Excepcionalmente, o assunto desta coluna não será futebol. Porque algumas urgências pedem passagem. O que está acontecendo com a atleta do badminton Jaqueline Lopes Lima é uma injustiça e um retrato de como, no esporte, mulheres são punidas por serem mães.
Uma das principais promessas da modalidade, Jaqueline atendia a todos os critérios para participar do Campeonato Pan-Americano de Badminton, que acontecerá neste mês na Guatemala. Ela, inclusive, foi convocada para a competição, crucial para a disputa por uma vaga olímpica —que será definida pela pontuação no ranking, e um bom resultado na Guatemala poderia ser definitivo para Jaqueline conseguir se classificar para Tóquio. A notícia veio a público pelo blog Olhar Olímpico, do jornalista Demétrio Vecchioli, no UOL.
No entanto, por meio de um comunicado, a Confederação Brasileira de Badminton (CBBd) afirmou que não pagaria as despesas da viagem da atleta para o torneio “em função de ter permanecido em inatividade por longo período e estar retornando às atividades, de forma gradativa, há pouco tempo”.
Jaqueline engravidou em março do ano passado, treinou até junho e sua filha nasceu em novembro. Quatro meses após o parto, assim que foi liberada pelos médicos, a atleta voltou aos treinamentos com foco na classificação para Tóquio. No entanto, sem participar do Campeonato Pan-Americano, ela fica praticamente sem chances de vaga.
A coluna questionou a CBBd sobre a avaliação feita —a distância, sem qualquer acompanhamento presencial de treinos da atleta— para concluir que ela não estaria apta a competir.
"Isso foi baseado no período de inatividade da atleta (8 meses) e da necessidade de retorno gradativo, para que não tivesse problemas de lesão e pudesse competir em alto nível. Na avaliação da comissão técnica da Confederação Brasileira de Badminton, o tempo de preparação não é suficiente para a atleta retornar no nível que a competição exige", disse a entidade.
“Caso a atleta opte em participar, a mesma deverá assumir todos os custos dessa participação e também todas as responsabilidades referentes aos aspectos físico, saúde e segurança referente ao Covid-19. A CBBd define que a não participação da atleta neste momento é a opção mais adequada e segura, preservando a atleta para o futuro, pois a mesma faz parte da equipe da CBBd, visando o ciclo 2024", completou.
Quer dizer, não é que a confederação proíba Jaqueline de disputar o torneio. Ela “só” não vai arcar com os custos da atleta para competir. Nem com a responsabilidade pela saúde dela, pelos testes de Covid e todas as precauções que serão tomadas com todos os outros atletas. Mas se Jaqueline quiser ir, ela vai —por sua conta e risco, literalmente.
Essa é uma forma, infelizmente, tão cruel quanto comum no tratamento de atletas que tentam retornar às atividades normais após a maternidade.
Não bastassem os obstáculos físicos, psicológicos, financeiros (os gastos aumentam e, muitas vezes, é preciso contratar uma babá para a mãe poder treinar, como é o caso de Jaqueline) da maternidade, a atleta ainda tem que enfrentar as barreiras criadas pela própria confederação. Curiosamente, treinador, coordenador técnico, coordenador de saúde e presidente da CBBd, que assinam o comunicado, são homens. Maternidade não é uma questão na vida deles.
Ter períodos de inatividade não é incomum na vida dos atletas. Quando se lesionam, eles precisam ficar um tempo parados até poderem voltar às atividades normais, retomar a forma física e o nível de competição. Mas se a eles não for dada a chance de voltar a competir, não há como recuperarem a performance. Jaqueline está vendo seu sonho olímpico ser podado por uma confederação que nega a ela condições básicas para participar de um campeonato.
O que as atletas pedem não é privilégio, é oportunidade. Elas só querem a chance de poder seguirem seus sonhos como atletas, mesmo após a maternidade.
O mínimo que Jaqueline precisava ter da CBBd era apoio para que pudesse tentar a vaga em Tóquio 2020/2021. Em vez disso, veio um “contamos com ela para 2024”.
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