Rogério Gentile

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha, editor de Cotidiano e da coluna Painel e repórter especial.

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Descrição de chapéu Governo Bolsonaro Coronavírus

Bolsonavírus e o autoritarismo do sr. Twitter

Redes sociais têm sido pressionadas a adotar medidas contra discursos de ódio e fake news

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Bolsonaro é uma pessoa rudimentar, instável e inconsequente. Age por instinto, despreza o conhecimento científico e é invariavelmente beligerante e errático, características que o tornam incapaz de confortar e de liderar a sociedade brasileira num momento de extrema dificuldade como o atual.

Suas atitudes irresponsáveis durante a crise do coronavírus, ora menosprezando verbalmente a pandemia, ora ignorando as orientações sanitárias, agravaram, e muito, a sensação de desgoverno. Se já não bastasse a aflição, o sofrimento e a dor, o país está desorientado.

Dito isso, o Twitter não pode censurar o presidente do Brasil, eleito democraticamente com 57,7 milhões de votos. Bolsonaro tem o direito de dizer o que pensa e de defender o seu ponto de vista, mesmo que de modo inoportuno e insensato.

Os posts apagados por sabe-se lá quem na multinacional eram imagens do tour que o presidente fez no Distrito Federal, contrariando as recomendações do seu próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Nos vídeos, ele prega a substituição do isolamento social pelo isolamento vertical (apenas para idosos e portadores de doenças crônicas) e cita o uso de cloroquina para o tratamento da doença, embora isso ainda esteja em fase de testes, sem comprovação de sua eficácia.

Mas não cabe ao Twitter, tampouco ao Facebook e ao Instagram, que tomaram atitudes semelhantes, decidir o que o presidente da República pode ou não dizer nas redes sociais. A liberdade de expressão é uma garantia constitucional, ainda que não seja um direito absoluto. Todos precisam responder pelos seus atos, mas cabe ao Congresso Nacional e ao Poder Judiciário frear e, eventualmente, punir o presidente.

A Justiça, aliás, fez exatamente isso ao barrar a veiculação de uma campanha do governo federal que pregava que o “Brasil não pode parar”. Da mesma forma, é atribuição do Congresso analisar se Bolsonaro cometeu crime de responsabilidade ao atentar contra o artigo 196 da Constituição, que estabelece que a saúde é direito de todos e é dever do Estado garantir “políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças”. Crime de responsabilidade é passível de impeachment.

Nos últimos anos, as redes sociais têm sido pressionadas a adotar medidas contra a propagação de discursos de ódio e fake news. Mas uma coisa é reconhecer que muito pode ser feito para coibir a difusão de conteúdos abjetos, bem como evitar a propagação de informações que possam colocar as pessoas em maior risco de transmitir o coronavírus. Outra é se autoempoderar como uma espécie de Supremo Tribunal do Mundo e cassar a palavra de um presidente, ainda que esse presidente seja Bolsonaro.

O próprio Twitter já agiu diferente em outros disparates oficiais. No mês passado, Donald Trump retuitou um vídeo no qual Joe Biden, seu possível adversário nas eleições, dizia: “Só reelegeremos Donald Trump”. Tratava-se de uma fraude, um vídeo editado. Na gravação original, o oponente dizia que o presidente americano seria reeleito se o partido democrata não fizesse uma campanha propositiva.

O Twitter não censurou Trump, como fez com Bolsonaro, mas exerceu a prerrogativa correta, jornalística e democrática de informar seus internautas que aquele conteúdo sofrera manipulação. Soluções autoritárias, sr. Twitter, não são aceitáveis nos Estados Unidos, no Brasil nem em lugar nenhum.

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