Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

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Renata Mendonça

Para desespero do pai, filha era a única de 18 filhos a jogar bola

História é contada no filme "Radar! Um Time! Uma Nação!", sobre pioneiro time feminino

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Dizem que o sonho de qualquer pai é ter um filho para jogar futebol. Mas quando a gente diz filho aqui é no sentido mais literal e específico da palavra, porque filha, nesse caso, não serve.

Ao menos essa era a visão de qualquer homem há algumas décadas (e que infelizmente prevalece em muitas famílias até hoje). 

Agora você imagina um homem que teve 18 filhos na década de 1970, em plena ditadura militar, descobrindo que o único deles que era realmente apaixonado pela bola era uma menina.

Elenco da seleção brasileira feminina de futebol que tinha como base o rime do Radar, um das primeiras equipes de futebol feminino que se tem notícia, na década de 1980
Elenco da seleção brasileira feminina de futebol que tinha como base o rime do Radar, um das primeiras equipes de futebol feminino que se tem notícia, na década de 1980 - Divulgação/Cinefoot

Iracema Ferreira, conhecida como Rata, vivia com ela nos pés, contrariando as ordens da família e a lógica da sociedade da época. 

Futebol não era coisa "de menina" —era, inclusive, proibido por lei para mulheres naquela época—, e a garota insistiu tanto que acabou expulsa de casa aos 12 anos de idade por causa disso.

Rata se viu sozinha morando na rua durante a adolescência, sem rumo e desejando a morte do pai para que ela finalmente pudesse viver livremente seu sonho de jogar futebol. 

Mas felizmente isso não precisou acontecer.

Em 1981 foi fundado o Radar Esporte Clube, um dos primeiros times de futebol feminino de que se tem notícia no Brasil.

Começou com uma peneira para selecionar mulheres para a equipe que jogaria na praia em Copacabana. 

Depois, elas migraram para o campo e se tornaram o time mais vencedor da história do futebol das mulheres por aqui. Foram seis títulos nacionais, outros seis estaduais e mais seis sul-americanos. 

Foi ali que Rata pôde finalmente se realizar na vida, ainda que à revelia de toda a sua família.

Só que houve um dia em que a garota precisou voltar às suas origens para dar continuidade àquele sonho. 

Aos 17 anos, Rata integraria o elenco que viajaria para Chile e Estados Unidos para disputar a primeira competição internacional representando o seu país.

Por ser menor de idade, a menina não poderia sair do Brasil se não tivesse autorização por escrito de seus responsáveis legais.

Ela não achou que sobreviveria àquele reencontro. Ao lado de Eurico Lira, diretor do Radar Esporte Clube e responsável pela equipe que representaria a seleção, voltou à casa dos pais com a certeza de que apanharia muito daquele que a tinha expulsado de casa cinco anos antes justamente por causa do futebol. 

Nervosa, com as mãos trêmulas, sem conseguir falar direito para o pai o que a trazia de volta ali, Rata viveu naquele momento sua maior conquista: o reconhecimento em forma de abraço. 

Naquele dia, o pai de Rata entendeu a dimensão do que a sua filha e aquelas mulheres do Radar Esporte Clube estavam fazendo. Elas estavam mudando a história. 

O homem que um dia havia colocado sua própria filha para fora de casa por achar que ela era uma vergonha para a família viu a partir dali naquela menina o seu maior orgulho. Virou o maior fã de Rata, acompanhou cada passo que ela deu no campo e torceu muito a cada jogo. 

"Você é o filho que eu sempre sonhei em ter", foi o que o pai disse a ela um dia. O futebol, que um dia os separou, agora voltava para reuni-los de novo para sempre.

São histórias assim que mereciam ter sido contadas há muito tempo. 

E que serão exibidas de maneira brilhante no CineFoot, que começou nesta semana. "Radar! Um Time! Uma Nação!" estará nas telonas de Rio de Janeiro (8/9), Belo Horizonte (12/9) e São Paulo (14/9) nos próximos dias.

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