América Latina, em países do continente africano ou em países do Oriente Médio. Ou seja, locais em que há também a exploração das forças de trabalho e das terras, espaços controlados pela militarização e pela colonização. E, por vivenciarem a mesma ausência de direitos, estão organizando campanhas de conscientização e de distribuição de alimentos. Já vimos experiências parecidas na Palestina, na África do Sul, na Argentina, na Índia.

Enfim, lutemos hoje por nossos direitos e vamos juntos trocar experiências neste momento de pandemia… Mais que isto, vamos aprender um com o outro e aos poucos construir um outro mundo para que a gente não implore mais por direitos mínimos, mas que tenhamos o todo, as nossas terras, as nossas casas, a nossa água, a nossa vida! A solução hoje é continuarmos em coletivo, a solução futura é aumentar a organização coletiva para lutarmos juntos pela libertação de todos os nossos povos!


Gizele Martins é jornalista e mestre em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas. Integra a articulação internacional de luta contra o racismo, o apartheid e a militarização Julho Negro, também participa do movimento Favelas na Luta e é autora do livro "Militarização e Censura - A Luta por Liberdade de Expressão na Favela da Maré".

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