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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

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Meninos sem pátria, o fenômeno que se encarrega de tirar a importância das seleções

Tanto faz torcer por um brasileiro que atue pela seleção ou por um conglomerado multinacional

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Lewandowski ficará de fora das quartas de final da Champions League, contra o Paris Saint-Germain, por causa de uma lesão sofrida a serviço da seleção da Polônia, pelas eliminatórias da Copa.

O prejuízo do Bayern de Munique é calculável.

Campeões da temporada passada, os bávaros levantaram 76 milhões de euros. Chegar até as quartas de final deste ano já rendeu 45 milhões. O clube deixará de colocar 31 milhões em seus cofres se não chegar às semifinais.

As lesões de jogadores a serviço de suas seleções sempre produzem argumentos fortes para acabar com as convocações obrigatórias, mas os torneios entre países têm dois lados a ponderar.

É evidentemente injusto que as federações nacionais tirem jogadores de seus clubes, usem-nos por dez dias seguidos e, muitas vezes, devolvam o ídolo em estado precário, sem condição de disputar partidas fundamentais.

Por outro lado, as seleções seguem tendo um valor para difundir futebol por todo o planeta. Seria diferente se Son Heung-min fosse apenas do Tottenham, sem nenhum vínculo com a Coreia do Sul. Ou se Lewandowski fosse apenas craque do Bayern e não tivesse relação alguma com a Polônia.

A Copa do Mundo ainda é o momento em que o filho de uma família que não assiste ao futebol pode se apaixonar e se transformar num torcedor e, até mesmo, consumidor de produtos de um clube. Um garoto brasileiro pode se apaixonar ao assistir a Neymar pela seleção em um mundial, sem jamais tê-lo visto no PSG.

Mas existe um fenômeno que se encarrega de tirar a importância das seleções, do sentimento de pertencimento, que há décadas se esforça em desaparecer em meio à globalização. São os meninos sem pátria.

Há um livro de Luiz Puntel, publicado em 1981, ficção baseada no caso do jornalista mineiro José Maria Rabêlo, que precisou se exilar durante a ditadura e só voltou ao Brasil com a família após a anistia.

A obra falava do sofrimento de meninos que não se sentiam bolivianos, quando viviam na Bolívia, nem chilenos, quando abrigados no Chile, e que só se sentiram em casa quando puderam voltar ao Brasil.

Leitura obrigatória na sétima série, ajudou meninos da minha geração a entenderem como foi cruel o 31 de março de 1964.

Os atuais meninos sem pátria são outros. Casos de Cicinho, lateral com passagens pela Ponte Preta e pelo Santos, hoje titular da Bulgária. Ou Emerson Palmieri e Rafael Tolói, convocados por Roberto Mancini para defenderem a Itália. Ou ainda Mário Fernandes, ex-Grêmio, hoje da seleção da Rússia.

Rafael Toloi em ação pela seleção italiana contra Lituânia, nas eliminatórias para a Copa
Rafael Toloi em ação pela seleção italiana contra Lituânia, nas eliminatórias para a Copa - Petras Malukas - 31.mar.2021/AFP

Nascido na Inglaterra, o atacante Michail Antonio aproxima-se de jogar pela Jamaica, porque os dirigentes do país do Caribe descobriram que seu avô partiu de Kingston em um navio a caminho do Reino Unido no início do século 20.

Até 1962, a Fifa permitia que jogadores contratados por clubes europeus jogassem pelos países onde residiam. Assim, o argentino Sívori disputou a Copa pela Itália e o húngaro Puskás jogou pela Espanha.

Mudou a partir de 1966. Mas, em 2004, a Fifa voltou a permitir que um jogador sub-20 de um país jogue no time adulto de outro.

Rafael Tolói foi vice-campeão mundial pela seleção brasileira de juniores em 2009. Hoje, sonha ganhar a Copa de 2022 vestido com o uniforme da Azzurra.

Não faz o menor sentido.

Ou pior. A única explicação é a valorização profissional.

Nesse caso, tanto faz torcer por um brasileiro que atue pela seleção ou por um conglomerado multinacional, comandado por um oligarca russo ou um príncipe árabe, sediado em Londres, Manchester ou Paris.

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