Rafael Muñoz

Economista líder para o Brasil do Banco Mundial, já trabalhou para a instituição na Ásia e na África.

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Cadastro Positivo deve melhorar as condições de crédito para consumidores e empresas

Medida deve aumentar a concorrência no mercado ao fornecer referências concretas

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O Brasil está realizando uma reforma importante no Cadastro Positivo. Ela vai permitir que instituições financeiras coletem dados sobre o histórico de crédito dos mutuários e desenvolvam uma pontuação sem a necessidade de consentimento do consumidor, melhorando a avaliação de risco de crédito dos clientes. Espera-se que essas medidas melhorem o acesso e as condições de financiamento.

No Brasil, as informações negativas de crédito (por exemplo, sobre inadimplência, pagamentos em atraso, falências etc.) já existiam muitos anos antes da reforma e eram compartilhadas pelo sistema de informações de crédito.

As informações positivas de crédito (pagamentos em dia) também já se encontravam parcialmente disponíveis para instituições financeiras reguladas, por meio do Sistema de Informações de Crédito administrado pelo Banco Central do Brasil. Porém, no caso dos dados positivos, a participação não era obrigatória; era necessária a autorização prévia dos consumidores para inclusão no sistema.

Nesse contexto, as agências de crédito possuíam dados negativos sobre aproximadamente 58 milhões de pessoas, ao passo que as informações positivas eram muito mais limitadas --atualmente, cobrem cerca de 10 milhões de pessoas.

Era mais fácil identificar maus pagadores do que bons pagadores, aumentando o custo do crédito (e reduzindo sua disponibilidade) para os clientes que pagam suas contas e empréstimos em dia. O Brasil foi um caso atípico em comparação a economias da América Latina que contam com informações positivas e negativas de crédito, como o México, a Colômbia, a Argentina e o Peru, entre outros.

O novo Cadastro Positivo visa ampliar os dados das agências de crédito e a cobertura dos consumidores por meio da coleta de dados positivos, incluindo dados históricos, com um mecanismo onde o consentimento é necessário apenas para a exclusão; ou seja, todos os consumidores são incluídos, a menos que solicitem explicitamente sua remoção do sistema.

O novo Cadastro Positivo deverá aumentar a coleta e o processamento de dados positivos, ampliando a cobertura dos atuais 10 milhões para cerca de 90 milhões de pessoas. Além disso, as agências de crédito poderão desenvolver e oferecer sistemas de pontuação de crédito para todos os potenciais credores.

Essa medida deve aumentar a concorrência no mercado de crédito ao fornecer, para todos os credores, referências concretas em relação à capacidade creditícia de seus clientes.

A reforma é muito importante para reduzir o custo do crédito, melhorando a capacidade das instituições financeiras de avaliar, com mais precisão, a capacidade creditícia de seus clientes.

De acordo com várias pesquisas do Grupo Banco Mundial, sistemas amplos de informações de crédito estão associados a maior acesso a crédito e melhores condições de financiamento (taxas de juros mais baixas e prazos mais longos) (1). Sistemas eficientes de informações de crédito deixam as informações mais simétricas e, com isso, diminuem os custos e riscos para as instituições financeiras, tornando os empréstimos mais eficazes.

Segundo as evidências, nos países com sistemas de informações de crédito que compartilham informações positivas e negativas (por exemplo, agências de crédito), a disponibilidade de crédito é maior e as taxas de inadimplência são mais baixas em comparação a sistemas que se limitam a dados negativos (Barron e Staten, 2003).

Por exemplo, um estudo de 2003 aponta para uma redução de 22% na taxa de inadimplência na Argentina com o uso de informações negativas e também positivas (2).

Outro estudo indicou um aumento de 89% nas aprovações de crédito com o uso de dados negativos e positivos, em comparação a sistemas apenas com dados negativos (3).

Apesar dos vários benefícios da reforma, os consumidores podem ficar preocupados com questões de privacidade e proteção de dados. É o que costuma acontecer e as experiências internacionais podem ajudar a mitigar riscos dessa natureza.

Elas são refletidas nos Princípios Gerais de Informações de Crédito do Banco Mundial, que recomendam que “os sistemas de informação de crédito estejam sujeitos a medidas adequadas e eficazes de regulamentação e supervisão por parte do Banco Central, de um supervisor financeiro ou de outras autoridades relevantes”.

De fato, o marco jurídico já prevê a proteção de dados e a privacidade, e o Banco Central do Brasil já regulou o registro de prestadores de serviços de informações de crédito. O Banco Central criou uma estrutura de supervisão "leve" baseada no registro de agências de crédito - que ficam obrigadas a cumprir certos requisitos - e já registrou quatro agências de crédito que coletam e processam dados positivos.

No futuro, é importante que o Banco Central trabalhe em estreita colaboração com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados para definir uma estrutura de supervisão das informações de crédito de modo a equilibrar os objetivos das políticas para ampliar o acesso a crédito e a devida proteção dos consumidores.

No curto prazo, é importante monitorar o mercado de crédito nos próximos meses. Essa medida visa evitar problemas como: campanhas de empréstimos dirigidas a públicos específicos com base em suas pontuações; produtos oferecidos, mas que não atendem às necessidades dos consumidores; ou a exclusão de determinados consumidores devido a uma pontuação de crédito baseada em dados imprecisos.

É importante que o consumidor entenda o novo sistema, incluindo: as consequências da decisão de não participar, os mecanismos existentes para acessar seu histórico de crédito, os principais fatores que contribuem para a pontuação de crédito e os tipos de instituições que acessaram sua pontuação e histórico.

Com essa reforma, o Brasil se eleva ao patamar de países pares ao usar, de forma abrangente, informações já disponíveis para melhor avaliar o risco dos empréstimos e, com isso, aumentar o acesso a linhas de financiamento e reduzir o custo do crédito para os consumidores.

Esta coluna foi escrita em colaboração com Bujana Perolli, especialista sênior para o setor financeiro do Banco Mundial.

1 The Impact of Credit Information Sharing Reforms on Firm Financing, Development Research Group WBG, Agosto de 2014; Jappelli e Pagano, 2002; Detragiache, Gupta, and Tressel, 2005, “Finance in Lower-Income Countries: An Empirical Exploration”. IMF Working Paper. Djankov, McLiesh, and Shleifer, 2007. “Private Credit in 129 Countries.” World Bank Group, Working Paper; Galindo and Miller, 2001, “Can Credit Registries Reduce Credit Constraints? Empirical Evidence on the Role of Credit Registries in Firm Investment Decisions”.

2 Majnoni, Miller, Mylenko e Powell (2003) “Public Credit Information Systems: Evaluating Available Information”, Banco Mundial.

3 Barron e Staten (2003). The Value of Comprehensive Credit Reports: Lessons from the U.S. Experience”. In Credit Reporting Systems and the International Economy ed. Margaret Miller. Boston: MIT Press.

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