Rogério Gentile

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha, editor de Cotidiano e da coluna Painel e repórter especial.

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Descrição de chapéu Folhajus machismo

Clube Paulistano usa regra machista da década de 80 para negar benefícios a sócias

Associadas recorreram à Justiça argumentando que o clube está atentando contra o direito à igualdade previsto na Constituição

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O Club Athletico Paulistano, um dos mais tradicionais de São Paulo, usou uma regra machista da década de 1980 para negar a duas associadas o direito de se tornarem sócias remidas.

Sócia ou sócio remidos são aqueles que, depois de 35 anos de contribuição, passam a ter o direito de isenção à mensalidade —de 50% nos primeiros 60 meses e integral após esse período.

M.B. é sócia desde 1984, e A.S., desde 1985. Pelo tempo, já teriam, portanto, direito ao benefício no Paulistano, clube fundado em 1900 e que ocupa uma área de 41 mil metros quadrados no Jardim América, bairro nobre de São Paulo.

Entrada do prédio principal do Clube Athletico Paulistano.
Entrada do prédio principal do Clube Athletico Paulistano. - Danilo Verpa 20.set.2019/Folhapress

Na década de 1980, no entanto, o estatuto do clube exigia que, ao se casar, as mulheres deveriam transferir a titularidade dos seus títulos para os maridos, passando a ser dependentes deles. Ambas se divorciaram e voltaram a ser titulares, mas, de acordo com o Paulistano, o tempo em que permaneceram casadas não pode ser utilizado para a contagem da remissão.

Inconformadas, as sócias recorreram à Justiça argumentando que o clube está atentando contra o direito à igualdade previsto na Constituição. “Lamentavelmente, nos anos 1980, tínhamos uma situação de machismo arraigada na sociedade”, disse a defesa das sócias à Justiça. “Vamos perpetuar o machismo até o fim dos nossos dias?”

Na defesa apresentada à Justiça, o Paulistano argumentou que, “embora seja inegável o transtorno”, as transferências dos títulos para os ex-maridos ocorreram de acordo com a legislação da época. “O que hoje aparenta ser uma tremenda discriminação era absolutamente corriqueiro, nem chamava a atenção. Em 1985 era uma conduta normal”, afirmou.

Na visão do clube, o Paulistano estaria cometendo um ato ilegal se utilizasse, no caso dessas duas sócias, o estatuto atual, que não prevê mais a transferência da titularidade dos títulos para os maridos. “Retroagir uma lei atual à essa situação praticada há 35 anos, isto sim gerará uma conduta antijurídica, a ilegal retroatividade da lei”, afirmou.

A juíza Ana Lúcia Xavier Goldman, que analisou o processo aberto por A.S., não aceitou a argumentação do clube. “A posição adotada pela associação em seu estatuto violou o princípio da igualdade, trazendo inequívoca discriminação à mulher, quando a carta federal então vigente já vedava a distinção entre os sexos”, afirmou, na sentença que condenou o clube a conceder o benefício.

“Não se trata da criação de privilégio à sócia por meio da retroatividade da norma, mas de reconhecer a ilegalidade da medida imposta à autora [do processo].”

O clube não pode mais recorrer da decisão, que transitou em julgado. O processo movido por M.B. ainda não foi julgado.

Em nota encaminhada à coluna, O Paulistano afirma que “não compactua com qualquer prática discriminatória”. Segundo o clube, a qualificação indicada, de transferência de titularidade de esposas para maridos, existiu, há décadas, mas não condiz com o momento e com a atual administração do clube.

Quanto aos casos específicos citados, o Paulistano diz que A.S. teve o direito reconhecido em primeira instância e o clube, além de não recorrer da decisão, respeitou-a para todas as questões semelhantes que surgiram posteriormente.

Já a associada M. B., diz a nota, “requisitou a pré-remição em 15/7/2021 e teve o pedido deferido no dia seguinte. Após a venda do título, em 20/7, M. B. tornou-se pré-remida, em 22/7”.

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