Rodrigo Tavares

Professor catedrático convidado na NOVA School of Business and Economics, em Portugal. Nomeado Young Global Leader pelo Fórum Econômico Mundial, em 2017

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As lições de Antônio, Guilherme, Fabio e Luiza para o Brasil

País tem bons exemplos de empresários, mas seus legados ainda não foram assimilados pelo mundo corporativo

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Os brasileiros Antônio Ermírio de Moraes, Guilherme Leal, Fabio Barbosa e Luiza Trajano têm algo em comum com o empresário português Rui Nabeiro, que celebra 90 anos nesta semana. Ou com Ofra Strauss em Israel e Curt Bergfors na Suécia. São “empresários cidadãos”, uma casta que acredita que a maximização do lucro deve estar alinhada com os interesses da sociedade e do meio ambiente.

Até falecer em 2014, Antônio defendeu uma agenda de transformação nacional baseada em princípios éticos. Guilherme, além de apoiar diversas organizações da sociedade civil, provou que é possível uma empresa de grande porte ter sucesso financeiro ao optar pela preservação ambiental. Fabio é o pai da banca sustentável e cofundador do primeiro fundo ESG no Brasil. Luiza é o nome mais cimeiro em empreendedorismo feminino.

Nos últimos anos, com a sustentabilidade corporativa e as finanças sustentáveis a povoarem as páginas de todos os jornais, poderíamos pensar que o legado de Antônio, Guilherme, Fabio e Luiza estaria finalmente reconhecido e internalizado. Afinal de contas, as multinacionais brasileiras fazem anúncios diários sobre sustentabilidade. Métricas de impacto social, planos para diminuir a pegada de carbono, ou estratégias para ter mais mulheres em cargos de liderança empanturram os press releases que recebemos no email.

Mas entre as mais de 20 milhões de empresas brasileiras, ainda escasseiam aquelas que são comandadas por “empresários cidadãos”.

Em muitos casos com legitimidade. São milhões os microempresários que vendem o almoço para comprar o jantar e a sua atividade empresarial limita-se a gerar recursos suficientes para ir adiando semanalmente a pobreza. A consciência social, se existir, está dentro de casa.

Para outros, a cidadania corporativa virou um post no Instagram. Uma reengenharia identitária temporária incentivada por aulas de yoga e pela leitura das cartas anuais do Larry Fink.

A falta de uma agenda corporativa de longo-prazo também estimula alguns empresários a buscarem a hiperpolitização —a necessidade de estarem alinhados com o poder em Brasília para daí extraírem valor económico, seja no formato de crédito, oportunidades de mercado, legislação favorável ou informação privilegiada. Aconteceu em todas as presidências, de Sarney a Bolsonaro.

Curiosamente, o que vemos com Bolsonaro —lendo todas as recentes retratações públicas e manifestos de empresários— é, aparentemente, uma incomensurável frustração com os desmandos na economia ou um exercício de autoproteção mediante a queda iminente. Mas o Bolsonaro presidente tem as mesmas características do Bolsonaro deputado, do Bolsonaro militar, do Bolsonaro marido e do Bolsonaro pai —é um ser desqualificado. Empresários ou banqueiros que tenham votado em 2018 no atual presidente, munidos de todas as informações sobre o seu passado, não podem ser considerados vítimas. Além de uma questionável avaliação econômica ou política, revelaram despreocupação com os interesses sociais ou ambientais do país.

Naturalmente, o Brasil tem bons exemplos de sustentabilidade corporativa. Dezenas de empresas brasileiras fazem parte de índices internacionais como o MSCI World ESG Leaders Index ou o Down Jones Sustainability Index. Mas essa é uma lista que se tem mantido curta e relativamente estática ao longo dos anos. Com cerca de 2 milhões de empresas brasileiras de médio e grande porte, a percentagem das que são reconhecidas pelo seu trabalho em sustentabilidade só é perceptível no microscópico.

O Brasil também conta com uma fervilhante comunidade de empreendedores sociais, onipresente em todos os estados, e composta por empresas criadas para gerar impacto positivo na sociedade. A ubiquidade dos problemas sociais no país associada à inventividade brasileira tem incubado negócios sociais reconhecidos internacionalmente. É uma realidade coberta nas páginas desta Folha pela coluna Rede Social e pelo Prêmio Empreendedor Social, realizado pelo jornal em parceria com a Fundação Schwab. Mas também aqui existem dificuldades: falta capital para escalar os negócios e são poucos os investidores especializados.

O legado do Antônio, Guilherme, Fabio e Luiza ainda não foi devidamente absorvido pelo mundo corporativo brasileiro. O sentido de compromisso nacional, o relativo distanciamento do poder e a estabilidade de posições ao longo de décadas são um património valioso que precisa ter mais herdeiros no Brasil.

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