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Por quê?

Qual versão de Bolsonaro será presidente?

Palavras do presidente eleito não parecem ter muito valor

Este texto é sobre um episódio que teve pouca repercussão, quase passou despercebido. Justamente por isso é tão significativo. Na semana passada, o presidente eleito Jair Bolsonaro deu longa entrevista à Band abordando diversos assuntos, inclusive ligados à economia. Sobre a dívida pública, disse:
 
“Não vou dizer que é impagável. Dá para você pagar isso daí se você tiver um bom ministro da economia, como temos o Paulo Guedes, para conduzir essas renegociações de forma bastante responsável e mostrar para todos no Brasil que estamos todos no mesmo barco” –se preferir, confira a declaração de presidente eleito clicando aqui a partir de 1:20:10.
 
A mera menção a renegociar a dívida já seria suficiente para colocar o mercado em parafuso –Bolsa despencando, dólar disparando–, pois poderia ser vista como um calote parcial. Não ajudaria em nada no necessário ajuste nas contas públicas, pois credores passariam a incorporar uma probabilidade maior de calote, e com isso cobrariam juros maiores para continuar financiar o governo.

Mas esse cenário não se concretizou. Isso nos dá uma dimensão da importância do superministro Paulo Guedes no momento. O mercado parece desconsiderar totalmente as palavras de Bolsonaro, e confiar que Guedes conduzirá a economia com responsabilidade.

As ações de Bolsonaro certamente contribuíram para essa segurança. Ele sinalizou diversas vezes que Guedes terá elevada autonomia para tocar a área econômica. Mais importante, dará bastante poder ao ministro, ampliando consideravelmente o alcance da pasta – que passará a incorporar os atuais ministérios do Planejamento e da Indústria e Comércio.

Paulo Guedes, assim, atua como um seguro contra eventuais deslizes do presidente que poderiam assustar o mercado. Ajuda também a contrabalançar o histórico do capitão reformado em 28 anos de Congresso, quando sistematicamente votou contra medidas cruciais para o país, como privatizações, ajuste nas contas públicas e reforma da Previdência – justamente as políticas que agora abraça.
 
Mais tarde, de fato, o futuro ministro da economia desmentiu a história de renegociação da dívida. Mas nem seria necessário. Ninguém entrou em pânico.
 
A situação é, entretanto, frágil. Não sabemos se teremos um Bolsonaro pragmático –que entende o tamanho de nossos problemas e a necessidade de reformas –, ou se virá o Bolsonaro das votações do Congresso –aquele que, vira e mexe, reaparece em suas falas. Por enquanto, o mercado parece considerar alta a probabilidade de que se trata do primeiro caso, justamente pela escolha de Paulo Guedes. Mas lembre-se: Bolsonaro será o presidente, e não Guedes –e este último pode ser demitido.
 
O episódio também traz à tona um problema: as palavras do presidente eleito não parecem ter muito valor. O país precisa de reformas e políticas de ajuste importantes, que envolverão efeitos distributivos e provavelmente contarão com resistência. É crucial que o próprio presidente comunique à sociedade a importância dessas medidas. Para isso, suas palavras precisam ter valor.

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