Rodrigo Tavares

Professor catedrático convidado na NOVA School of Business and Economics, em Portugal. Nomeado Young Global Leader pelo Fórum Econômico Mundial, em 2017

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Rodrigo Tavares
Descrição de chapéu Folha ESG sustentabilidade

Deputado bolsonarista associa práticas de responsabilidade social à esquerda

Frederico D'Avila diz que agenda ESG engorda consultorias e prejudica a competitividade das empresas

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O deputado estadual paulista Frederico D’Avila (PSL) é um fiel apóstolo do bolsonarismo. No seu Twitter, beatifica a Polícia Militar, associa as pessoas “malditas” de esquerda ao “terrorismo”, apela à restauração da pena de morte, messianifica o ex-ministro Ricardo Salles e critica ESG. A amizade de Frederico com Jair e Ricardo precede as eleições de 2018.

Sobre ESG, o deputado tem, nas últimas semanas, incendiado as redes sociais ao afirmar que é uma prática de ativistas de esquerda, que engorda consultorias e prejudica a competitividade das empresas.

Numa primeira leitura achei curioso que ESG é repetitivamente descrito com características antropomórficas, como se fosse uma criatura tangível com vontade emancipada (“o ESG”). Numa segunda reação, analisei o que tem escrito o deputado e aqueles que o inspiram. Numa terceira reação, convidei Frederico D’Avila para dar a sua opinião nesta coluna (ver entrevista embaixo), ao mesmo tempo que eu daria a minha.

Homem branco sentado gesticula enquanto fala; ele veste camisa social azul em tom pastel
Frederico D'Ávila - Gabriel Cabral - 26.abr.18/Folhapress

Nas escolas de negócios e no mercado, dados, práticas e políticas ESG são vistas de três formas: métricas adicionais que permitem a investidores avaliar risco com mais precisão (“a empresa tem mecanismos de prevenção de corrupção?”); oportunidades para destravar valor financeiro (“a reciclagem de resíduos e materiais numa empresa poderá levar à redução de custos?”); ou, em menor escala, são ferramentas para gerar intencionalmente impacto social ou ambiental positivo (“em que empresas posso investir para melhorar a educação de uma comunidade?”).

Em todas estas alternativas, o desígnio é otimizar a competitividade e aumentar o valor das empresas. O capitalismo, sempre em constante aprimoramento há centenas de anos, encontrou novas ferramentas para maximizar lucros.

Lucro? Sim. Um meta-estudo recente da Universidade de Nova York e da Rockefeller, que analisou 1.141 artigos acadêmicos publicados ao longo dos últimos cinco anos, mostrou que em 58% deles foi provada uma correlação positiva entre ESG e performance financeira (apenas 8% deles mostrou uma relação negativa).

Sob este prisma, o deputado erra ao ver ESG apenas como uma prática de “ativismo social”, como “socialismo empresarial” ou como um “custo anacrônico para as empresas.”

É, ainda assim, importante salientar que não há consenso universal em torno de ESG. Ainda bem. O contraditório é fundamental para o avanço da razão e da estética. Louis Pasteur enfrentou a oposição acadêmica de Antoine Béchamp, Beethoven foi desafiado ao piano por Daniel Steibelt e a teoria da relatividade de Einstein foi contestada por Arthur Patschke, um herói do movimento ocultista alemão.

Mas o deputado seleciona as poucas vozes dissonantes, sobrevaloriza o reducionismo das amostras e amplifica medos e preconceitos para daí justificar a sua xenofobia intelectual em formato de alertas públicos. Não vê as coisas como elas são, mas como ele é.

Um exemplo:

Entre os milhares de professores de finanças, o deputado seleciona apenas um deles, Aswath Damodaran, da Universidade de Nova York, conhecido pela sua visão refratária à sustentabilidade, para justificar a sua incredulidade. A opinião de centenas de acadêmicos com uma visão favorável a ESG é irresponsavelmente negligenciada.

Em webinars e eventos, Damodaran tem afirmado que ESG é um conceito que se sustenta apenas pelo marketing e pela comunicação e tem um frágil embasamento científico.

Segundo ele, não existe correlação entre investimentos em empresas sustentáveis e maior rentabilidade para investidores. Música para os ouvidos do deputado.

Mas Damodaran tem obra acadêmica extensa e em alguns estudos ele demonstra que investimentos em empresas que têm boas práticas de sustentabilidade, sem que o mercado tenha ainda precificado esse valor ou investimentos em empresas que estão no início da sua jornada da sustentabilidade, podem, de fato, levar a retornos maiores para investidores (“Valuing ESG: Doing Good or Sounding Good?”). Ou seja, ganha mais dinheiro o investidor que primeiro se engajar com as empresas para ajudá-las a se tornarem mais sustentáveis.

Damoram cita um estudo no qual os benefícios do engajamento ativo são demonstrados (“Coordinated Engagements”). Tudo aquilo que o deputado não quer ouvir.

ESG é ensinado em escolas de economia, não a alunos de ciência política. É apolítico, apartidário e sem ideologia. É incompreensível como uma simples prática corporativa, que não altera o fundamento mais básico do capitalismo (ganhar dinheiro), pode semear tanta celeuma.

