Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Renata Mendonça

Marta vai virar estátua ao lado da de Pelé no Museu da Seleção Brasileira

Conversa com o presidente da CBF sobre futebol feminino mostra mudança de mentalidade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Chega a ser curioso participar de um almoço na Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A etiqueta ali manda esperar o presidente chegar para que, depois dele, todos possam se servir.

Nos últimos anos, algumas intrusas apareceram para transformar o ambiente. As "regras de conduta" permanecem, mas, se antes apenas homens de terno debatiam os próximos passos do futebol, agora a cena começa a ter mulheres —algumas de terno, outras de jeans, nenhuma de salto— compartilhando a mesa.

Se não a mesa, ao menos o restaurante. Na espera pela definição de onde sentar no almoço da alta cúpula da CBF, me juntei a elas.

Há quórum para uma mesa feminina completa. Nem todas estavam presentes, mas um ano atrás não haveria nenhuma mulher nesse ambiente. Hoje, são pelo menos oito: Pia Sundhage, Bia Vaz e Lilie Persson (técnica e auxiliares da seleção feminina principal), Duda Luizelli e Aline Pellegrino (coordenadoras de seleções e de competições femininas), Jéssica Freitas (auxiliar da sub-20), Simone Jatobá e Lindsay Camila (técnica e auxiliar da sub-17).

O dia terminaria com um longo papo com Rogério Caboclo sobre futebol feminino. Quem diria que um presidente da CBF se prestaria a passar uma hora falando “só” da parte que sempre foi considerada “o limbo” na confederação.

A CBF ignorou a existência das mulheres no futebol por décadas. Hoje, com muitas exigências da Fifa, é verdade, esse cenário começa a mudar. Não a ponto de mexer no status quo —a confederação é formada por 14 diretores, oito vice-presidentes e um secretário, todos homens brancos. Mas, segundo Caboclo “há um plano a curto prazo para mexer nisso”.

Se, por enquanto, ele não quis detalhá-lo, ao menos a presença de Aline e Duda na entidade dão bons sinais. Pela primeira vez, o futebol feminino é comandado por mulheres. Para os defensores do "não importa o gênero, tem que ser competente", o óbvio nem precisaria ser dito. Competência é pré-requisito básico.

Como também deveria ser básico um tratamento igual da CBF para as seleções masculina e feminina. Não foi o que aconteceu nas últimas décadas.

“Algumas gerações podem ter deixado de ser desenvolvidas, porque a gente teve poucas competições”, admitiu o presidente, que também falou sobre a lacuna de um ano sem treinadores nas seleções femininas de base de outubro de 2018 a agosto de 2019. “Tem coisas que a gente tem que assumir como erro e fazer mudanças. Por isso, essas duas [Aline e Duda] estão aqui."

O primeiro passo para evoluir é reconhecer erros. E se até então a CBF não via por que investir no futebol das mulheres, hoje o mercado dá essa resposta. O Brasileiro feminino agora é patrocinado, e a seleção terá seu primeiro patrocinador exclusivo (o anúncio deverá ser feito neste mês).

Não há como marcas comprarem um produto que não está à venda. Quando CBF, federações e clubes percebem que futebol feminino é negócio e tentam vendê-lo, curiosamente aparece quem queira comprá-lo.

Marta de olhos fechados e com um cachorro no colo tem medidas do rosto tiradas
Marta em sessão para colher detalhes de sua expressão; jogadora terá estátua no Museu da Seleção Brasileira - Arquivo pessoal

A invisibilidade era tanta que, no chamado Museu da Seleção Brasileira, não havia praticamente nada sobre a feminina. Ainda não foi inaugurada a nova ala, que contará a história das mulheres que vestiram a camisa do Brasil. Quando isso acontecer, para coroá-la, uma estátua de cera de Marta será colocada ao lado da de Pelé (e de uma, também nova, de Zagallo). A Rainha e o Rei mostrando que o futebol brasileiro produziu os melhores de todos os tempos.

Uma estátua não vai apagar anos de descaso, mas pela primeira vez dá para sentir que o futebol feminino está em boas mãos. Das mulheres, que foram notadas e agora assumiram o comando.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.