Eliane Trindade

Editora do prêmio Empreendedor Social, editou a Revista da Folha. É autora de “As Meninas da Esquina”.

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Investimentos de impacto devem chegar a US$ 1 trilhão em 2020

Em cúpula global, especialistas avaliam que a Covid-19 alavancou mercado de finanças sociais, que avança também em métricas para medir danos ambientais

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A crise sem precendentes da Covid-19 sinaliza para a era da transparência quanto a riscos socioambientais nas finanças globais com reflexos na definição de investimentos e na gestão dos negócios.

“Estamos caminhando para um mundo onde o impacto é o novo normal”, afirmou Cliff Prior, presidente-executivo do Global Steering Group for Impact Investment (GSG), na abertura da cúpula global sobre o tema.

No evento online realizado de 9 a 11 de setembro, a mensagem de otimismo perpassou painéis, workshops e falas.

O GSG Summit 2020 reuniu 1.500 participantes de 60 países entre investidores e gestores de fundos, CEOs e empreendedores, representantes de organismos internacionais e de governos.

Philipp Hildebrand
Philipp Hildebrand, vice-presidente da BlackRock, a maior gestora de fundos do mundo, participou do GSG Sumitt 2020 - Reprodução

A recuperação econômica pós-Covid-19 orientada para a diminuição das desigualdades e para o impacto foi o tema central do encontro virtual em tempos de pandemia.

“A sustentabilidade financeira depende da sustentabilidade social e ambiental”, disse Kristalina Georgieva, diretora-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), no primeiro dia do summit.

"Podemos construir uma recuperação rica em empregos, que impulsione uma economia global sustentável e resiliente no longo prazo.”

Para a chefe do FMI é importante que o mundo pós-Covid-19 seja moldado por financiamentos e investimentos calcados em compromissos ambientais, sociais e de governança (ESG, da sigla em inglês).

Visão em consonância com o discurso de Philipp Hildebrand, vice-presidente da BlackRock, a maior gestora de fundos do mundo, com uma carteira de US$ 7,4 trilhões em ativos.

“Ignorar riscos ambientais no portfólio é subestimar o valor da carteira no longo prazo”, disse o representante de um gigante do mercado financeiro global.

Em fala de 15 minutos no segundo dia do evento, Hildebrand defendeu que a sustentabilidade seja alçada ao “core” das operações e das avaliações de risco.

Frente a um cenário de desigualdades socioeconômicas e desemprego em meio à crise climática e sanitária, o setor financeiro tem que fazer a sua parte, segundo ele. "O mercado tem a oportunidade de demonstrar que pode ser um catalizador de mudanças.”

As declarações de um dos membros do Comitê Executivo Global da BlackRock levaram os ativistas do movimento pelo investimento de impacto a crer que finalmente o mercado ESG deixará de ser nicho para ser mainstream.

Sir Ronald Cohen e David Cameron
Sir Ronald Cohen, presidente do GSG Group, e David Cameron, ex-primeiro-ministro britânico, foram destaque no evento online sobre investimento de impacto - Reprodução

"Temos um papel a desempenhar na recuperação econômica e na mudança do sistema capitalista para alcançarmos o mundo mais justo e sustentável que queremos", afirmou Sir Ronald Cohen, presidente do Global Steering Group for Impact Investment (GSG).

Em seu discurso de boas-vindas aos participantes do evento, ele anunciou que investimentos de impacto devem chegar ao patamar de US$ 1 trilhão em ativos em 2020.

“Alcançamos um ponto de inflexão”, avaliou Cohen, diante de um movimento que ganha tração na crise da Covid-19.

Panorama traçado durante conversa com David Cameron, ex-primeiro-ministro britânico, no segundo dia da cúpula.

Cohen recordou-se que, em 2013, durante encontro do G-8 no Reino Unido, Cameron lançou a Força-Tarefa de Investimento Social, missão que lhe coube presidir.

O investidor passou a ser conhecido como “lorde das finanças sociais” e mentor de alianças pelo investimento de impacto espalhadas por 32 países em todos os continentes .

