Renato Terra

Roteirista e autor de “Diário da Dilma”. Dirigiu o documentário “Uma Noite em 67”.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Renato Terra

Por que Neymar nos incomoda tanto?

A seleção é a projeção das nossas maiores qualidades. Neymar precisa embarcar nessa.

Enquanto a bola rola, de quatro em quatro anos, não é o poder econômico, religioso ou bélico que impõe respeito. Chapados pelo coletivo efeito lisérgico da Copa, somos plugados num realismo fantástico em que o Brasil é o gigante imperialista. Mais do que isso: nossa maneira de dominar o mundo é quase uma utopia.

Alemães carregam o fardo de um futebol pragmático, sem brilho. Argentinos misturam faíscas de encanto com malandragens pueris, como a água batizada que ofereceram para o nosso Branco na Copa de 90.

Em alguns momentos, o encanto e a malandragem se fundem, como no gol de mão de Maradona. Italianos são retranqueiros. Uruguaios vivem de ecos do passado.

Ilustração
Débora Gonzales/Folhapress

No G5 das seleções com mais de um título mundial, somos o exemplo a ser seguido: vencemos, dominamos, encantamos. Jogamos numa base coletiva, bem arrumada, que abre espaço para iniciativas e lampejos individuais. Somos pretos, brancos, mestiços. Marta fez mais gols que Pelé. Tudo isso embalado com ousadia e alegria.

Quando a bola rola, tudo é ressignificado. A jogada que culminou com o gol de Carlos Alberto na final da Copa de 70 é nossa Capela Sistina. A poesia de Garrincha é tão relevante quanto a de Fernando Pessoa. A bomba de Branco contra a Holanda em 94 é nossa Guernica. Rivaldo é nossa escultura de Giacometti que desvia da bola para o gol de Ronaldo em 2002.

Dentro de campo, numa Copa do Mundo, a seleção é muito diferente de nosso país. Ali no gramado, estão potencializadas todas as nossas qualidades.

Ali, o Brasil é quase uma projeção do que gostaríamos de ter sido como nação. Está ali a palavra nova que queremos dar ao mundo.

Por isso, Neymar nos incomoda tanto. O craque tem as credenciais para fazer parte dessa projeção coletiva. Mas insiste em simulações, exageros, chistes. Tudo o que brasileiro não quer. Não em uma Copa do Mundo.

Ainda dá tempo do Neymar se conectar nessa atmosfera e se colocar à altura da seleção em Copas do Mundo.

E fica aqui um apelo: pelo amor de Deus, vençam a Bélgica e nos mantenham sedados por mais tempo. Não temos estrutura para lidar com o Temer novamente.

Contador

Lá se vão 114 dias sem saber quem matou Marielle.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.