Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira
Descrição de chapéu

Deus devia ter deixado na Terra um síndico para apresentarmos queixas

Pequenas falhas da criação merecem conserto, como os terremotos, tsunamis e meu joelho esquerdo

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Como suponho que saibam, eu não sou onipotente. No entanto, mesmo com as minhas naturais limitações, procurei criar para as minhas filhas um mundo em que elas possam viver com o máximo de segurança possível. Não sei se percebem aonde quero chegar.

Por que é que Deus, sendo onipotente, não fez o mesmo pelos seus filhos? De vez em quando, um terremoto arrasa uma cidade. Outras vezes, um tsunami dizima populações inteiras. Bem sei que eu nunca criei um universo e que é fácil estar de fora a criticar. Mas me parece inegável que o planeta tem
falhas estruturais graves
.

Ilustração de duas mãos se aproximando com os indicadores quase se encostando. Uma mão foi desenhada com linhas pretas e preenchimento branco e a outra com linhas pretas e preenchimento vermelho.
Luiza Pannunzio/Folhapress

Não me interpretem mal: sou sensível ao fato de a gente não pagar aluguel. E, como todo o mundo que já teve de lidar com obras, registro com muito agrado que uma empreitada deste tamanho tenha ficado pronta em apenas seis dias.

Só acho que talvez devesse ter sido considerada a hipótese de deixar na Terra um síndico a quem nós pudéssemos apresentar algumas queixas sobre pequenas falhas da criação que merecem
conserto, como os já referidos terremotos, tsunamis e também o meu joelho esquerdo.

Essa questão ficou conhecida na filosofia como o problema do mal: será possível conciliar a ideia de um Deus onipotente e onibenevolente com a existência do sofrimento e do mal?

O tempo gasto na concepção e produção em massa das cobras e dos mosquitos, por exemplo, não teria sido mais bem aplicado na criação de um mundo em que ninguém sofresse? É um problema filosófico interessante.

Eu, no entanto, tenho menos interesse em filosofia do que em construção civil e tenho me dedicado a refletir sobre a razão pela qual o mundo é tão rijo.

Digamos que queremos criar um mundo. Não acho mal que seja redondo e teria votado favoravelmente à Lei da Gravidade. Mas pergunto: não teria sido possível fazer um mundo um pouco mais mole?

Quando era pequeno, usava botas ortopédicas (para corrigir mais um problema estrutural), caía muitas vezes e me machucava. Creio que teria sido fácil conceber um mundo todo feito com a tecnologia de um sofá.

Se a ausência de mal é pedir demais, ao menos a presença de umas almofadas era simpática. Parece-me que não estamos perante um mundo de luxo. Não lhe daria mais de três estrelas e meia no TripAdvisor.

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