Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

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Descrição de chapéu LGBTQIA+

Posicionamento vazio da CBF mostra que homofobia é respaldada no futebol

Não adianta fingir ser contra todo tipo de preconceito enquanto não faz nada para combatê-lo

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"Sua liberdade acaba onde começa a liberdade do outro". Não haveria forma mais simples para se explicar o óbvio para preconceituosos que insistem em lutar pelo "direito ao preconceito". Foi o caso do jogador de vôlei Maurício Souza, que tanto repercutiu estes dias.

O início de tudo foi um post com a imagem de um beijo gay envolvendo o Superman: "É só um desenho, não é nada demais. Vai nessa que vai ver onde vamos parar".

Os posts subsequentes de Maurício, pedindo "desculpa", imputando sua demissão do Minas à "turma da lacração" e divulgando a imagem do Superman beijando a Mulher Maravilha reverberaram muito no meio do futebol. Muitos jogadores apoiaram o atleta do vôlei. O episódio virou tema de uma pergunta na coletiva do técnico Tite, e a resposta evidencia o quanto o futebol se omite quando o assunto é homofobia.

"A CBF soltou ontem um comunicado que retrata bem o que a gente pensa. Diz assim: todos iguais. A CBF faz campanhas já há mais de uma década em relação a isso, defende o esporte solidário, então cores, origens, crenças, gêneros, condições físicas, isso não tem que existir", afirmou Juninho Paulista, coordenador da seleção masculina, sem nem sequer mencionar as palavras "homofobia" ou "orientação sexual", que eram o objeto da pergunta.

Quatro homens dando entrevista sentados à mesa; atrás deles, fundo azul com símbolo da CBF
Convocação da seleção brasileira na última semana, com o técnico Tite e Juninho Paulista ao centro da mesa - Lucas Figueiredo - 29.out.21/CBF

Se a CBF lutasse tanto por esse ambiente livre de preconceito, será que em 2021 nós já não teríamos jogadores falando abertamente sobre homossexualidade? Será mesmo que não há no universo de mais de 20 mil jogadores que atuam nas Séries A, B, C e D do futebol brasileiro nenhum homossexual?

O primeiro passo para resolver um problema é reconhecê-lo, e a CBF nem isso faz. Dá respostas vazias e também não é clara sobre a postura que tomará diante do fato de que um funcionário da própria seleção masculina (filho do técnico Tite) manifesta apoio a postagens preconceituosas contra mulheres e gays nas redes sociais.

Seria mais honesto e corajoso da parte de Juninho e de Tite admitir que o futebol ainda não aprendeu a lidar com casos de homofobia. Que, assim como a sociedade é intolerante com pessoas homossexuais, o futebol reflete muito dessa intolerância e precisará mudar para criar um ambiente acolhedor, onde jogadores gays não precisem mais viver dentro de um armário.

Fingir que "somos contra todo tipo de preconceito" enquanto não faz nada para combater a homofobia é o mesmo que respaldá-la.

Aliás, respaldo é uma coisa que preconceituosos encontraram no Brasil desde 2018. Se antes as pessoas tinham algum receio de manifestar sua homofobia ou misoginia, com Jair Bolsonaro elas têm um presidente chancelando seu "direito ao preconceito".

Um homem que dizia "prefiro ter um filho bandido a ter um filho gay" e "não te estupro porque você não merece" foi eleito. É fácil entender por que Maurício Souza se sente livre para ser homofóbico usando a muleta da "liberdade de expressão" com a certeza de que sairá impune —e de que seguirá jogando.

Eu não teria essa mesma certeza porque, ainda bem, os tempos são outros. Maurício foi demitido pela pressão de patrocinadores que, por sua vez, foram pressionados por quem não aceita mais preconceito. Respaldo, infelizmente, ele ainda tem dos tais milhões de seguidores no mundo virtual. Mas no mundo real, ainda prevalecem os bons —e se Maurício estivesse disposto a entender a essência desse Deus que ele tanto defende, saberia que Ele jamais condenaria qualquer forma de amor.

Se a sua opinião oprime, mata, ou limita o direito de existir do outro, você não é livre para expressá-la. É crime.

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