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Descrição de chapéu inflação juros

A inflação mundial está aí e não deve sumir tão rápido

Uma tempestade perfeita se formou nos últimos anos

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Não é um fenômeno brasileiro apenas. Pegou fogo no mundo todo, tanto em economias emergentes como no grupo de elite das desenvolvidas. Nos EUA, anda na casa dos 8,5%; na Inglaterra, ali pelos 9%. Parece que estamos de volta ao início dos anos 1980. Seguem daí quatro perguntas relevantes:

"Vai passar?" Certamente.

"Rapidamente?" Cremos que não.

"É um problema?" Pergunta capciosa, mas pendemos para o não.

"Há MMTs-incendiários-inflacionistas infiltrados no Por Quê?" Não que saibamos!

Homem passa por um quadro exibindo os preços dos combustíveis em um posto de gasolina no centro de São Paulo, Brasil
Combustíveis estão entre os principais vilões da inflação no Brasil - Filipe Araujo/AFP

Uma tempestade perfeita se formou nos últimos anos para arrancar a inflação no mundo desenvolvido de seus monótonos 2% e arremessá-la violentamente para acima de 6%. Uma combinação de capacidade de oferta conturbada e estímulos excessivos, coroada por uma estúpida guerra.

Por que a inflação vai passar? Porque, em todo o mundo, estão sendo tomadas ações para derrotá-la. As políticas monetária e fiscal, que com a chegada da praga em 2020 foram colocadas em modo expansionista nível máximo (esses sim nunca antes vistos na história das repúblicas), estão sendo revertidas à normalidade. Déficits fiscais monstruosos de 10% a 15% vistos poucos trimestres atrás estão indo para a casa do zero em diversos lugares do mundo e os juros estão subindo, o que vai constranger o consumo.

Um exemplo: as taxas para compra de imóveis nos EUA passaram de 2,5% para 5% em questão de semanas! Os preços das casas americanas estão parando de subir e logo começarão a cair com essa hipoteca salgada. Houve, decerto, nos países avançados, um problema de timing. Enquanto nos emergentes, à medida que a inflação foi ganhando tração ao longo de 2021, os bancos centrais iniciaram o processo de normalização das taxas de juros, nos desenvolvidos abateu-se uma letargia. Esperaram vários trimestres com a inflação esquentando antes de acordar para a realidade de que o dragão havia despertado de sua longa hibernação. Neste exato momento, enquanto o juro no Brasil é maior do que a inflação corrente, nos Estados Unidos ele é cerca de um décimo dela. Incrível!

Nos anos 1980, quando no banco central dos EUA, Paul Volcker chegou para debelar a maldita, a dívida pública como proporção do PIB era de cerca de 30%. Hoje ela é de 125%, maior que tudo o que a economia produz num dado ano. Ou seja, se pegássemos todo o PIB norte-americano, todinho ele, não sobrando nada para as pessoas consumirem ou investirem, e usássemos para pagar a dívida do governo, ela retornaria ao patamar de lá de trás. Essa montanha de dívida dos países desenvolvidos (com raras exceções) é um constrangimento sério para ajustes muito abruptos da taxa de juros. Dívida muito elevada enseja riscos de diversas naturezas, e juro alto em cima de dívida alta é como uma bola de neve turbinada. Em resumo, subir o juro como fez Volcker nos anos 1980 pode levar a uma tremenda crise fiscal. Por isso nossa aposta é que no mundo desenvolvido as taxas de juros vão seguir subindo, mas não em alta velocidade. Isso, obviamente, significa que a inflação vai cair apenas bem lentamente.

O que não é necessariamente ruim se as expectativas de inflação futura seguirem relativamente ancoradas –e até aqui a desancoragem das expectativas foi modesta. Pela seguinte razão: essa surpresa na inflação ajuda, em menor ou maior grau, dependendo de outras características da economia, a aliviar o lado fiscal, a comer um pedacinho da dívida, a ajustar o salário real do funcionalismo para um nível mais condizente com o "emprego equivalente" do setor privado.

Mas, como brasileiros, somos gatos escaldados e, portanto, sabemos bem que inflação descontrolada não é solução para nada. A discussão é se faz sentido ou não forçar sua queda a uma velocidade muito rápida. Cremos que não, mesmo sendo ortodoxos.

Mauro Rodrigues (professor de economia na USP e autor do livro "Sob a lupa do economista") e equipe do Por Quê?

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