Era só o que faltava. No vale-tudo da internet, a China, maior ditadura de todos os tempos, agora defende o direito de cidadãos seus à... liberdade de expressão.
Foi esse o argumento de Pequim ao protestar contra a derrubada de contas no Facebook e no Twitter que promoviam campanha de desinformação em relação aos protestos de Hong Kong.
Os posts representavam a opinião de estudantes chineses no exterior, que "obviamente têm o direito de expressar seu ponto de vista", disse Geng Shuang, porta-voz da chancelaria. Obviamente essa tal liberdade vale apenas para seus compatriotas que vivem no exterior e usam redes sociais americanas acessíveis aos moradores de Hong Kong, mas não aos da China continental.
A hipocrisia não é apenas chinesa. Do outro lado do Pacífico, o governo Trump manobra para mudar a legislação de modo a fomentar mensagens conservadoras nas redes. Com isso, a Casa Branca atenta contra o próprio espírito da primeira emenda à Constituição americana.
Já as plataformas, ao derrubar contas, abdicam do discurso na linha "não temos nada a ver com o conteúdo", que utilizaram por anos. É um avanço, mas insuficiente.
No caso chinês, o Twitter criou uma regra sob medida para atingir as TVs do regime de Pequim, mas não, por exemplo, a BBC. Deixar tamanho poder nas mãos das redes não vai melhorar a questão.
O melhor formato para defender a liberdade de expressão continua sendo o que regula as boas práticas cultivadas pelo jornalismo profissional: sem censura prévia e responsabilizando quem publica cada conteúdo, dentro da legislação vigente.
Quem pensa que dar ao sistema judicial a possibilidade de rastrear a origem de mensagens de WhatsApp ou posts no Facebook significa censura engana-se redondamente. Pelo contrário: esquivar-se desse caminho é justamente o que ameaça a liberdade de expressão, como a China sentiu na pele agora.
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