Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rodrigo Zeidan

O mito dos gestores militares

Encher de militares o governo e elevar o orçamento das Forças Armadas vai acabar mal, de novo

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Treinados para a guerra, os militares vão conseguir derrotar seus inimigos na batalha pelo Orçamento: a população brasileira.

Hoje, o capitão está para continuar nossa grande tradição de ignorar os problemas reais e inventar inimigos imaginários, propondo um orçamento para a Defesa maior que para a educação.

Em 2018, o orçamento para a Defesa totalizou R$ 77 bilhões, dos quais R$ 67 bilhões foram executados. O governo de extrema direita não se fez de rogado, e, em 2019, com a economia crescendo 1% e a inflação baixíssima, o orçamento saltou para R$ 85 bilhões, dos quais R$ 75 bilhões foram executados, aumento de mais de 10%.

Pior: gastamos em tecnologia, manutenção e pesquisa? Não, 92% dos gastos são com pessoal da ativa e da reserva.

Tanto na época do golpe quanto no governo do capitão não há preocupação com a melhoria da economia ou real defesa do país, mas simplesmente uma busca por maiores soldos.

Lançamento do Riachuelo, o primeiro submarino da nova geração a ser adotada pela Marinha
Lançamento do Riachuelo, o primeiro submarino da nova geração a ser adotada pela Marinha - Cesar Sales - 14.dez.2018/Folhapress

Durante as três primeiras décadas do século passado, as Forças Armadas representavam 22% das despesas públicas. Obviamente, esse percentual aumentou durante a Segunda Guerra Mundial, com pico de 37% em 1942.

Em 1963, sem inimigos externos (a não ser imaginários), gastávamos 16% do orçamento dos ministérios com defesa nacional. Mas a ditadura avançou sobre os cofres públicos. Em 1965, os gastos com as Forças Armadas já tinham saltado para 22% do Orçamento total. Oito anos depois, no auge da megalonamia do “milagre econômico”, as Forças Armadas recebiam 44% do total despendido pelo governo federal; o Ministério da Educação ficava com 10%.

Infelizmente, como os militares saíram pela porta da frente e parte do governo coincidiu com o ciclo natural do processo de industrialização, inventou-se por essas bandas a ideia de um “milagre econômico”, de 1968-1973, no qual a economia brasileira teria crescido a 11% ao ano. Cresceu mesmo, mas no contexto do maior crescimento da história do sistema capitalista no mundo (8% ao ano) e através da formação da dívida externa, que afundaria o país por quase 20 anos.

Os militares nunca foram bons gestores da economia. Surfaram a onda do crescimento mundial, enquanto gastavam como bem entediam. E isso sem nenhuma preocupação com pobreza ou desigualdade social.

A dívida externa começou a crescer a 20% ao ano já em 1964. Pegaram um país com dívida de US$ 3 bilhões (14% do PIB e dois anos de exportações) e entregaram algo impagável (mais de US$ 100 bilhões, 45% do PIB e quatro anos de exportações). O golpe de mestre foi culpar a crise externa e o FMI (Fundo Monetário Internacional), empurrando a conta para os governos seguintes.

Mas a realidade é que os militares lideraram processo de crescimento baseado em pirâmide financeira —pegavam novas dívidas para pagar os juros das anteriores, até que, em 1980, o choque Volcker acabou com a farra.

Paul Volcker, chefe do Fed, decidiu, numa tacada, acabar com a inflação americana jogando os juros nas alturas (a taxa básica chegou a 20%). O Brasil foi pego com as calças arriadas. Sem crédito, não tinha como pagar os juros da dívida. Logo vieram o calote e a hiperinflação.

Infelizmente, não aprendemos com a história. Encher de militares, mesmo que da reserva, o governo e validar o aumento do orçamento das Forças Armadas vai acabar mal, de novo.

É hora de abandonar o mito: os generais não conduziram bem a economia no passado e nem hoje saberiam fazê-lo.

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