O brilhante livro “Soccernomics” (Simon Kuper e Stefan Szymanski, 2009), trata em um de seus capítulos sobre as grandes contratações de clubes. Revela que apenas 16% delas explicam variações de times na classificação. Mais eficientes, os grandes salários explicam 89% do sucesso. No Brasil, as duas coisas parecem complementares. Não são. Dudu tem o maior salário do Palmeiras. Hoje, contra o Bahia, fará seu jogo 260 pelo clube.
O São Paulo realizou uma magnífica festa de apresentação para Daniel Alves e o Flamengo passou a semana debatendo a possível contratação de Balotelli. Na quarta (14), Rafinha completará um mês de sua estreia. Com ele, até aqui, o Flamengo tem duas vitórias, três empates e duas derrotas. Filipe Luís estreou levando 3 a 0 do Bahia. Pato fez sua primeira atuação pelo São Paulo em abril e já virou um museu de grandes novidades.
Tudo isto serve para lembrar que festa se faz quando se ganha título. Vários clubes brasileiros têm festejado apenas as contratações.
Não é ruim contratar. Pode ser parte de um projeto para criar ou rejuvenescer times vencedores. O problema é quando se entende que contratar é montar time, em vez de ser um passo para estruturar uma equipe nos treinos e jogos.
O futebol brasileiro é uma enorme contradição. Neste ano, saíram R$ 15 bilhões das Bolsas de Valores no país. Flamengo e Palmeiras arrecadam mais de R$ 600 milhões por ano, dois recordes. O Palmeiras faturou R$ 688 milhões no ano passado, mas gastou R$ 536 milhões com o futebol. O Flamengo tem previsão de arrecadar R$ 770 milhões neste ano. O custo do futebol do Flamengo, em todo o ano de 2018, foi de R$ 351 milhões. Só no primeiro semestre de 2019 foram R$ 288 milhões. A projeção anual é de crescimento de 64% dos custos. A análise é de Amir Somoggi, diretor da SportsValue.
“Soccernomics” explica que clube de futebol não é para fazer dinheiro. Também não é para quebrar, como Vasco, Botafogo e Fluminense...
Enquanto se gasta o que tem, tudo bem. Mas é assustador pensar que o Brasil entrou na rota dos grandes salários, atrai europeus como Balotelli, Juanfran e Pablo Marí, veteranos com mercado na Europa, como Daniel Alves, Rafinha e Filipe Luís, e mesmo assim segue a lógica de vender quem a Europa deseja. “Pensamos no custo-benefício”, disse o presidente do Flamengo, Rodolfo Landim, sobre a chance concreta de vender Reinier, de 17 anos.
No processo de globalização, o Brasil sempre esteve na porta dos fundos. Nosso papel é comprar o jogador latino, que não interessa à Europa, e vender a estrela do futuro. Houve momentos em que o câmbio permitia trazer de volta Ricardo Rocha, Evair, Edmundo, Mazinho, Leonardo... Em outra época, foi possível contratar Sorín, Astrada, trazer Petkovic. Às vezes parece que o Brasil sempre teve as fronteiras fechadas. Mas Doval foi ídolo do Flamengo, Pedro Rocha do São Paulo, Romerito do Flu.
O mundo dá voltas e é bom olhar para a história para tentar entender o presente.
Não há nem haverá aqui um clube que arrecade como o Real Madrid, o Manchester City ou o Barcelona.
as Flamengo e Palmeiras estão na faixa de Sevilla e Valencia. “Acima dos times de Portugal, com certeza”, diz Rodolfo Landim. Então, dá para competir. Não nas contratações, que representam 16% das mudanças de tabela. Mas nos grandes salários. Dá para pensar em manter Reinier, mesmo trazendo Balotelli.
O que inibe esta chance é apenas um detalhe: Reinier continua querendo ir embora.
Porque o Brasil ainda não conseguiu criar um grande Campeonato Brasileiro.
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