Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Descrição de chapéu

Idiotas úteis e inúteis

Uma pessoa tenta apontar a burrice dos outros e acaba por revelar a sua

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Quando o presidente Bolsonaro disse que os manifestantes que protestavam contra os cortes na educação não sabiam quanto era 7 vezes 8 nem qual era a fórmula química da água, um importante e difícil debate foi lançado. 

Creio que só há duas hipóteses: ou o presidente está certo e, por isso, os cortes na educação são errados; ou o presidente está errado e, por isso mesmo, os cortes na educação são errados. Seja de que maneira for, cortar na educação não parece ser uma opção correta. 

Eu explico. Se os manifestantes não sabem de multiplicação nem de química, isso demonstra a absoluta necessidade de investir na educação, em vez de cortar. 

Se, pelo contrário, eles são capazes de fazer contas e determinar o número e o tipo de átomos que constituem uma molécula, então são pessoas instruídas e, por isso, em princípio as suas opiniões sobre educação são válidas, o que significa que cortar na educação é errado. 

Ilustração
Luiza Pannunzio/Folhapress

Eis, em resumo, o problema: se eles são burros, precisam de educação; se não são burros, a sua opinião deve ser tida em conta. Ou seja, quem acusa os que se manifestam contra os cortes na educação de não saberem de matemática e de química é uma pessoa que não sabe de filosofia. E, portanto, o sistema de ensino também o deixou mal preparado. O que significa, novamente, que é preciso investir mais em educação. 

Parece ser um caso de justiça divina: uma pessoa tenta apontar a burrice dos outros e acaba por revelar a sua.

Além dessas considerações, Bolsonaro acrescentou ainda que os manifestantes eram idiotas úteis. Também não terá sido a melhor ideia. 

Todo o mundo tolera os idiotas úteis —que são, aliás, o melhor tipo de idiota. Os idiotas inúteis, pelo contrário, geram muito menos simpatia, uma vez que juntam a inutilidade à idiotice. 

Mas os idiotas úteis obtêm um certo tipo de redenção porque, sendo idiotas (uma circunstância infeliz da qual, em princípio, nem têm culpa), têm um préstimo. 

Se quiséssemos estabelecer uma hierarquia entre espertos úteis, espertos inúteis, idiotas úteis e idiotas inúteis, os idiotas úteis ocupariam um honroso segundo lugar, atrás dos espertos úteis mas à frente dos espertos inúteis, que, sendo embora espertos, não nos ajudam em nada.

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