Apesar dos avanços, Cameron disse ser preciso alcançar um próximo nível em engajamento.

“Impacto é algo que não deve ser discutido só nos bastidores”, disse. “Precisamos chegar aos gabinetes e estar nas declarações de primeiros-ministros e presidentes.”

Foi Indagado por Cohen sobre um "um novo, novo acordo", nos moldes do New Deal, a série de programas implementados por Roosevelt para superar a Grande Depressão na década de 1930 nos Estados Unidos.

Cameron respondeu que "esta é uma grande esperança", mas lançou duvidas quanto à liderança de Donald Trump, atual presidente americano.

“Não acho que Trump esteja nesse mesmo comprimento de onda”, avaliou o britânico.

Além de vontade política, Cameron defendeu medidas práticas como estabelecer métricas para medição de impactos sociais e ambientais causados empresas.

Um tipo de mensuração que deu passo importante em julho, quando foi publicação estudo sobre o custo do impacto ambiental em 1.800 empresas, realizado pela Impact-Weighted Accounts Initiative (IWAI) da Harvard Business School.

“Nos últimos anos, a maioria das grandes companhias aéreas internacionais relatou lucratividade saudável. Mas nossos cálculos mostram que isso é uma miragem”, escreveu Cohen, um dos patronos da inicitiva, em artigo que apresenta os resultados.

O texto é em assinado em conjunto com o professor George Serafeim, que conduziu os estudos do projeto de gerenciamneto de impacto na universidade norte americana no ano passado.

“No caso da Lufthansa e da American Airlines, por exemplo, contabilizar seus custos ambientais de US$ 2,3 bilhões e US$ 4,8 bilhões, respectivamente, tornaria ambas as empresas não lucrativas”, concluem os autores.

A contabilidade de impacto ambiental é estimulada por uma rede global de inovadores, empresas, investidores e ONGs que apostam em tecnologia e big data para fazer da medição e avaliação de impacto corporativo uma realidade.

O efeito seria comparável às regras contábeis definidas na década de 1930 para comparar desempenho financeiro. E também do sistema de mensuração de risco surgido nos anos 1970. Um terceiro momento começaria agora ancorado em um tripé: risco, retorno e impacto.


A entrada em cena da transparência em termos de impacto socioambiental tem poder de mudar regras do jogo.

A análise do extenso conjunto de informações do IWAI sob a lente de impacto, com base em dados de 2018, traz uma nova perspectiva sobre a verdadeira lucratividade de empresas globais.

Muitas geram custos ambientais maiores que a geração de caixa de suas operações (Ebitda).

Segundo as métricas desenhadas em Harvard, das 1.694 empresas analisadas que tiveram Ebitda positivo, 252 (15%) teriam seu lucro eliminado pelos danos ambientais que causaram, enquanto 543 (32%) veriam sua lucratividade reduzida em 5% ou mais.

Usando os mesmos cálculos, indústrias dos setores de aviação, papel e produtos florestais, energia, construção e embalagens veriam mais de um quarto de seu Ebitda eliminado para compensar o impacto negativo que provocam no ambiente.

O grupo de estudo identificou 56 organizações líderes em todo o mundo que praticam alguma contabilidade ponderada por impacto.

É o caso da Danone. “Nenhuma empresa pode existir sem ter uma utilidade social. Vamos começar por reconhecer que o impacto está embutido em qualquer negócios que fazemos”, afirmou Emmanuel Faber, CEO da líder francesa de alimentos.

Bandeira ainda mais pop na pandemia. "Investimento de impacto está na boca de financistas, governos, CEOs de empresas”, avalia Beto Scretas, consultor do Instituto de Cidadania Empresaial (ICE) e membro da diretoria-executiva da Aliança pelo Investimentos e Negócio de Impacto no Brasil.

A crise da Covid-19 , diz o brasileiro, acelerou a economia do impacto em todo o mundo. "Até no Brasil, onde o mercado ESG era nada e agora virou arroz com feijão."

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