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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

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Descrição de chapéu Campeonato Brasileiro

Mazelas do futebol brasileiro são mais profundas do que trocas de técnicos

Só se verá futebol coletivo no Brasil quando houver mudança de mentalidade

Jorginho foi demitido do Vasco, onde ficou por 10 jogos, depois de deixar o Ceará, onde trabalhou 15 dias
Jorginho foi demitido do Vasco, onde ficou por 10 jogos, depois de deixar o Ceará, onde trabalhou 15 dias - Rafael Ribeiro/Vasco/Divulgação

O atacante Malcom, do Barcelona, tem 21 anos. Arthur, ex-Grêmio, completou 22, semana passada, e Vinicius Júnior acabou de fazer 18. Os três tiveram destaque na pré-temporada de Barcelona e Real Madrid e são esperanças para o Espanhol que começou na sexta (17)

Em comum, também têm o fato de terem atuado no Brasileiro nos últimos três anos. Malcom foi campeão brasileiro como titular do Corinthians, em 2015, Arthur ganhou a Libertadores de 2017, Vinicius Júnior foi campeão carioca.

Time bom consagra jogador ruim e time ruim enterra jogador bom. Mas eles sobreviveram à percepção de que os jogos aqui devem em qualidade.

O Brasil sofre na Libertadores e os times têm tantos altos e baixos no Brasileiro. Dois números ajudam a entender porquê: foram 19 mudanças de treinadores em 18 rodadas; houve 57 transferências de jogadores disponíveis na primeira rodada e já no exterior.

Os times não são bons porque mudam seus elencos e comissões técnicas como quem troca de camisa.

Mas tudo de ruim apontado pela crítica parece estar sendo notado menos pelas torcidas. O Flamengo tem a melhor média de público de um clube no Brasileiro em 35 anos: 47.800 torcedores por jogo. O Morumbi também nada contra a corrente e não registrou menos de 35 mil pagantes depois da Copa.

Não se pode negar o direito de um clube demitir um técnico nem de vender um craque. O problema é quando isso se acumula.

Quando se analisa o Brasileiro como um campeonato abaixo da crítica, tem a ver com a incapacidade de fazer o futebol ser jogado de maneira coletiva.

Parece redundante dizer que o futebol nunca foi esporte individual, mas isto não é óbvio para milhares de pessoas que repetem que Garrincha e Maradona venceram Copas do Mundo sozinhos.

Hoje, o passe vale quase tanto quanto o drible, porque os jogadores correm 13 quilômetros por jogo, em vez de sete, como há 40 anos. Porque se ocupa mais espaço e bloqueia-se mais o driblador. Tentar passar sozinho por três marcadores resulta em desarme até para Messi e Cristiano Ronaldo.

Tite, Guardiola e Arrigo Sacchi já relataram isto. Sacchi diz que quando vê seu Milan dos anos 1980, jogando em um terço do campo, julga que aquilo ficou velho.

Mas só será possível ver futebol de conjunto no Brasil quando diminuírem as trocas de treinadores e de elencos. "Não vai haver mais qualidade aqui sem treino e com janelas de transferências que nos exigem dois planejamentos por ano", diz o diretor de futebol do Palmeiras, Alexandre Mattos. Mesmo sendo o clube mais endinheirado do país, o Palmeiras perdeu cinco jogadores para o exterior: Keno, Thiago Martins, Fuzato, Fernando e Tchê Tchê. Dois foram titulares no ano.

A cada dia fica mais evidente a necessidade de adaptar a temporada brasileira à europeia. O êxodo não vai acabar, mas as transferências terão menos impacto sobre o Brasileiro e os times mudarão menos. Perder três titulares, como o Corinthians de 2018, torna tudo muito diferente de um ano atrás, quando Carille afirmava que manter o elenco seria mais reforço que contratações.

Sucessor de Carille, Osmar Loss concorda que as defesas brasileiras jogam muito recuadas e explica. "Quando os times mudam muito, perde-se a segurança e os zagueiros fazem como o ser humano em situações de medo: dão um passo para trás."

O nível do Brasileiro é mais baixo do que na Espanha, Alemanha e Inglaterra, porque não existe milagre. Ou melhor: existe um. Flamengo, São Paulo, Palmeiras e Corinthians carregam em média 29 mil torcedores por jogo. Desde 1983, não há no Brasil quatro clubes com 30 mil espectadores, em média.

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