Eu estava a ler o jornal quando, sem qualquer aviso prévio, apareceu “Sorvete malvado machuca cantora milionária”. Na verdade, o título da notícia não era esse. Mas devia, porque foi o que se passou.
A cantora Demi Lovato, de 28 anos (digo a idade para esclarecer quem não a conheça e possa pensar que se trata de uma criança), entrou numa loja de sorvete e viveu uma experiência de tal forma traumática que teve de ir de urgência ao Instagram, onde escreveu: “É extremamente difícil comprar sorvete na loja The Big Chill quando temos de passar por inúmeros biscoitos sem açúcar e outros produtos dietéticos antes de chegar ao balcão”.
Pensando que teria uma tarde tranquila, Lovato entrara naquela loja sem saber que iria ser barbaramente agredida por letreiros. Uns diziam: “Sem glúten”. Outros, ainda mais perversos, anunciavam: “Sem açúcar”.
A loja, tendo provavelmente consciência do que tinha feito, pediu desculpa (juro) a Demi Lovato, mas o desaforo tinha sido demasiado grande e então ela acrescentou, nas suas redes sociais, que toda a experiência de tentar adquirir sorvete tinha sido horrível e causadora de dor emocional.
Cineastas de antigamente que quisessem explorar os medos da plateia tinham de recorrer a aranhas, cobras, assassinos em série, vampiros, mortos-vivos. Agora, em princípio, é mais fácil transtornar o público. Anseio por um bom filme de terror sobre sobremesas.
Quando se fala de liberdade, há sempre alguém que, muito solícito, avisa: “Sim, mas é importante não esquecer que a sua liberdade termina onde a minha começa”.
É uma frase muito curiosa, até porque não significa nada. Quem a profere não costuma fornecer informações acerca do modo como esse princípio poderia ser posto em prática.
Ora, estamos perante um bom exemplo. Demi Lovato considera que a liberdade de uma loja de sorvetes, que quer ter determinados produtos, colide com a liberdade dela, que quer andar por uma loja sem ser confrontada com a existência de determinados produtos.
É um problema difícil, mas talvez haja uma solução de compromisso: a loja mantém seus produtos para diabéticos e celíacos mas, quando a Demi Lovato quiser entrar, todos os letreiros ofensivos já foram
cobertos por uma equipe de capacetes azuis da ONU, chamada previamente para manter a paz e a saúde de todos.
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