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Encarceramento faz girar rede de negócios lucrativa

Na sanha capitalista, esquerda e direita se confundem quando se trata de enriquecer às custas dos corpos presos

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Por João Luis Silva

A informação de que as visitas nos presídios fluminenses retornariam dia 10 de setembro me deixou inquieto. No dia, levantei cedo, juntei algumas máscaras e frascos de álcool em gel que sobraram de outras ações e parti para a entrada principal de acesso aos presídios.

Lá chegando, fui logo impactado pelas lembranças, que de forma automática e insistente tomam minha mente sempre que estou nesses espaços. Mesmo depois de algum tempo sem ir até lá, e em um contexto de pandemia, o cenário continua exatamente como sempre foi.

Os semblantes das pessoas que retornavam da visita periódica ao lar eram de profunda tristeza, preocupação e medo, sentimentos vividos também por mim no período de prisão.

Mas dessa vez as pessoas estavam sendo obrigadas a retornar de forma abrupta, depois de um período de quase seis meses em casa, no meio de uma pandemia, sem qualquer estrutura de prevenção à disseminação de Covid-19. Sabendo que ficariam no isolamento por 15 dias. Quem conhece cadeia sabe bem como é um isolamento.

Muita raiva e tristeza em relação à situação a que estão submetidos os visitantes, em sua maioria mulheres, que vêm de várias regiões do estado. Aglomeradas nas filas, são obrigadas a correr de um lado para outro atrás das "senhas" (aquilo que garante sua entrada com mais agilidade). Levando sacolas plásticas para armazenar os itens (sucata, jumbo...) que serão enviados para seus familiares, buscando um lugar seguro onde possam guardar seus pertences. Tem aquelas que, informadas sobre as regras prisionais de última hora, precisam conseguir outro chinelo, outra blusa ou até mesmo um sutiã para poder entrar na unidade.

É, parceiro, cadeia é foda pra que tá dentro, pra quem tá fora e pra que transita lá e cá. Além de toda a correria já relatada, no período pandêmico, essas pessoas têm que lidar com outras preocupações: as luvas e máscaras exigidas pela secretaria de administração penitenciária. Ou seja, orçamento já apertado que custeia a caríssima vida prisional ainda tem que dar para os produtos de proteção individual. Em suma: sofrimento total.

O encarceramento faz girar uma rede de negócio lucrativa para muitos. Tudo é vendido nesse mercado: desde a sacola transparente até a liberdade. Vários atores se aproveitam dessa cultura punitivista de aprisionamento: da moça da coxinha ao mais alto escalão do Judiciário brasileiro. É possível que até aqueles cujo os discursos sejam em favor da garantia de direitos e pelo fim da prisão recebam comendas, projeção, visibilidade e muito, muito dinheiro para falar, escrever e pesquisar sobre aquilo com o qual jamais tiveram um contato real: o miolo da cadeia.

Nessa sanha capitalista, esquerda e direita se confundem quando se trata de enriquecer às custas dos corpos presos. E o prejuízo, a desestabilidade emocional, física e financeira? Ah! Essas ficam com os presos e seus familiares.

Por esses e outros motivos digo e afirmo: não falem de nós sem nós, não falem por nós, no máximo falem conosco.


João Luis Silva é bacharelando em direito, articulador social e mobilizador político na ONG Rio de Paz, cofundador e coordenador da Associação Eu Sou Eu - A Ferrugem, que trata dos direitos das pessoas que saem do sistema prisional brasileiro.

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