Rodrigo Tavares

Professor catedrático convidado na NOVA School of Business and Economics, em Portugal. Nomeado Young Global Leader pelo Fórum Econômico Mundial, em 2017

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Rodrigo Tavares

Bom Natal e Feliz 2121

Por que as empresas brasileiras não conseguem planejar a longo prazo?

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No dia de hoje nascerão 8 mil brasileiros. Com avanços na medicina, a sua expectativa média de vida pode chegar aos 100 anos. Será um século marcado pela crise climática, por pandemias globais, pela adoção de novos modelos econômicos, pela singularidade tecnológica.

Para que esses brasileiros possam resistir aos riscos sistêmicos que os afetarão e aproveitar as oportunidades planetárias que emergirão, os mais velhos precisam pensar a longo prazo sobre o futuro das novas gerações.

Mas continuamos a raciocinar de forma sincopada, a planejar em fragmentos, a decidir instantaneamente. CEOs têm metas trimestrais. Políticos planejam de acordo com as manchetes matinais. Funcionários de multinacionais pensam até à próxima avaliação de performance.

Em economias pobres e extrativistas como a brasileira, alicerçadas em sociedades com frágil proteção social e amalgamadas em torno de uma franzina determinação coletiva, pensar o futuro é um ato até quiçá ansiado, mas fisicamente desconfortável. É como plantar uma árvore num dia chuvoso.

Mas pensar exclusivamente de forma imediatista destrói valor. Só pensando a curto prazo é que podemos entender a política da Petrobras de desatentar-se para a transição energética em curso – de fontes emissoras de gás carbônico para soluções renováveis. Os seus concorrentes, Total, Equinor, BP, Shell, preparam-se para um mundo onde a energia é produzida preferencialmente por alternativas mais limpas. Mas a petroleira brasileira, ermitã, insiste que o futuro deve ser conjugado no pretérito perfeito.

Só pensando a curto prazo é que podemos entender a falta de investimentos da maioria dos frigoríficos brasileiros em carne artificial ou outros alimentos laboratoriais. O consumo desses tipos de alimentos cresce de forma galopante à medida que se solidifica a consciência ambiental dos consumidores ou crescem as suas preocupações com saúde. Gigantes dos alimentos como Kellogg e Cargill têm feito investimentos substantivos num ecossistema composto por centenas de startups (sendo a Impossible Foods e a Beyond Meat as mais conhecidas). Mas o capítulo “Visão de Futuro” do relatório anual da JBS é silencioso sobre as novas tendências tecnológicas do mercado.

E só pensando a curto prazo é que entendemos como é que os sucessivos governos brasileiros negligenciam o mercado de carbono. O país nem é protagonista na regulação de um mercado global de compra e venda de créditos de carbono nem se prepara para ser diretamente beneficiado, desperdiçando até US$ 10 bilhões ao ano, segundo o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.

Em 2015 o País de Gales aprovou a Lei do Bem-estar das Gerações Futuras. Única no mundo, obriga instituições públicas e privadas a pensar a longo prazo para proteger os interesses das futuras gerações. O parlamento britânico, por intervenção do Barão John Bird, um empreendedor social, deverá aprovar legislação semelhante em 2021.

A política brasileira é uma necrópole de planos, metas e promessas que se acumulam, se contradizem e se esquecem. Também é o país com maior incontinência legislativa do mundo. Adotar a versão brasileira da lei galesa não geraria qualquer mudança prática.

Mas do mercado financeiro brasileiro poderíamos ter mais expetativas. Há ótimos gestores e a racionalidade predomina. Mas a pressão de clientes irrequietos leva muitas casas a incorrer no pequeno lucro em vez de pensar a longo prazo para almejar melhor performance. O melhor exemplo é o mundo das finanças sustentáveis. Para conseguirmos sorver o valor ESG de um ativo financeiro, precisamos pensar a longo prazo. Só em horizontes mais longos é que os riscos sociais e ambientais que atingem as empresas podem ser mitigados e oportunidades podem ser alavancadas. Por exemplo, o MSCI EM ESG Leaders, índice que agrupa empresas com as melhores credenciais ESG em mercados emergentes, gerou um retorno anualizado de 7.3% a 10 anos, enquanto o benchmark não ESG não passou dos 4%.

Ainda assim, gestoras brasileiras continuam abraçando ESG apenas superficialmente e pensando no retorno imediato.

É isso que desejo para 2021. Que pensemos em 2121.

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