Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ricardo Araújo Pereira

O guarda-roupa, e não os apetrechos tecnológicos, é o melhor do arsenal do 007

Não tenho utilidade para um carro que dispara mísseis, mas compraria um smoking que não se amarrota

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Antes de cada aventura, o 007 passa na oficina, para que um cientista que nasceu muito tempo antes de haver tecnologia avançada o apetreche com tecnologia avançada. Os zingarelhos que lhe oferecem fazem truques incríveis, mas não são os instrumentos mais impressionantes do arsenal de Bond.

Onde eu gostaria de o ver era no alfaiate. Porque eu não tenho utilidade para um carro que dispara mísseis pelos faróis (embora me apeteça metralhar outros motoristas quase todos os dias), mas seria comprador de um smoking que não se amarrota depois de ter sido usado sob um traje de mergulho e de uns sapatos que permitem correr nos telhados dos prédios da Cidade do México.

Ilustração mostra dois homens sem rosto. Um veste terno preto, o outro se posiciona atrás do primeiro e mede sem ombro com uma fita métrica.
Luiza Pannunzio

Bond comete façanhas atléticas com a mesma roupa de gala com que eu tenho dificuldade em não escorregar num tapete. Isso é que me fascina, não um relógio que dispara raio laser. É fácil entender que o mundo é muito diferente num filme do James Bond. E isso é bom. Ficamos preparados para suspeitar quando nos querem convencer de que os vilões da vida real são como os inimigos do 007.

É por isso que ninguém acredita na lenda urbana do homem de negócios que encontra uma bela mulher num bar de hotel. Eles sobem ao quarto e no dia seguinte o homem acorda numa banheira, coberto de gelo, com uma cicatriz no abdômen. Ao lado está um telefone e um cartão com a mensagem: "Tiramos-lhe um rim. Ligue para o 112 rapidamente, ou acabará por morrer".

Vilões dos filmes talvez procedessem assim. Na vida real, nenhum bandido faria isto, evidentemente. Que cangaceiro seria suficientemente pérfido para traficar um rim, mas suficientemente íntegro para deixar o outro e ainda escrever uma simpática mensagem com instruções práticas? E quem se daria ao trabalho de encher uma banheira de gelo? Os autores acham que a gente não sabe quantos cubos são necessários para encher uma banheira?

Eu, quando tenho visitas em casa, já me vejo aflito para fazer seis ou sete gins-tônicas. Que mafioso, na preparação do golpe, teria a incumbência de comprar as 5.000 forminhas, enchê-las de água, colocá-las no freezer e aguardar uma hora e meia? É, em suma, uma péssima lenda urbana, descaradamente fantasiosa.

Além de que eu tenho 47 anos. Que uma bela mulher quisesse levar-me para um quarto de hotel já seria estranho. Que isso me custasse apenas um rim é completamente absurdo.

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