Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “Máximas de um País Mínimo”

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A luta entre Bolsonaro e Moro derrubou Cintra, não a CPMF

Secretário caiu porque não conseguiu desmontar 'bunker' lavajatista na Receita

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Marcos Cintra caiu porque não conseguiu tirar de Sergio Moro e da Lava Jato o controle de setores da Receita Federal. O resto é papo-furado.

Dar curso à conversa de que suas divergências com Jair Bolsonaro sobre a recriação da CPMF estão na raiz da demissão corresponde a engabelar o distinto público.

Trato um pouco do assunto para voltar ao que realmente interessa: a luta intestina entre Moro e Bolsonaro. Taxar as transações financeiras é o mais rentável de todos os impostos. Inexiste reforma tributária mais fácil do que essa.

Se a alíquota não for extorsiva, dói pouco no bolso de quem paga, arrecadam-se os tubos, e o governo faz com a grana o que lhe der na telha.

Guedes, como já noticiou este jornal, quer desonerar a folha de salários. Segundo certo pensamento mágico, isso vai gerar uma incrível onda de empregos.

Ocorre que inexiste folga fiscal para tanto. Ao contrário. O que se tem é rombo —e notem que fica pelo caminho a promessa, que nunca foi cumprível, de zerar o déficit ainda neste ano.

Vendeu-se muito terreno na Lua, mas os selenitas precisam acreditar em alguma coisa. Esse “déficit zero” pertence ao mesmo arquivo morto daquele trilhão que seria arrecadado com privatizações.

A verdade é que a CPMF continua a ser a melhor ideia que se teve até agora, porque a única, de reforma tributária —que consiste no raciocínio mágico de que todos pagarão menos impostos para se arrecadar mais.

Toda crença tem um núcleo mínimo de objetividade para sustentar a magia. Essa, no caso, se alimenta da certeza de que a sociedade, mais do que o Estado, sabe dar destinação virtuosa ao dinheiro.

Não discordo. Ocorre que é preciso saber como atravessar o deserto. Acreditar que Deus há de confortar o coração dos caminhantes ajuda bastante. Talvez dê para cumprir, sei lá, um terço do desafio.

Mas, se não houver água para hidratar os crentes, aí, bem..., além da convicção, é preciso acreditar também que haverá o milagre. Vai ter de brotar água da areia.

Até que menos impostos e corte draconiano de gastos não deem à luz crianças felizes, com escola, dentes e sem vermes, o que fazer com os barrigudinhos? Não dá para pedir mais sacrifício aos pobres, certo? Se não for por piedade, que seja por pudor.

Para que este texto não pareça uma daquelas alegorias de Carlucho, que fazem uma espécie de download de verdades reveladas de outro mundo, tentarei ser explícito: por enquanto, sem CPMF, pouco importa que nome tenha, não se cortam impostos.

Essa historieta tem moral: a crença não dispensa um cantil de água. O dinheiro vai sair de onde? A demissão de Cintra foi, assim, um fato duplamente diversionista.

Caiu porque não conseguiu ter um controle mínimo da Receita Federal. Ilustro: numa página intitulada “República de Curitiba”, no longínquo outubro de 2016, o então incontestável Deltan Dallagnol dava testemunho de sua força.

Respondendo à crítica de que abusos eram cometidos pela Lava Jato, mandou ver: “Somos treze procuradores, cinquenta técnicos do Ministério Público Federal, quarenta auditores da Receita e equipes numerosas da Polícia Federal, todos concursados e sem qualquer histórico de vida político-partidária. Todos fazem parte dessa ‘conspiração’?”.

Dispenso-me, a esta altura, de fazer considerações sobre “apartidarismo” e “conspiração” da turma. Eis aí o que chamei desde sempre de “Papol” (Partido da Polícia).  Os tais auditores respondem à Lava Jato. Obedecem a Moro, o verdadeiro chefe da força-tarefa, não ao secretário da Receita.

Cintra caiu porque não conseguiu desmontar o “bunker” moro-lavajatista no órgão. Era um seu refém. Esse pedaço do Estado, também ele, tem de voltar ao controle democrático. Quem vai substituir o demitido? Não sei. A imprensa, esse ente que só atrapalha os varões de Plutarco, tem de ficar atenta.

É preciso avaliar se a pessoa em questão servirá à República ou aos interesses privados do clã Bolsonaro. O certo é que a queda de Cintra, em si, não é má notícia.

E a CPMF não tem nada com isso. Continua nos planos de Guedes, que não vai cair.

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