Roberto Simon

É diretor sênior de política do Council of the Americas e mestre em políticas públicas pela Universidade Harvard

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Descrição de chapéu Coronavírus

Vírus espalha escândalos e expõe retrocessos da América Latina

Pandemia chegou enquanto avanços recentes na luta contra a corrupção perdem força na região

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Na Bolívia, um escândalo de compras de respiradores levou à prisão do ministro da Saúde e chacoalhou o governo interino de Jeanine Añez.

Na Colômbia, mais de um terço dos governadores está sob investigação por suspeitas de superfaturamento na aquisição de equipamento médico. Um caso similar teria envolvido o vice-presidente e outras autoridades do Panamá.

No México e na Argentina, empresas misteriosas, pertencentes a gente bem conectada, levaram grandes contratos com agências de saúde.

Homem caminha em frente a grafite em que homem com equipamento de proteção desinfeta vírus com rosto do presidente Jair Bolsonaro
Homem caminha em frente a grafite de vírus com rosto do presidente Jair Bolsonaro - Sergio Moraes - 12.jun.20/Reuters

No Brasil, do Rio ao Pará, governos estaduais enfrentam acusações de fraude —no caso de Wilson Witzel, acompanhadas de um processo de impeachment.

Além da destruição humana e econômica, a pandemia está espalhando pela América Latina escândalos de corrupção. Não foi por falta de aviso.

Ainda em março, organizações como Transparência Internacional, BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) haviam alertado que o vírus criava um cenário de alto risco para desvios e malversação de dinheiro público na região.

Para responder à crise, governos estão sendo forçados a mobilizar, o mais rapidamente possível, enormes recursos em operações complexas —da importação de respiradores a pacotes inéditos de auxílio a cidadãos e empresas.

Mecanismos de controle não foram projetados para operar sob essa pressão. É um terreno perfeito a fraudes e desperdício de dinheiro público.

O que é ainda mais preocupante: a pandemia chegou enquanto os avanços recentes da América Latina na luta contra a corrupção perdem força e, em alguns casos —como o Brasil—, retrocedem.

Pelo segundo ano, realizamos, no Council of the Americas, em parceria com a consultoria Control Risks, o Índice sobre Capacidade de Combate à Corrupção (I-CCC), avaliando o poder das 15 maiores economias latino-americanas de detectar, punir e prevenir o problema.

Em vez de tentar medir percepções, impacto econômico ou níveis de corrupção, olhamos para 14 áreas que formam o ambiente anticorrupção de cada país —da independência e eficiência de tribunais e de agências de combate ao crime de colarinho branco até a qualidade de leis de financiamento de campanha, a regulação de lobby e a força do jornalismo investigativo.

A avaliação é feita usando dados públicos de organizações multilaterais e acadêmicas e por meio de um survey a especialistas em cada um dos países.

Se por volta de 2015 e 2016, a América Latina parecia avançar na luta contra a corrupção, agora a maior parte da região está estagnada. Apenas o Peru melhorou sua pontuação geral desde o ano passado.

O Brasil é um dos casos mais preocupantes, ao lado de Guatemala e Venezuela: a pontuação brasileira caiu 10% desde 2019, ainda que o país permaneça num patamar relativamente elevado no ranking (quarto lugar).

Os problemas brasileiros são conhecidos, como a decisão de nomear um procurador-geral “alinhado” ao governo, nas palavras do próprio presidente, ou as evidências de interferência na Polícia Federal.

A polarização tornou tóxico o debate sobre corrupção. E há um risco estrutural no horizonte: a fragilização da democracia, a base do estado de direito.

A América Latina é o novo epicentro global do vírus e, segundo o Banco Mundial, será a região com a maior contração econômica do mundo.

Provavelmente veremos mais escândalos nos próximos meses, minando a confiança em governos e na própria democracia. Só há uma saída do poço: soluções reais para melhorar a governança, incluindo a retomada da agenda anticorrupção.

As opiniões expressas acima não refletem necessariamente a posição do Council of the Americas.

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