Raquel Landim

Jornalista especializada em economia, é autora de ‘Why Not’, sobre delação dos irmãos Batista e a história da JBS.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Raquel Landim
Descrição de chapéu Balanços

Trump não entende que a única maneira de lidar com a China é na OMC

O correto seria pressionar o país asiático a parar de subsidiar sua indústria siderúrgica

A metáfora está desgastada, mas nenhuma outra funciona melhor para explicar o impacto do intervencionismo governamental na economia do que a de um dique vazando água.

Tomemos como exemplo a iniciativa protecionista do presidente Donald Trump de elevar para 25% as alíquotas à importação de aço nos Estados Unidos a partir desta sexta-feira (23).

Existe no planeta uma capacidade excessiva de produção de aço, principalmente na China, onde centenas de siderúrgicas pouco competitivas e extremamente poluidoras só funcionam graças ao apoio dos governos provinciais.

Essa produção exagerada provocou uma série de buracos no dique do comércio de aço, inundando os mercados. Nos EUA, maior consumidor mundial e que também possui uma indústria siderúrgica pouco competitiva, o rombo é enorme.

Trump resolveu utilizar o poderio econômico e político americano para tampar provisoriamente o buraco. O problema é que a inundação não vai parar.

Um alto-forno de uma siderúrgica não funciona pela metade, ou seja, mesmo com a menor demanda nos EUA, a China vai fabricar a mesma quantidade de aço e vendê-lo a preços ainda mais baixos.

Isso significa que vão surgir mais e mais buracos no dique –o  chamado desvio de comércio.

Antecipando-se ao fenômeno, as indústrias já se mexem ao redor do planeta.

Para citar só dois fatos: os europeus anunciaram uma investigação de salvaguardas, e as siderúrgicas brasileiras bateram na porta do Planalto pedindo proteção contra as importações.

Eventualmente a pressão sobre o comércio do aço vai “vazar” para outros diques quando os países começarem a retaliar os EUA. Os chineses já disseram que vão sobretaxar produtos americanos em até US$ 3 bilhões.

Por enquanto, Trump utiliza a estratégia de dividir para governar, deixando de fora da sobretaxa países como Brasil, Argentina, Coreia do Sul, além da União Europeia. Mas isso não vai funcionar por muito tempo.

O que o presidente americano não entende é que a única forma de resolver efetivamente o problema é reduzir a pressão excessiva no dique, ou seja, pressionar a China a parar de subsidiar sua indústria siderúrgica. E não existe outra maneira de fazer isso do que na OMC (Organização Mundial de Comércio).

A China se beneficiou enormemente ao entrar na OMC e é sensível a pressões do xerife do comércio global.

Ao invés disso, o presidente americano prefere dobrar a aposta e anunciar com estardalhaço uma guerra comercial contra os chineses com tarifas sobre até US$ 60 bilhões em produtos, com uma alegação confusa de que Pequim estaria absorvendo tecnologia americana de forma desleal.

Só o que ele vai conseguir é elevar os preços para os consumidores americanos.

Os céticos podem argumentar que as negociações na OMC são demoradas e pouco eficientes dada a dificuldade de se encontrar consenso entre todos os países. Mas, nesse ponto, recorro de novo a um velho ditado: ruim com ela, pior sem ela.

Ao minar a OMC que os próprios EUA ajudaram a criar, Trump só piora o problema.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.