Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “Máximas de um País Mínimo”

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Reinaldo Azevedo

Setores do PT quase imploram por mais uma solução heterodoxa

O quadro eleitoral é o mais notório rebento da herança viciosa da Lava Jato

O ministro Roberto Barroso, relator no TSE do pedido de impugnação da candidatura de Lula, é um notório legislador sobre o já legislado. 

Pode, com uma piscadela, constitucionalizar tanto o aborto de fetos humanos como a proteção às vacas. Ele se explica citando um Kant mal-ajambrado e nem se despenteia. É provável que, desta feita, ele substitua seu Kant pelo avesso por canja de galinha, morta sem maus-tratos. 

O PT que pensa quase implora para que ele ceda aos apelos de Raquel Dodge e declare liminarmente a inelegibilidade de Lula. Quanto mais o veto ao petista se assemelhar a um ato de força, melhor para a mística partidária e a campanha eleitoral.

O ainda candidato e seu partido conseguiram meter a política e o Judiciário num transe. Explica-se o pano de fundo: como o petista foi condenado sem provas —e foi!— e como está preso ao arrepio do Inciso LVII do Artigo 5º da Constituição —e está—, e como, adicionalmente, se deu de barato que seguir “a letra fria da lei” prejudicaria a Lava Jato, teme-se agora que o triunfo de alguma heterodoxia conduza o país aos caos. Barroso, que costuma rasgar a Constituição e as leis, tem de vestir, desta feita, a toga do conservador cuidadoso. Que truque empregar para ignorar os prazos que arrastam a decisão para depois do início do horário eleitoral — que, nesse caso, trará como candidato o “Lula sub judice”? 

Como esquecer que foi o desprezo à forma da lei que nos jogou à deriva? Os juízes heterodoxos de antes tentam se apegar agora ao que deveria ser a prática corriqueira nas democracias: a aplicação da lei em sua literalidade, quando ambiguidade nenhuma a corteja ou lhe turva o sentido. E a Lei da Ficha Limpa, já escrevi, pode ser burra, mas é clara. Permanece, no entanto, a questão: como impedir Lula de estrear no rádio e na TV como candidato?

Existe o risco de grandes sortilégios, sim! Vamos ver? Um deles: Lula permaneceria candidato e teria seu nome impugnado só depois da eleição. A avalanche de votos que receberia seria declarada inválida. Abrir-se-ia a possibilidade de um segundo colocado ser eleito no primeiro turno com algo em torno de 30% dos votos válidos. No cenário ainda mais temerário, o petista seria eleito sem óbice da Justiça Eleitoral, mas permaneceria na cadeia, já que urna não absolve ninguém nem serve de habeas corpus. Não vão acontecer nem uma coisa nem outra. A simples possibilidade de uma e de outra indica a miséria a que chegamos.

A bagunça não implica que alguns valentes tenham aprendido a lição. Autoridades e funcionários de Estado continuam a fazer politicagem na planície. No dia 1º de janeiro de 2019, o Palácio do Planalto estará sob nova gerência. Desde já, e anotem para depois apresentar a cobrança a este cronista de desassossegos, a instabilidade está contratada.

Entes que se arvoraram em gerentes ou gendarmes da democracia não se mostram dispostos a voltar para a caixinha da Constituição. Um exemplo? A Polícia Federal está em movimento para eleger diretamente o diretor-geral. Rogério Galloro, atualmente no cargo, concede entrevista e deixa claro que descumpriu uma ordem judicial escrita e impressa e preferiu seguir embargos auriculares. Estivesse naquele 8 de julho com o telefone desligado, Lula teria sido solto. Eis o “policialismo” a ocupar o território da política, um dos caminhos do bem, segundo Aristóteles. Quem é esse? Chega de citações! Fogo nele! Nota à margem: você acha ruim o Congresso que temos? Espere o próximo.

O quadro eleitoral que aí está é o mais notório rebento da herança viciosa da Lava Jato. Sem articulações heterodoxas, Lula estaria a dias de voltar para o Palácio do Planalto depois de tudo o que se sabe sobre o seu partido. 

Em segundo lugar, eis Jair Bolsonaro, aquele que quer combater a epidemia homicida no Brasil distribuindo portes de arma. Para matar Aristóteles! É seu jeito de ver “o Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”, inclusive, claro! de Aristóteles...

Resta torcer para que o eleitorado nos livre das artimanhas do tinhoso, onde se contam os “politicidas” e os demagogos da moral.

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