Mesmo se ensaiássemos politizar as práticas ESG, não seria razoável argumentar –se considerarmos que metade do mercado global de capitais investe recursos sob uma ótica ESG– que esses agentes capitalistas sejam, na verdade, “comunistas” ou de “esquerda”.

Henry Paulson, James P. Gorman ou Brian Moynihan, patriarcas de Wall Street e apoiantes de práticas ESG, são filiados ao Partido Republicano, de direita.

França, Noruega e Reino Unido, três países que lideram a agenda ambiental na Europa, são comandados por governos também de direita. O conservador Benjamin Netanyahu, outra fonte de inspiração do deputado, tornou Israel o centro mundial de tecnologia ambiental.

Frederico D’Avila é conservador, monarquista e ruralista. Nenhuma destas características deveria pré-determinar a sua visão sobre ESG.

Só ativistas de esquerda se interessam por ESG? Por que ESG não é praticado por conservadores ou liberais de direita?

O melhor serviço social que um empresário pode fazer é empregar.

Índices de liberdade econômica pelo mundo, como o atualizado anualmente pela Heritage Foundation, comprovam que as nações com menos burocracia e impostos, têm as populações mais ricas. Isto influencia a sustentabilidade, visto que a pobreza aumenta a degradação ambiental. Caso não acredite, experimente visitar uma de nossas tantas comunidades mais pobres, e verá lixões a céu aberto, córregos e rios altamente poluídos além de uso e ocupação do solo desordenados.

Por sua vez, pacotes burocráticos e anacrônicos com a natureza humana, como o ESG, caracterizam obstáculos para a economia e assim, inevitavelmente aumentam o desemprego e a pobreza. Porém, não é como se os ativistas do ESG não soubessem disso, pois não são os humanistas que dizem ser, mas verdadeiros militantes fissurados em encontrar pretextos para se infiltrar em todas as instituições da sociedade, controlá-las e fazer papel de “bom-moço”.

E evidentemente, com o ESG conquistarão um poder enorme: poderão tanto difamar determinadas empresas quanto beneficiar outras, o que configura, além de tudo, uma interferência –danosa, como sempre– na competividade. E quanto menor a competição e maiores os custos, maiores serão os preços finais para os consumidores. Como se vê, é interminável a extensão da catástrofe econômica que o crescimento do ESG causará, especialmente em países subdesenvolvidos como o Brasil.

O senhor tem criticado muito as práticas ESG e, para isso, tem se apoiado em duas pessoas: o presidente do Instituto Mises Brasil, Hélio Beltrão, e o professor da Universidade de Nova York, Aswath Damodaran. Qual é a sua relação intelectual com eles? Por que concorda com a visão de ambos sobre ESG?

Nós três concordamos com que Milton Friedman já alertava nos anos 1970: que as medidas regulatórias desse ‘’socialismo empresarial’’, beneficiam unicamente os seus reguladores e consultores, em detrimento do restante da sociedade, formada por empregadores, funcionários e consumidores.

As grandes empresas já possuem departamentos de ‘’sustentabilidade’’ e de ‘’diversidade social’’, que além de gerarem custos que não produzem um dólar de resultado, dão oportunidades para pessoas desqualificadas usurparem o lugar daqueles realmente talentosos e dedicados –como no caso da nomeação dessa Anitta para o conselho da Nubank. É ridículo, para não dizer trágico.

Utilizando-se de uma suposta ‘’agenda social’’, a esquerda transformou o Estado nesse monstrengo perdulário, pantagruélico, endividado, ineficaz e agora, planeja fazer o mesmo com as empresas. É a evolução do “Welfare State” para o “Welfare Corporations”. Você já deve imaginar quem vai pagar essa conta.

O senhor tem alguma forma de demonstrar que o mercado de consultoria cresceu significativamente por causa da expansão do mercado ESG?

Pouco tempo atrás não víamos o ESG tomar os noticiários, mas agora estamos aqui conversando sobre ele.

Desde 2018 vigoram nada menos que 170 medidas regulatórias relacionadas ao ESG, número superior à soma dos seis anos anteriores. E como levantou a Bloomberg, de 2016 a 2021, a riqueza combinada das empresas classificadas pelo ESG saltou de US$ 20 para mais de US$ 35 trilhões, podendo ultrapassar US$ 50 trilhões até 2025. Ou seja: tudo indica que os consultores do ESG estão vivendo sua época de vacas gordas.

Inclusive, é comum que militantes esquerdistas enriqueçam vorazmente à medida que aumentam seu controle, sempre com fins políticos, sobre a sociedade. São mais gananciosos que os capitalistas que eles dizem detestar. A diferença é que não querem dividir suas riquezas com ninguém, apesar de pregarem exaustivamente isso.

Conheço muito defensor de ESG que anda de jato, carro blindado, segurança privada e mora em verdadeiras fortalezas nas cidades mais caras do país. Mulheres que não usam maquiagem nem tingem o cabelo são a favor do desarmamento civil e usam bijuterias de artesanato indígena, sempre “despojadamente” acompanhadas de um único adereço caríssimo, normalmente um brilhante ou relógio caro, comprado nas joalherias mais renomadas do mundo.

Tudo farol para inglês ver e passar uma imagem de “desprendimento”. É o máximo do ridículo, o cúmulo da hipocrisia.

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